Mercado comemora o quê?
Depois de um começo tímido, a bolsa de valores embalou numa melhora entusiasmada. No meio da tarde, a alta do índice da B3 bateu em 9% e o dólar caiu abaixo dos R$ 5,00. De onde veio tanta empolgação? Do acordo entre governo e parlamento dos Estados Unidos para um gigantesco pacote de gastos públicos? Ou da chance de haver um slowdown no lockdown nas principais cidades do Brasil?
“Não tem nada a ver uma coisa com a outra. O movimento de hoje, seguindo o mesmo de ontem, está direcionado a lá fora. A confusão criada pelo Bolsonaro sobre o confinamento ainda não fez preço no mercado daqui. Até porque, se o Brasil começar a fazer as coisas completamente diferentes do que todos lá fora estão fazendo, nós vamos ter que esperar para saber se nós estamos certos e o mundo está errado”, disse à coluna um experiente gestor de investimentos que já ocupou cadeira espinhenta no setor público, em outras crises que país enfrentou.
Da turma mais jovem, que ganhou apelido de FariaLimers, em alusão à avenida paulistana que concentra as maiores casas financeiras do país, a resposta foi oposta.
“Mercado estava panicado (sic) com perspectiva de lockdown até Julho. Desde ontem, Abril já parece muito mais plausível. E isso não tem a ver com discurso do presidente Bolsonaro. Ninguém aqui dá bola para ele. A preocupação é com o impacto na economia”, defende um gestor mais jovem de uma grande corretora.
“Mercado está forte comprador porque a sinalização de que a atividade pode voltar antes do previsto e o lockdown não se arrastar por mais tempo é vista como positiva. É só olhar o que está acontecendo no mercado de juros futuros hoje. Todos os contratos negociados até 2027 já estão com juros em queda, o que aponta para uma percepção de risco menor”, defendeu outro executivo não tão velho, não tão jovem, um pouco mais distante da Faria Lima.
A cabeça branca de quem já viu e viveu crises agudas no pais pondera que o preço do Brasil hoje reflete muito mais a fragilidade e a deterioração fiscal do que uma alta no mercado financeiro. O que disse ou não o presidente Bolsonaro perde relevância se o país não for capaz de encontrar as soluções corretas para a instabilidade atual e a que virá. E o mapa da mina não precisa apenas de uma clara indicação do destino.
“Minha maior preocupação hoje é com a sanha que já surge em Brasília para assaltar o meu, o seu, o nosso dinheiro que está no Tesouro Nacional. Ainda bem que tem o Mansueto (de Almeida, Sec do Tesouro) lá, dá um alívio. A preocupação é se ele vai aguentar essa sanha que se arma e fazer com que o uso do dinheiro público seja para o que precisa”, alerta o ex-gestor público.
E eu pergunto: Mas e o Paulo Guedes, não tranquiliza?
“Ah não. Ele foi chamado para fazer um trabalho, reformar o estado brasileiro. Acabou este projeto. Quando passar a crise, o que vai sobrar para ele fazer lá? A agenda mudou, ele vai ter que lidar com uma dívida pública que vai subir para 85%, 90% do PIB. Não é a agenda do Paulo Guedes. Mas tem lá o Mansueto…”, profetiza.