Defensoria do RJ diz que PMs são autores de 86% dos casos de violência a presos
Relatório com informações prestadas por 1,2 mil presos mostra, em média, ao menos duas agressões por dia no estado
Um relatório divulgado pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPERJ) aponta que, entre 1.250 relatos de maus tratos e tortura de presos, cerca de 86% indicam policiais militares como autores das agressões. O levantamento analisa os relatos feitos ao Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos (Nudedh/DPERJ) entre junho de 2019 e agosto de 2020. Considerando o período, há, em média, pelo menos duas agressões por dia.
A partir do levantamento, foi possível traçar um perfil das vítimas de violência praticada em decorrência da prisão em flagrante. Homens jovens, entre 18 e 25 anos, negros, com baixa escolaridade (89,3% não completaram o Ensino Fundamental), agredidos no local da ocorrência, na maioria das vezes, por um policial militar. Em 46,7% dos casos com informação, há lesão aparente.
Apesar de 70,8% dos relatos de agressão serem registrados em um dos três momentos processuais – audiência de custódia, interrogatório ou fundamentação da sentença -, eles não podem ser considerados no processo de tomada de decisão. Em 88% dos casos, os denunciantes das agressões foram condenados. A maioria por crimes da Lei de Drogas, por conta da Súmula 70 do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), que autoriza a prisão apenas com a palavra do policial.
A Súmula 70 é mencionada em 75% das condenações pela Lei de Drogas no estado e em cerca de 15% das prisões por roubo. “O fato de restringir-se a prova oral a depoimentos de autoridades policiais e seus agentes não desautoriza a condenação”, diz a resolução do TJ-RJ.
Apesar de nove em cada dez vítimas dizerem que é possível identificar o agressor, somente 20% decidiram adotar medidas administrativas ou judiciais contra o Estado ou quem os agrediu. Cerca de 35% dos presos agredidos possuem lesão aparente, como explica a defensora Carla Vianna, integrante do Nudedh.
“A pesquisa indica que a resposta penal não leva em consideração todas as evidências apuradas no processo, mas, em sua maioria, apenas legitima um sistema penal seletivo, na medida em que não há qualquer esforço para investigar os abusos e excessos praticados pelos agentes do Estado ou qualquer preocupação em restaurar a legalidade das situações retratadas”, destaca.
Questionada sobre o teor das informações presentes no relatório da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, a secretaria estadual de Polícia Militar respondeu que “a corporação não comentará relatório baseado apenas na oitiva dos presos, sem qualquer comprovação técnica em exame de corpo de delito”.
*Sob supervisão de Stéfano Salles