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    Campos naturais podem absorver uma grande quantidade de emissões de carbono

    De todo o CO2 mantido em ecossistemas terrestres, cerca de 34% pode ser encontrado em campos de pastagem ou campos naturais

    Lauren Kentda CNN*

    As florestas há muito são celebradas como heróis naturais na luta contra a crise climática. Elas são tão boas em absorver e armazenar dióxido de carbono que um consórcio de grupos ambientais está pedindo ao mundo que um trilhão de árvores sejam plantadas na próxima década.

    No entanto, enquanto nós olhamos para cima, para a copa das árvores, em busca de soluções climáticas, alguns ativistas estão pedindo que olhemos para baixo, pois outra resposta está sob nossos pés.

    Florestas, turfeiras, desertos e tundra podem absorver e manter estoques de dióxido de carbono (CO2). De fato, de todo o carbono mantido em ecossistemas terrestres, cerca de 34% pode ser encontrado em campos de pastagem ou campos naturais (também chamados de campinas), de acordo com dados do World Resources Institute. É um pouco menos que os 39% mantidos nas florestas.

    “Quer você olhe para o Serengeti, o Cerrado no Brasil, o que sobrou das pradarias da América do Norte ou das estepes da Mongólia, cada um de nossos principais habitats de campos está sob ameaça no momento”, comentou Ian Dunn, presidente-executivo da organização conservacionista britânica Plantlife.

    Também há muitos campos no Reino Unido, que receberão líderes mundiais e ativistas em pouco mais de uma semana nas negociações climáticas da COP26 em Glasgow, Escócia. Entre vários itens da pauta está como proteger as florestas e plantar mais árvores para ajudar a reduzir as emissões globais.

    Entretanto, a Plantlife, entre outros grupos, está fazendo campanha para que os campos de pastagens sejam protegidos em nível internacional e façam parte de qualquer acordo que surja em Glasgow.

    Enquanto os líderes estiverem reunidos na cidade escocesa, a Plantlife estará em pleno trabalho para restaurar mais de 100 mil hectares de prados, incluindo um na outra ponta do Reino Unido, o condado de Kent, no sul da Inglaterra.

    Trata-se da Ranscombe Farm Nature Reserve, que se parece com o típico e idílico campo inglês, com suas colinas suaves e pasto para gado. A grama parece comum, com manchas douradas do clima de outono. Mas, na primavera, as raras orquídeas, campânulas e rosa-das-pedras florescem em uma celebração da biodiversidade deste campo.

    A reserva protege não apenas campinas, mas também bosques, pastos selvagens e campos de cultivo para plantas raras / Li-Lian Ahlskog Hou/CNN

    Restaurar ecossistemas leva tempo

    Restaurar ecossistemas ricos em espécies como este leva tempo, disse Ben Sweeney, gerente da reserva Ranscombe, na qual trabalha desde 2010. “Isso levará algumas décadas”, afirmou.

    A reserva protege não apenas campinas, mas também bosques, pastos selvagens e campos de cultivo para plantas raras.

    Sweeney explica que, assim como acontece com um santuário animal, a reserva nutre plantas raras em pequenas seções, onde elas estão prosperando e podem crescer e se espalhar para habitats maiores em breve.

    Mas, mesmo depois de anos de gerenciamento cuidadoso, os guardas florestais não conseguiram reverter todos os impactos que a agricultura e a degradação da terra provocaram no local.

    No Reino Unido, esses habitats vitais têm desaparecido lentamente como consequência de décadas de agricultura intensiva, construção de moradias e de infraestrutura. O Reino Unido perdeu mais de 800 mil hectares de campos de pastagens conforme as áreas urbanas e florestais se expandem, de acordo com o UK Centre of Ecology & Hydrology.

    É uma preocupação para ativistas, porque os campos não apenas armazenam carbono, como também servem como amortecedor para condições climáticas extremas e ajudam a prevenir a erosão do solo.

    Suas raízes mantêm a terra fofa e a cobertura do solo evita a erosão causada pelo vento e pela água. Os habitats ajudam no manejo de enchentes naturais, retendo a água após eventos climáticos extremos e, em seguida, liberando-a gradualmente.

    A perda de campos de pastagens também ameaça as espécies importantes que deles dependem, como abelhas, borboletas e outros polinizadores. Um recente estudo publicado pela Universidade de Manchester revelou que as campinas do Reino Unido armazenam mais de 1,8 bilhão de toneladas métricas de carbono. Isso é o equivalente a armazenar as emissões anuais de cerca de 400 milhões de carros.

    “Mas elas são praticamente ignoradas ou foram ignoradas em muitas políticas de sustentabilidade”, disse o especialista em solo e professor de ecologia Richard Bardgett, pesquisador principal do estudo.

