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    Socorro aos Estados dificulta emissão de títulos de longo prazo, diz Tesouro

    Técnicos da equipe econômica relataram que o projeto de auxílio aprovado pela Câmara pressiona o endividamento da União sem qualquer previsibilidade

    Reuters

    A batalha do Ministério da Economia contra o andamento do projeto para auxílio a estados e municípios continua em Brasília. Desta vez, técnicos da equipe econômica relataram que ele pressiona o endividamento da União sem qualquer previsibilidade num momento em que o Tesouro Nacional já enfrenta dificuldades para colocar títulos longos no mercado.

    Em nota técnica assinada pelo secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, o órgão argumentou que a compensação de recursos pela União aos entes regionais estabelecida pelo projeto não tem impacto delimitado, já que parte do pressuposto de que as receitas com ICMS e ISS cairão em 30% em seis meses, o que é impossível precisar.

    Caso a perda seja dessa magnitude, a transferência será de R$ 84 bilhões, a ser financiada por emissão de dívida, destacou o Tesouro. Mas o projeto da Câmara abre margem para que os Estados e municípios concedam postergações ou benefícios tributários em relação a esses impostos sob determinadas premissas, o que pode aumentar a compensação a ser feita pela União.

    Na nota, o Tesouro frisou que a cada 10% a mais de perda de arrecadação, as compensações da União aumentam em cerca de R$ 28 bilhões. Se a diminuição no recolhimento de ICMS e ISS for de 50% no período, o repasse da União se aproximaria de R$ 140 bilhões.

    Nesta quarta-feira, o presidente do Comsefaz (Comitê Nacional de Secretários de Fazenda dos Estados), Rafael Fonteles, estimou que só em maio haverá “queda brutal” na arrecadação, de mais de 40%.

    “Nenhum governo tem capacidade de se endividar infinitamente e controlar a inflação simultaneamente. Ainda que, em tese, um governo possa ofertar quantos títulos quiser, ele só poderá emitir se tiver alguém que os compre. Em casos extremos, a demanda por títulos públicos pode tender a zero”, disse o Tesouro.

    “São casos em que nenhum agente privado confia na solidez das contas do governo, nem no presente, nem no futuro, e são associados ao fenômeno da hiperinflação, pois o próprio governo passa a emitir moeda para comprar seus títulos. Nesse sentido, uma das causas dos processos de descontrole inflacionário é o descontrole das contas públicas”, completou.

    A nota ressaltou que a dívida bruta brasileira já é muito alta, perto de 80% do Produto Interno Bruto (PIB), e que o Tesouro tem “enfrentado dificuldades de colocar títulos com vencimentos mais longos no mercado, isso mesmo antes de o Brasil ter sido atingido pela pandemia”.

    O documento também reforçou que o Tesouro foi obrigado, no cenário atual de incertezas, a cancelar diversos leilões em março.

    Em outra frente, o Tesouro avaliou que o critério de distribuição de recursos proposto pelo projeto da Câmara não é adequado, uma vez que premiaria os Estados e municípios que desistissem de arrecadar já que a proposta é de compensação integral pela União, em detrimento daqueles que fossem diligentes e fizessem um esforço arrecadatório.

    Como o endividamento da União é pago por toda a sociedade, “a relação entre benefícios e custos arcados por cada cidadão de cada ente poderá ser desigual e injusta”, disse o Tesouro.

    “Cabe destacar que, apesar de alguns entes estarem em grave crise fiscal, já com endividamento acima dos limites legais ou de sua capacidade de arcar com seus pagamentos, há Estados e Municípios com baixo nível de endividamento, que poderiam contrair dívidas por conta própria”, afirmou o órgão.

    Risco jurídico

    A nota técnica também apontou a existência de vários pontos de insegurança jurídica no texto aprovado pela Câmara e lembrou que no modelo de seguro-receita a novela da Lei Kandir poderá ser revivida.

    Até hoje os Estados requerem compensação à União pelo não recolhimento de ICMS sobre exportações, que foi definido pela Lei Kandir, de 1996. Segundo a nota técnica, a conta apresentada seria de cerca de R$ 39 bilhões de anuais mais um passivo de cerca de R$ 500 bilhões.

    “Na época da edição da Lei Kandir a ideia também era criar um seguro para uma situação provisória e hoje, 25 anos depois, realizando repasses durante todos esses anos, a União está tentando um acordo, que lhe custará R$ 60 bilhões, se aceito, para resolver a questão”, disse o Tesouro.

    O governo revelou na véspera proposta para transferir diretamente a Estados e municípios um valor fixo de R$ 40 bilhões em meio à crise, valendo por um período de três meses, em vez do modelo aprovado pela Câmara.

    Membros da equipe econômica disseram que isso pode ser encaminhado via Medida Provisória (MP), mas que antes haverá conversa com senadores para eventual modificação do projeto já chancelado pelos deputados e que, para valer, ainda precisa ser votado no Senado.

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