Renault, Nissan e Mitsubishi mudam estratégia global para sobreviver à crise
Maior aliança de fabricantes de carros do mundo abandonou de vez o posicionamento de crescimento a todo custo adotada pelo ex-chefe Carlos Ghosn
Renault, Nissan e Mitsubishi Motors fabricarão menos modelos, compartilharão instalações de produção e se concentrarão nas forças geográficas e tecnológicas de cada montadora, enquanto tentam cortar custos. Tudo para enfrentar a pandemia do novo coronavírus.
A maior aliança de fabricantes de carros do mundo anunciou essas medidas em 27 de maio, abandonando de vez a estratégia de crescimento a todo custo adotada pelo ex-chefe Carlos Ghosn, cuja prisão em 2018 por acusações de má conduta financeira levou o grupo à desordem.
“O novo modelo da aliança é focado na eficiência e na competitividade, e não nos volumes”, explicou Jean-Dominique Senard, presidente da Renault, a jornalistas. “Nosso objetivo é aumentar a competitividade e a lucratividade de cada uma das três empresas”.
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A nova estratégia fará com que cada membro da aliança assuma a liderança em geografias específicas, enquanto os outros membros o seguem. A Nissan (NSANF), por exemplo, liderará o caminho na América do Norte, Oriente Médio e nos principais mercados da Ásia, incluindo China e Japão. Por sua vez, a Renault (RNLSY) assumirá a primeira posição na Europa e na América do Sul, enquanto a Mitsubishi recebeu partes do Sudeste Asiático e da Oceania.
A aliança aplicará uma estratégia semelhante em relação à tecnologia e à engenharia. A Nissan assumirá a liderança na direção autônoma, enquanto a Renault abordará as tecnologias de carros conectados baseados no sistema Android. As empresas também reduzirão o número total de modelos que vendem, e passarão a construir mais carros em plataformas compartilhadas, além de projetá-los para usar mais peças iguais.
A Renault e a Nissan devem anunciar cortes de vagas e fechamento de fábricas nos próximos dias. As duas empresas são parceiras desde 1999, cooperando na estratégia e no desenvolvimento de produtos, sem nunca concluir uma fusão completa. Juntamente com a parceira júnior Mitsubishi Motors, a aliança exclusiva emprega cerca de 450 mil pessoas e, em 2018, vendeu um de cada nove carros no mundo.
Até agora, as empresas mantiveram instalações de fabricação separadas na maioria dos casos. Mas, sob a nova estratégia, mais fábricas produzirão carros de mais de uma marca. Na América Latina, por exemplo, duas fábricas produzirão SUVs Renault e Nissan.
O aprofundamento do compromisso marca uma grande mudança: até o ano passado, a Renault estava olhando para fora da aliança para cortar custos, mantendo negociações de fusão com a Fiat Chrysler. Mas a empresa ítalo-americana concordou em fazer uma fusão com a Peugeot e a Citroën, fechando um caminho potencial para a colaboração da Renault.
A saída de Ghosn, que negou ter agido de maneira inadequada, provocou uma série de mudanças nas lideranças de ambas as montadoras, levantando dúvidas sobre a sobrevivência da aliança. Ligadas por meio de uma série de participações acionárias, Nissan e Renault negaram em janeiro relatos de que estavam se separando.
Então chegou o coronavírus, mergulhando a aliança mais profundamente na crise e clamando por uma revisão abrangente.
A Nissan deve anunciar a redução de sua capacidade de produção global em 20% e fechar uma fábrica em Barcelona. A mídia japonesa informou que a Nissan poderia reduzir sua força de trabalho em 20 mil postos. Já a Renault também pode parar de fabricar dois modelos na Espanha e transferir essa produção para a enorme fábrica da Nissan na Inglaterra, segundo o Financial Times.
Renault e Nissan já estavam lutando
A Renault já estava com problemas antes da pandemia. A montadora francesa registrou seu pior desempenho financeiro em uma década no ano passado, com o lucro líquido caindo 99%, para apenas 19 milhões de euros (US$ 21 milhões). O valor de suas ações despencou 69% desde o início de 2019.
Em abril, quando a pandemia atingiu a Europa e a América do Norte, as vendas globais da empresa caíram quase 70% em comparação com o mesmo mês do ano passado. A empresa interrompeu a produção em suas 12 montadoras na França em meados de março, retomando as operações na maioria das fábricas apenas em maio.
Também houve tumulto nas posições dos executivos. O sucessor imediato de Ghosn, o CEO Thierry Bolloré, foi deposto em outubro passado no que ele denunciou como um “golpe”. O sucessor de Bolloré, Luca de Meo, só começa a trabalhar em julho.
O ministro das Finanças da França, Bruno Le Maire, alertou que a Renault está em “sérias dificuldades financeiras”. “A Renault pode desaparecer”, declarou Le Maire à rádio Europe 1 no dia 22 de maio.
O governo francês possui 15% da Renault e atualmente está negociando os termos de um empréstimo de 5 bilhões de euros (US$ 5,4 bilhões) para a empresa. Na entrevista à rádio Europe 1, o ministro das Finanças disse que a Renault não deve fechar uma fábrica ao norte de Paris – uma das poucas instalações que atualmente produz carros para a Nissan.
“Assinaremos [o empréstimo] quando soubermos qual é a estratégia da Renault”, disse Le Maire. Os planos da empresa devem incluir uma transição para veículos mais ecológicos. “Queremos que a Renault seja mais produtiva e produza ainda mais de seus veículos, principalmente elétricos, na França”, acrescentou.
Na terça-feira, o presidente francês Emmanuel Macron anunciou um pacote de ajuda de US$ 8,8 bilhões para a indústria automobilística em apuros no país. O plano inclui grandes incentivos para os consumidores comprarem carros novos, com o governo oferecendo subsídios no valor de mais de US$ 7.000 para veículos elétricos e US$ 2.000 para híbridos.
A Nissan, que apresenta resultados financeiros para o ano fiscal de 2019 em 28 de maio, sofreu quatro trimestres seguidos de queda nos lucros. O lucro operacional caiu para 54,3 bilhões de ienes (US$ 504 milhões) nos três meses findos em dezembro, caindo 83% em relação ao mesmo trimestre do ano anterior.
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