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    Nos EUA, mulheres poderão receber pílulas abortivas pelo correio

    Medida ocorre no momento em que a Suprema Corte está prestes a rever leis sobre o direito à interrupção da gravidez

    Tierney Sneedda CNN

    A Food and Drug Administration (FDA), agência federal do Departamento de Saúde dos Estados Unidos, anunciou nesta quinta-feira (16) que está retirando a exigência de que as pacientes que buscam o aborto medicamentoso tenham que pegar os comprimidos pessoalmente, permitindo que as drogas sejam enviadas pelo correio.

    A ação ocorre em um momento em que a Suprema Corte está prestes a desfazer seu precedente sobre o direito à interrupção da gravidez.

    Relaxar as restrições federais ao aborto medicamentoso é algo que o governo do presidente Joe Biden poderia fazer para mitigar as consequências de uma reversão da lei conhecida como “Roe vs. Wade”, que autoriza o aborto em todo o país, em âmbito federal. Entretanto, estados liderados pelo Partido Republicano já estão em marcha para neutralizar o que o governo federal optou por fazer.

    O aborto medicamentoso consiste na interrupção da gravidez após a ingestão de duas pílulas. Ambos os lados da questão veem isso como a próxima fronteira na luta pelo acesso ao aborto, enquanto esperam para ver como a Suprema Corte decide um caso no Mississippi, no qual os juízes estão reexaminando o precedente estabelecido pela decisão “Roe vs. Wade”, de 1973.

    “Essa questão sobre as drogas indutoras do aborto é realmente a próxima fase da luta contra a interrupção da gravidez”, disse John Seago, diretor legislativo do Texas Right to Life.

    “Este ano foi absolutamente um prelúdio”, disse Elizabeth Nash, gerente sênior de questões estaduais do Instituto Guttmacher, que defende o direito ao aborto. “Nos últimos dois anos, quase não vimos nada se movendo em relação ao aborto medicamentoso”, disse. Mas pelas suas contas, projetos de lei para restringir o acesso ao método foram apresentados em 16 estados neste ano.

    Linhas de batalha são traçadas em torno do aborto medicamentoso

    A FDA aprovou pela primeira vez o medicamento mifepristone —quando associado ao misoprostol— para fins abortivos em 2000. A introdução do medicamento não revolucionou imediatamente o acesso à prática, como alguns defensores dos direitos reprodutivos esperavam. Mas o uso do método tem aumentado constantemente, e agora representa mais da metade dos abortos que ocorrem antes de nove semanas de gestação, de acordo com a Fundação Família Kaiser.

    Com o tempo, o governo dos Estados Unidos alterou algumas das regras federais sobre o uso do aborto medicamentoso, mas os defensores do direito à prática afirmam que a FDA não estava acompanhando o que colocavam como o que “a ciência em evolução estava mostrando” sobre a segurança do método.

    O surto de coronavírus e a maneira como a pandemia expandiu o uso da telessaúde apenas aumentou as preocupações entre os defensores do aborto, que obtiveram uma ordem judicial no ano passado exigindo que a FDA suspendesse temporariamente as restrições que proibiam as requerentes de obter as pílulas pelo correio. Em abril, o governo Biden levantou voluntariamente a proibição durante a pandemia, enquanto indicavam um caso diferente que estava conduzindo uma revisão completa dos regulamentos.

    “A Covid acabou de nos dar esse tipo de experimento natural para demonstrar que, de fato, não há nenhuma razão clinicamente justificável para exigir que as pacientes venham a uma clínica e peguem uma pílula que vão tomar em casa”, disse Kristen Moore, diretora do Projeto de Expansão ao Acesso do Aborto Medicamentoso.

    Além da exigência de coleta pessoalmente, a FDA está avaliando os regulamentos que obrigam os provedores a se registrar com fabricantes do medicamento e aos pacientes que realizam o aborto com medicamentos a assinarem um formulário de consentimento.

    Grandes grupos médicos, como o Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas (CAOG), apoiaram a segurança do aborto medicamentoso e são a favor do relaxamento das regulamentações.

    Entre os contrários ao aborto, o ímpeto para consolidar as restrições em nível estadual já vinha crescendo, de acordo com Sue Swayze Liebel, diretora de política estadual do grupo antiaborto Susan B. Anthony List. A medida de abril do governo Biden “realmente fez com que as pessoas prestassem atenção”, disse.

    “Isso meio que caiu sobre os legisladores estaduais”, afirmou Liebel. “Eles são sábios em atualizar suas leis de maneira a incluir esta nova fronteira —digamos—, esta abordagem farmacêutica, em oposição à abordagem cirúrgica, que é a base da maioria das leis estaduais”, completou.

    Um foco enquanto se espera por um caso na Suprema Corte

    Os sinais recentes da Suprema Corte sobre o direito ao aborto apenas intensificaram o foco no aborto medicamentoso. O tribunal, no início de dezembro, ouviu uma contestação à proibição do aborto após 15 semanas no Mississippi, no qual a maioria dos juízes sugeriu que estavam dispostos a repensar —e talvez reverter totalmente— o precedente do tribunal sobre a lei Roe vs. Wade, que garante o direito ao aborto em todo o país.

    A Suprema Corte também manteve uma lei do Texas em vigor na semana passada que proíbe a interrupção da gravidez por volta das seis semanas de gestação.

    Os obstáculos enfrentados para ter acesso à prática dependem de onde se vive, e um afrouxamento das regulamentações da FDA terá mais impacto nos estados democratas que não buscam reprimir o aborto medicamentoso.

    Dezenove estados já têm regras que efetivamente banem o uso da telemedicina para isso, minando tudo o que a FDA pretende fazer.

    Ainda assim, relaxar as regulamentações federais poderia ter algum efeito na manutenção do acesso, em face a uma decisão da Suprema Corte que destitui o direito ao aborto. Se os estados liderados pelos conservadores tiverem permissão para proibir totalmente o aborto, é provável que quem busca a prática —principalmente no Sul e no Centro-Oeste— tenha que dirigir centenas de quilômetros para chegar às clínicas mais próximas. Prevê-se que isso, por sua vez, crie um surto de pacientes de fora do estado em partes do país que permanecem amigáveis ​​ao direito ao aborto, estendendo os tempos de espera para obter o procedimento cirúrgico por vários dias ou até semanas.

    Tornar o aborto medicamentoso mais acessível cria mais “flexibilidade” para aqueles que buscam fazer isso em estados que mantêm o acesso ao procedimento, disse Moore. “Então, as pessoas que realmente precisam encontrar um especialista podem fazer isso”, disse.

    As consequências da proibição de abortar após seis semanas no Texas são “ilustrativas”, de acordo com Julia Kaye, da American Civil Liberties Union (ACLU). A espera para consultas de aborto em estados vizinhos chegam a seis semanas, devido à enxurrada de pacientes no Texas, apontou Kaye, que liderou os processos da ACLU contra as regras da FDA.

    “Eliminar as restrições aumentaria o número de provedores de aborto medicamentoso e as opções de atendimento em estados como Novo México e Colorado, o que poderia permitir que pacientes desses estados, bem como de estados vizinhos, recebessem atendimento mais cedo na gravidez”, disse ela.

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