    Outro estudo, publicado em 2018 na revista “IOP Science”, concluiu que os campos de pastagens na Califórnia, nos EUA, podem desempenhar um papel maior do que as florestas como sumidouros de carbono, já que são menos vulneráveis a incêndios e secas, que partes do mundo sofrerão mais à medida que a Terra continuar a aquecer.

    É que os campos mantêm a maior parte do carbono preso em suas raízes no subsolo (mesmo durante a seca e o fogo) ao contrário das florestas, nas quais o carbono é espalhado por todas as árvores.

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    Um aumento global na demanda por carne e laticínios, além da soja, está pressionando as pastagens / Li-Lian Ahlskog Hou/CNN

    Alimentação e destruição de pastagens

    Quando o manejo é ruim, campos de pastagens podem se tornar uma fonte de emissões líquidas, em vez de um sumidouro para removê-las. A criação de gado em pastagens também desempenha um papel importante nas emissões de metano, o que está contribuindo para a crise climática.

    Um aumento global na demanda por carne e laticínios, além da soja, está pressionando as pastagens.

    A savana com maior biodiversidade do mundo, o Cerrado do Brasil, foi reduzida para cerca da metade de seu tamanho original, principalmente para a expansão da produção de carne e soja, de acordo com o World Wide Fund for Nature (WWF), que afirma que o Cerrado perde uma área equivalente ao tamanho de São Paulo a cada três meses.

    Na China, vastas extensões de pastagens estão em “estado de crise ecológica”, segundo os cientistas, causado pelo excesso de pastos no solo. Enquanto isso, nos Estados Unidos, a expansão das áreas agrícolas fez com que as pradarias das Great Plains (as grandes planícies próximas das Montanhas Rochosas) perdessem em média quatro campos de futebol a cada minuto, de acordo com um relatório do WWF publicado em 2020.

    Embora a proteção dos campos de pastagens seja uma preocupação global, há expectativas crescentes de que o Reino Unido mostre liderança climática antes da COP26.

    Os ativistas estão decepcionados com a omissão dos campos como uma solução baseada na natureza na Net Zero Strategy (Estratégia de Emissão Líquida Zero) do governo, que está sendo vista como um projeto potencial para os roteiros climáticos de outras nações.

    “A importância das pastagens na captura de carbono, melhoria da biodiversidade, produção sustentável de alimentos, gestão da água e bem-estar social continua a ser esquecida neste relatório e na política governamental”, pontuou Dunn, da Plantlife. “Precisamos trabalhar em um mosaico de habitats”.

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    / Li-Lian Ahlskog Hou/CNN

    Estratégias do governo têm “lacunas”

    Craig Bennett, executivo-chefe do The Wildlife Trusts, disse que a Estratégia de Emissão Líquida Zero do governo tem lacunas significativas e que seus autores, do governo, “não parecem ter reconhecido totalmente o papel que a natureza pode desempenhar”.

    Segundo ele, há poucas novidades para a natureza na estratégia.

    “Em vez disso, as políticas antigas estão sendo recicladas, e isso não é suficiente”.

    As políticas de restauração de terras contarão com um modesto fundo Nature for Climate, de US$ 880 milhões (cerca de R$ 4,9 bilhões), que já havia sido anunciado no manifesto eleitoral do governo conservador.

    Um porta-voz do Departamento de Meio Ambiente, Alimentos e Assuntos Rurais (Defra) do Reino Unido disse à CNN que estava protegendo campos de pastagens em alguns locais de reservas na Inglaterra, lançando um projeto piloto para práticas agrícolas mais sustentáveis e dando mais de US$ 55 milhões (cerca de R$ 311 milhões) em doações para projetos de recuperação da natureza.

    “A perda de biodiversidade e as mudanças climáticas são problemas globais que exigem soluções globais”, disse o porta-voz.

    Mas o Defra não comentou quando questionado se as pastagens seriam discutidas na COP26 e enviou citações sobre a importância de acabar com a extração ilegal de madeira como uma solução climática baseada na natureza. Um grupo de 38 parlamentares britânicos também pede o reconhecimento internacional e proteção para campos de pastagens na COP26.

    Em um requerimento, eles solicitam que a Câmara dos Comuns do parlamento reconheça o papel das pastagens por sua capacidade de reduzir as emissões e o risco de inundações e agir como ecossistemas críticos para os polinizadores.

    Eles exortam “os ministros do governo a usar a oportunidade da COP26 em Glasgow para buscar reconhecimento internacional e proteção para campos de pastagens ricos em espécies para liderar pelo exemplo na tomada de medidas para mitigar os efeitos das mudanças climáticas e aumentar a biodiversidade e para garantir que a beleza dessas áreas naturais seja preservada para as gerações futuras”.

    (*Texto traduzido. Clique aqui para ler o original em inglês).

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