Em suas garagens, engenheiros da Ford trabalham em Mustang elétrico
O veículo é visto como uma tentativa da Ford de enfrentar a Tesla e, para isso, engenheiros trabalham até de casa para lançá-lo
Quando Aleyna Kapur começou a trabalhar em casa devido à pandemia de coronavírus, fez um kit de materiais do escritório para casa: seu laptop, alguns cabos e… um SUV elétrico Ford Mustang Mach-E.
Primeiro SUV a levar o nome Mustang, o Mach-E foi apresentado ao público em novembro de 2019. Com ênfase em acessibilidade e desempenho, o crossover elétrico é visto como uma tentativa da Ford de enfrentar a Tesla.
Na época, a Ford disse que o Mach-E estaria à venda no outono do hemisfério norte deste ano. Mas alguns meses depois, em 13 de março, a pandemia levou a Ford (F) a mandar os funcionários trabalhar em casa.
Assim, Kapur e seus colegas levaram para suas casas mais de uma dúzia de versões em pré-produção do SUV Mach-E, além de equipamentos de informática e outros para que pudessem continuar trabalhando em seus porões, salas de estar, garagens e ruas do bairro. Ainda há muito trabalho a ser feito para preparar o veículo para a produção dentro do prazo – mas ninguém pretende perdê-lo.
A engenheira Kapur é calibradora. O trabalho dela é garantir que todo o software de computador que controla os motores elétricos do Mach-E responda como deveria, em todas as circunstâncias possíveis. Se a calibragem é feita de forma errada, o veículo pode não dar partida ou parar suavemente, ter dificuldades em diferentes tipos de terreno, sofrer com o superaquecimento em algumas partes ou com o mau funcionamento em condições climáticas extremas.
“Existem milhares, milhares e milhares de linhas de código escritas para que possamos otimizar o veículo para responder adequadamente durante todas essas situações diferentes”, explicou a engenheira.
Uma coisa é um consultor ou jornalista trabalhar em casa quando tudo o que é necessário é um laptop, um telefone e uma conexão à internet. Outra é o que Kapur e seus colegas estão fazendo: trabalhar em um utilitário esportivo de cerca de duas toneladas com baterias com capacidade para quase 100 quilowatts-hora de energia.
O Mach-E é o primeiro modelo da Ford projetado e fabricado exclusivamente como veículo elétrico. Antes dele, os elétricos da Ford eram versões de veículos que também eram vendidos com motores a gasolina.
Kapur conta que gasta, em média, metade do tempo trabalhando em sua mesa e a outra metade dirigindo o Mach-E pelo bairro enquanto registra fluxos de dados de desempenho. Porém, há dias em que ela nem sai de sua mesa a dias inteiros passados no banco do SUV elétrico. “Em geral, entro no carro pelo menos uma vez por dia, pois ainda fazemos muita coisa online”, disse ela.
Segundo a engenheira, o computador que usa na empresa é bem mais poderoso do que o da sua casa, mas ela consegue usar uma conexão segura à internet para acessar o equipamento do escritório para análises de dados mais pesados.
Antes da pandemia, quando Kapur e sua equipe estavam trabalhando na empresa, qualquer um podia entrar em qualquer veículo de teste. Alguns dos Mach Es são com tração traseira, outros com tração nas quatro rodas e alguns têm baterias maiores e mais poderosas que outras. Cada versão requer diferentes calibrações de software.
Agora, com todos trabalhando em casa, cada veículo de teste está em uma garagem ou estacionamento diferente, o que significa que a comunicação é crucial. Se precisarem de dados de uma versão do Mach-E que não possuem, os membros da equipe devem pedir um ao outro para executar testes de direção específicos.
“Muitas vezes somos capazes de contornar o problema”, comentou. “E a maioria de nós também está usando o veículo para fazer qualquer tipo de serviço necessário na rua”.
Outros engenheiros estão trabalhando nos sistemas de “infotainment” do Mach-E, ou seja, as telas internas do computador que possuem controles para navegação, entretenimento e configurações do ambiente. Eles trouxeram modelos de mesa domésticos que incluem a longa tela vertical do Mach-E com um botão circular instalado na parte inferior. Assim, podem trabalhar nas suas mesas como se estivessem dentro do carro.
Os projetistas e engenheiros que trabalham no Mach-E têm a sorte de serem obrigados a ficar em casa nessa etapa do desenvolvimento do Mach-E. Os chamados veículos de pré-produção, em grande parte exemplares feitos à mão, já haviam sido fabricados quando o fechamento foi decretado. Na maioria das vezes, o Mach-E só precisa de alguns aprimoramentos.
No entanto, alguns testes exigiram uma pista de provas. Com o fechamento da fábrica de Michigan, a Ford conseguiu mudar alguns desses testes para outros lugares, como contou Darren Palmer, do programa de desenvolvimento de veículos elétricos da Ford. “Temos instalações em todo o mundo”, lembrou Palmer. “Como os diferentes locais têm efeitos diferentes da crise do coronavírus, conseguimos usá-los agora.
Uma vez terminado, restam outros testes cruciais, como os de colisão, que precisam ser feitos em ambientes controlados. Com a modelagem por computador, os testes devem confirmar o que os engenheiros já esperam, disse Palmer, com base na execução de testes virtuais em computadores. Ainda assim, os testes reais devem ser feitos. “Sempre devemos fazer essa verificação”, disse ele, “mas geralmente não acontecem muitas mudanças a partir dessa etapa.”
Enquanto aguardam o acesso a esses ambientes de teste, os engenheiros e designers estão trabalhando no que podem fazer em casa. Segundo Palmer, alguns trabalhos estão sendo concluídos mais rapidamente, já que as pessoas têm acesso a seus computadores e veículos a qualquer hora. Os funcionários estão realizando os testes em seus Mach-Es nos fins de semana, quando normalmente não teriam acesso a eles.
No entanto, se o bloqueio ao coronavírus durar mais do que o esperado, o início da produção do Mustang Mach-E no outono de 2020 pode precisar ser adiado, admitiu a Ford.