Advogado condenado por grampear Moro aciona STF após ser espionado pela Abin
Advogado quer ser reconhecido como interessado no processo na condição de ofendido
O advogado Roberto Bertholdo, apontado pela Polícia Federal (PF) como alvo de “monitoramento injustificado” da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) na última terça-feira (30). Ele pede acesso à íntegra do material que foi produzido a seu respeito.
“O ora Peticionário [Roberto Bertholdo], alvo desta ação criminosa promovida por agentes estatais da Abin e talvez também por agentes detentores de foro por prerrogativa de função, merece ter acesso ao que foi produzido ilegalmente contra si e potencialmente contra clientes de seu escritório de advocacia”, escreve Bertholdo no documento.
O advogado quer ser reconhecido como interessado no processo na condição de ofendido. O pedido foi enviado ao ministro Alexandre de Moraes, responsável pelo caso no STF. O processo tramita em sigilo.
Bertholdo foi condenado em abril de 2006 pela 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba a cinco anos e três meses de reclusão, em regime semiaberto, pela interceptação clandestina do telefone do então juiz Sergio Moro.
De acordo com a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), foram pelo menos 41 ligações interceptadas do gabinete de Moro. Bertholdo acabou condenado a pagar uma multa de cerca de R$ 576 mil.
Tanto a defesa de Bertholdo como o MP recorreram da decisão. A pena do advogado foi reduzida para dois anos e 8 meses de reclusão e o regime prisional passou para o aberto. O advogado afirma ter sido preso para que delatasse supostos envolvidos e nega irregularidades.
“Ele [Sergio Moro] fez um laboratório de Lava Jato comigo, me prenderam para eu delatar pessoas que eles queriam. Me acusaram de ter comprado um ministro [do Superior Tribunal de Justiça] e grampeado a ele próprio. Não fiz nem uma coisa e nem outra. Não aceitei delatar ninguém, por isso me prenderam”, afirma.
Moro passou a ser investigado no STF em janeiro deste ano a partir de acusações feitas pelo empresário paranaense Antônio Celso Garcia, conhecido como Tony Garcia — que era defendido por Bertholdo. Ele exerceu mandato de deputado estadual entre 1998 e 2002.
Garcia acusa Moro de não ter atuado com imparcialidade em processos contra ele no Paraná e de ter determinado que grampeasse autoridades e outras pessoas em busca de provas para casos que não tinha relação com o seu.
Entre as pessoas grampeadas por Tony Garcia estava Roberto Bertholdo, que havia sido preso e condenado por grampear Moro e que, nos últimos anos, foi grampeado pela Abin.
Moro rechaça as acusações de Tony Garcia e as classifica como mentiras de um criminoso condenado.
“As investigações conduzidas pelo MPF e executadas pela PF foram sobre tráfico de influência e escuta ilegal e resultaram em condenações de advogado por esses crimes e que foram proferidas por outro juiz”, diz Moro.
O senador sustenta que nenhum juiz ou ministro foi investigado com sua autorização.
Monitoramento injustificado
A investigação que mira a antiga cúpula da Abin no STF aponta que o então diretor-geral da agência Alexandre Ramagem determinou o “monitoramento injustificado” de Bertholdo pela proximidade com Joice Hasselmann, deputada que havia rompido com Jair Bolsonaro (PL), e Rodrigo Maia, que presidia a Câmara dos Deputados – “à época tidos como adversários políticos do governo”, segundo a PF.
Bertholdo afirmou à CNN que desconfiava que poderia ser alvo de espionagem, mas que só confirmou suas suspeitas a partir do momento em que uma nova fase da operação foi deflagrada na semana passada.
“Tomei conhecimento a partir da decisão [do ministro]. Desconfiava que tivesse acontecido [espionagens] naquela época. Tinha situação camuflada, carros, pessoas se aproximando da casa, do escritório, drones que apareciam na minha residência, filmando situações, pessoas fotografando”, conta.
No pedido feito nesta terça-feira ao ministro Alexandre de Moraes, Bertholdo solicita que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) seja oficiado para apurar a ocorrência de ofensa às prerrogativas da advocacia por agentes estatais.
“É um constrangimento muito grande porque tenho dever de manter sigilo das minhas reuniões com clientes, da minha atividade profissional. Não sei quais foram as oportunidades em que clientes foram espionados. Clientes procuraram, muita gente preocupada”, diz Bertholdo.
O advogado pede ainda ao ministro para que possa formular requerimentos de diligências com o objetivo de verificar a abrangência dos eventuais danos, a identificação de quem atuou em seu monitoramento e qual destino foi dado às informações ilegalmente obtidas.
Em nota, a Abin afirma que colabora com os inquéritos e que é “a maior interessada na apuração rigorosa dos fatos”.