Mercosul pede diálogo contra “iniciativas unilaterais” que possam agravar situação entre Venezuela e Guiana
Declaração oficial foi divulgada após o fim da reunião cúpula que reúne os países do grupo, no Rio de Janeiro
O Mercosul pediu, nesta quinta-feira (7), diálogo entre a Venezuela e a Guiana para a busca de uma solução pacífica para a situação entre os dois países. Na terça-feira, o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, anunciou a criação da Guiana Essequiba, território dentro da Guiana.
Segundo o grupo, “ações unilaterais” devem ser evitadas, “pois adicionam tensão”.
Os Estados Partes do Mercosul manifestam sua profunda preocupação com a elevação das tensões entre a República Bolivariana da Venezuela e a República Cooperativa da Guiana. A América Latina deve ser um território de paz e, no presente caso, trabalhar com todas as ferramentas de sua longa tradição de diálogo.
Nesse contexto, alertam sobre ações unilaterais que devem ser evitadas, pois adicionam tensão, e instam ambas as partes ao diálogo e à busca de uma solução pacífica da controvérsia, a fim de evitar ações e iniciativas unilaterais que possam agravá-la.
Declaração do Mercosul
A declaração oficial foi divulgada após o fim da reunião cúpula que reúne os países parte da entidade, no Rio de Janeiro.
A escalada de tensão entre Venezuela e Guiana dominou as conversas de bastidores e os encontros do evento, que encerra a participação do Brasil na presidência do bloco. Agora a liderança será do Paraguai.
Depois de se reunir com seus principais assessores para assuntos internacionais, Celso Amorim e o ministro Mauro Vieira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu se oferecer para mediar a crise entre a Venezuela e a Guiana, segundo fontes do Itamaraty e do Planalto.
Na reunião do Mercosul, Lula incentivou um fórum regional, a Comunidade dos Estados Latino-americano (Celac), a assumir o protagonismo, e disse que o Brasil poderia sediar as reuniões.
Entenda o conflito
As tensões entre os vizinhos Venezuela e Guiana aumentaram nas últimas semanas devido a uma longa disputa territorial.
Em questão está um território fronteiriço de 160 mil quilômetros quadrados em torno do rio Essequibo, que é principalmente uma área de selva, rica em petróleo e gás offshore.
Ambos os países reivindicam a propriedade do território, que é pouco povoado e cuja fronteira muito disputada foi acordada sob uma decisão de 1899, quando a Guiana ainda fazia parte do Império Britânico.
O que provocou a recente tensão?
A Venezuela voltou a reivindicar o território nos últimos anos após a descoberta de cerca de 11 bilhões de barris de petróleo e gás na costa da Guiana.
Caracas ganhou apoio em um referendo no fim de semana para criar um novo estado e o presidente Nicolás Maduro prometeu exploração de petróleo e mineração na área reivindicada.
Analistas e fontes em Caracas disseram que o referendo, no qual os eleitores também rejeitaram a jurisdição do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) sobre o caso, não se traduzirá em invasão real. Segundo os especialistas, é uma tentativa de Maduro de mostrar força e avaliar o apoio ao seu governo antes das eleições presidenciais de 2024.
Por que o território é tão importante?
Embora a área terrestre de Essequibo seja uma área pouco desenvolvida, houve grandes descobertas de petróleo e gás offshore nas proximidades nos últimos anos, colocando a Guiana no mapa mundial dos produtores de petróleo.
Um consórcio da Exxon Mobil, CNOOC da China e U.S. Hess iniciou a produção de petróleo na Guiana em 2019.
Atualmente o país produz cerca de 400 mil barris por dia e esse número deve subir para mais de 1 milhão até 2027. A produção impulsionou fortemente a economia da Guiana e promete uma enorme renda para o país nos próximos anos.
Embora a Venezuela esteja nas maiores reservas de petróleo bruto do mundo e também tenha depósitos maciços de gás natural, sua produção caiu significativamente nos últimos anos devido às sanções dos EUA, denúncias de corrupção e deterioração da infraestrutura interna.
Maduro disse na terça-feira (05), que vai autorizar a exploração de petróleo em Essequibo, com duas estatais criando divisões para a região em disputa.
O governo venezuelano disse que a Guiana não deve ser autorizada a conceder concessões em áreas oceânicas “a serem demarcadas”.
Não está totalmente claro quais áreas offshore Maduro está reivindicando para a Venezuela. Mas, ele já anunciou que todas as empresas que já operam na costa da Guiana têm três meses para sair.
A Exxon Mobil disse que as disputas de fronteira são para países e órgãos internacionais resolverem.
O que disse o Tribunal Internacional de Justiça?
A Guiana pediu ao Tribunal Internacional de Justiça barrar o referendo.
O tribunal não foi tão longe em uma decisão na semana passada, mas proibiu a Venezuela de tomar qualquer ação que mudaria o status do território.
Maduro disse repetidamente que o referendo é vinculativo, embora a votação tenha sido anteriormente referida por seu governo como “consultiva.”
Qual foi a resposta da Guiana?
A Guiana convocou uma reunião do Conselho de Segurança da ONU para discutir a crise. O encontro acontece nesta sexta-feira (8).
As forças armadas do país estão em alerta máximo, disse o presidente Irfaan Ali. Ele afirmou que a Venezuela se declarou uma “nação fora da lei” e desrespeitou as ordens do TIJ.
Ali também procurou acalmar potenciais investidores, dizendo que a Guiana recebeu apoio de parceiros e da comunidade internacional.
O ministro das Relações Exteriores da Venezuela disse nas redes sociais na quarta-feira (6) que falou com sua contraparte da Guiana sobre o que chamou de “mandato inapelável” da Venezuela.
O governo da Guiana questionou os números de participação dados pelo governo de Maduro para o referendo.
As autoridades eleitorais, no dia do referendo, informaram que 10,5 milhões de votos foram computados para o “sim”, que pedia pela anexação. Mas, mais tarde, o governo voltou atrás e disse que o número se referia ao total de eleitores. Testemunhas da Reuters viram vários locais de votação mal atendidos durante a votação.
*Com informações de Raquel Landim, Gabriela Prado, da CNN, e da Reuters