Arábia Saudita quer atingir US$ 1 tri em fundo de investimento e atrair mais empresas brasileiras, diz embaixador à CNN
Sérgio Eugênio de Risios Bath, embaixador do Brasil na Arábia Saudita, falou sobre a meta ambiciosa para diversificar a fonte de renda do país
O embaixador do Brasil na Arábia Saudita, Sérgio Eugênio de Risios Bath, falou nesta quarta-feira (11) com a CNN e detalhou as ações do governo saudita para atingir a meta ambiciosa de US$ 1,07 trilhão até 2025 e mais de US$ 2 biliões até 2030 para o Fundo de Investimento Público Saudita, também conhecido como Fundo Soberano.
Atualmente, o Fundo Soberano tem US$ 700 bilhões em caixa.
Segundo ele, o fundo vem sendo usado de forma muito intensa para atrair investimentos para a Arábia Saudita com foco no setor produtivo.
“Empresas brasileiras estão começando a olhar para o mercado saudita. A BRF, por exemplo, uma das principais companhias de alimentos brasileira, concluiu a criação de uma joint venture com a Halal Products Development Company (HPCD), uma empresa parte do Fundo árabe.”
A companhia brasileira vai produzir localmente proteína animal.
Bath revelou que outras empresas brasileiras também estão considerando ir para Arábia Saudita, realizar o joint venture, investir e captar recursos desse Fundo.
“O principal papel do Fundo Soberano é diversificar a economia e torná-la menos dependente de um só produto, que é o petróleo. Os setores que estão se beneficiando com esse fundo podemos destacar a parte de indústria, manufaturas, enfim. A intenção do país, atualmente, é trazer indústrias farmacêuticas.”
Outros setores, empresas de bens de capitais, máquinas, material elétrico, também está no alvo dos investimentos sauditas.
“Inclusive indústria automotiva. Há uma produtora de carros elétricos americanas, a Lucid, uma das principais concorrentes da Tesla, está montando uma fábrica na Arábia Saudita”.
Em relação à participação de investimentos do fundo e da diversificação, Bath citou ainda a compra de 10% da empresa de telefonia espanhola, a Telefônica — que inclusive é dona da brasileira Vivo — e também de 10% da divisão de metais básicos da brasileira Vale.
“O fundo não só promove a diversificação aqui, mas faz também investimentos estratégicos no exterior, com o objetivo de atrair investidores e empresas para a Arábia Saudita.”
Petróleo
A Arábia Saudita ainda é uma economia dependente do petróleo, com uma média de quase dois terços da receita total do governo gerada a partir do petróleo (68% em 2022).
Um levantamento realizado pela embaixada brasileira, centrou-se na influência das alterações nos preços do petróleo, a qualquer nível, nos ativos dos fundos
soberanos de 2017 a 2022.
Os dados preliminares deste estudo apontam que a volatilidade do preço do petróleo não levou o governo saudita a reconsiderar o seu plano estratégico de elevar a posição do Fundo Soberano a um dos principais fundos do mundo.
“A gente chegou em uma conclusão que o barril estando acima de US$ 70, na prática não tem impacto algum. Houve problemas no passado, até 2020, com os preços mais deprimidos. Agora, neste ano, embora se tenha uma certa volatilidade, na prática, não está tendo nenhum impacto no Fundo”, explicou Bath.
Referente a esse cenário de guerra em Israel, o embaixador diz não estar prevendo um impacto num curto prazo, a não ser que a situação tenha um maior envolvimento geopolítico, entrada de outros países no conflito.
“O conflito no Oriente Médio não ainda não causa temor nas finanças, diferente da guerra na Ucrânia, que teve, sim, um impacto na energia.”
Entretanto, essa questão já estava precificado e nos trilhos, causando pouco impacto na arrecadação de recursos para investimntos. Segundo ele, a Rússia tem conseguido vender petróleo para muitos outros países, começando pela China — possibilitando um reflexo positivo ao país.
“A fonte de todo o recurso é o petróleo. A Arábia Saudita é o maior exportador e esse recurso são canalizados. A Saudi Aramco, petroleira do país, retem uma parte e investe outra. Ou seja, uma parte vai formar reservas com a autoridade monetária, que é a SAMA (Banco Central árabe), e a outra é destinada ao fundo soberano.”
Num segundo momento, Bath pontua que tanto o BC árabe quanto a Saudi Aramco, repassam os recursos e ajudam a capitalizar o fundo, de modo a atingir essa meta de mais de US$ 1 trilhão até 2025.
Referente ao cenário político e econômico que a Arábia Saudita está administrando para manter essa meta de captação de recursos ao fundo, Bath explica que está contando com o preço do petróleo acima de US$ 80 o barril. Além disso, há uma ideia de privatizar alguns ativos, como empreendimentos governamentais.
Fundo soberano
Independentemente da volatilidade do preço do petróleo, o valor combinado dos ativos do Fundo e da autoridade monetária árabe tem se intensificado, registando um aumento de 45% em 2022, comparando com 2017.
O estudo aponta que o valor combinado foi de US$ 726 em 2017, US$ 756 em 2018, US$ 822 em 2019, US$ 866 em 2020, US$ 983 em 2021 e US$ 1,056 bilhão em 2022.
O Fundo passou de US$ 230 bilhões em 2017 para US$ 596 bilhões em 2022, registrando aumento de cerca de 159% neste período.
O aumento deste valor se deu pelo resultado das seguintes ações tomadas pelo governo:
- Transferir US$ 77 bilhões para o Fundo durante o período 2019-2021, principalmente das participações do BC árabe;
- Captar fundos através de empréstimos e instrumentos de dívida, avaliados em cerca de US$ 42,9 mil milhões durante este período;
- Transferir 4% de suas ações na Aramco (petroleira árabe) para o Fundo em 2022, por US$ 80 bilhões;
- Arábia Saudita transferiu a riqueza recolhida dos empresários e funcionários da elite saudita em 2017 com base em acusações de corrupção.
Hoje, o Fundo atingiu US$ 700 bilhões, o que inclui a transferência de mais 4% da Aramco, elevando a transferência total da participação da petroleira para 8% (4% em 2022 e 4%) que é estimado em um total de US$ 180 bilhões.
O levantamento da embaixada sugere que, para atingir a meta de US$ 1,07 trilhão até 2025, e US$ 2 trilhões até 2030, o país poderá buscarainda financiamento por meio da privatização de empreendimentos governamentais.
No entanto, o impacto de um corte de 1 milhão de barris na produção de petróleo pela Arábia Saudita desde julho de 2023 ainda não se tornou evidente.
Reflexo no Brasil
Segundo Bath, o Brasil tem uma participação neste fundo quando se fala em investimento.
Ele contou que, recentemente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silve esteve com o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed Bin Salman, e se discutiu muito essa questão — inclusive foi colocado à mesa os investimentos do novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
“O Fundo é o motor do processo de diversificação da economia local saudita e também é responsável pelos investimentos feitos em Brasil.”
Na opinião do embaixador, atualmente a Arábia Saudita está sub investindo no Brasil. “Os investimentos não chegam a US$ 1.6 bilhão, sendo que nos Emirados Árabes já tem algo com US$ 10 bilhões.”
Os investimentos que existem aqui no país, em grande parte, são em proteína animal, e ele destaca a Minerva Foods, uma das maiores exportadoras de carne in natura da América Latina.
“A Salic — braço agropecuário do fundo soberano — tem 34% da Minerva e adquiriu, recentemente, 10% da BRF.”