Tencent, dona do WeChat, vira alvo de Trump na guerra tecnológica com a China
Empresa pode ter impacto significativo nas receitas se não puder ser mais baixado em celulares no território americano
A Tencent acaba de se tornar o alvo mais recente na rápida escalada do presidente Donald Trump em sua guerra tecnológica com a China.
O aplicativo de mensagens da empresa, o popular WeChat, pode ser banido nos Estados Unidos se a Tencent não concordar em vendê-lo até meados de setembro. O anúncio abalou os investidores e deixou as empresas e os analistas lutando para descobrir suas potenciais consequências.
As ações da Tencent despencaram em até 10% em Hong Kong. Parte das perdas foi reduzida na sequência, mas ainda assim a empresa encerrou a sexta-feira (7) com queda de quase 5%. O índice Hang Seng de referência da bolsa de Hong Kong (HSI) caiu 1,6%.
Trump emitiu decretos presidenciais na noite de quinta-feira (6) que proibiriam o WeChat e o TikTok, o aplicativo de vídeos curtos de propriedade da ByteDance, de Pequim, de operar nos Estados Unidos em 45 dias caso não sejam vendidos por suas empresas-mãe.
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Trump já tinha dito que baniria o TikTok se um acordo para ele não fosse fechado com uma empresa norte-americana, mas a inclusão do WeChat indica que Washington está ampliando seus esforços para restringir alguns aplicativos chineses de operar nos Estados Unidos.
O movimento para banir o TikTok e o WeChat representa uma “intervenção inédita do governo dos EUA no setor de tecnologia de consumo”, de acordo com Paul Triolo, chefe de geotecnologia do Eurasia Group, uma consultoria de risco político.
Em nova divulgada na sexta-feira (7), o consultor escreveu também que “a ação também marca a primeira vez que um governo “tentou proibir um aplicativo em execução em milhões de telefones celulares” nos Estados Unidos.
Golpe na diáspora chinesa
Uma proibição do WeChat seria um golpe para a diáspora chinesa (formada por imigrantes e refugiados daquele país), estudantes e outras pessoas nos Estados Unidos que contam com o aplicativo para se comunicar com familiares, amigos e parceiros de negócios na China.
O WeChat é a versão internacional do popular aplicativo de mensagens chinês Weixin, também da Tencent. O aplicativo fornece uma variedade de serviços, incluindo mensagens instantâneas e a capacidade de enviar dinheiro para outros usuários.
De acordo com o decreto, uma proibição se aplicaria a “qualquer transação relacionada ao WeChat” feita por qualquer pessoa ou “qualquer bem” sujeitos à jurisdição dos Estados Unidos.
O Ministério das Relações Exteriores da China disse na sexta-feira (7) que “se opõe firmemente” aos decretos presidenciais dirigidas ao WeChat e ao TikTok.
“Os Estados Unidos estão usando a segurança nacional como desculpa e usando o poder do Estado para oprimir empresas que não são norte-americanas”, afirmou o porta-voz do ministério, Wang Wenbin, durante a coletiva de imprensa diária, acusando os EUA de “manipulação política e opressão”.
O TikTok declarou ter ficado “chocado” com o decreto de Trump e alertou que “estabelece um precedente perigoso para o conceito de liberdade de expressão e mercados abertos”. A empresa disse que “buscará todas as medidas judiciais cabíveis”.
Um porta-voz da Tencent, entretanto, disse que a empresa “está revendo o decreto presidencial para obter um entendimento completo”.
A empresa sediada em Shenzhen é campeã nacional de tecnologia na China. O Weixin é uma necessidade diária de centenas de milhões de chineses, que usam o aplicativo para enviar mensagens a amigos, compartilhar fotos, agendar caronas, pagar produtos e serviços, fazer reservas em restaurantes e pedir comida, entre várias outras funções.
A Tencent informou em março que o Weixin e o WeChat têm quase 1,2 bilhão de usuários ativos mensais. A empresa não divulga números de usuários por país, mas analistas do setor dizem que a grande maioria deles está na China.
De acordo com a empresa de pesquisa de mercado Newzoo, a Tencent também é a maior empresa de games do mundo em receita. Ela detém vários jogos tanto para dispositivos móveis como para videogames e também é dona da Riot Games, com sede nos EUA, tem participação majoritária na Supercell e minoritária em outras empresas internacionais de jogos, como a Epic (EPOR) e Activision Blizzard (ATVI), entre outras, de acordo com o analista da Bernstein David Dai.
A empresa também é um dos maiores provedores de serviços em nuvem da China, tem um negócio de streaming de música – o Tencent Music (TME), com ações negociadas em Wall Street –, opera um aplicativo de streaming de vídeo popular e lançou recentemente um aplicativo de compartilhamento de vídeo de formato curto para competir com o TikTok na China.
Mesmo com a queda das ações hoje, as ações da empresa subiram 40% no ano. Ou seja, a gigante chinesa continua sendo uma das empresas de tecnologia mais valiosas do mundo, com um valor de mercado de mais de 5 trilhões em Hong Kong (US$ 650 bilhões), mais que o dobro do valor da Netflix.
Um ataque simbólico
Até o momento, o ataque de Trump ao Tencent é principalmente simbólico, dada a pequena participação de mercado do WeChat nos Estados Unidos. Mas, se ele se expandir para aplicativos de jogos ou outras áreas de negócios da Tencent, o problema pode ser grande.
Mais da metade da receita da Tencent no ano passado veio dos chamados Serviços de Valor Agregado, que incluem o lucrativo portfólio de games da empresa. Os serviços financeiros e aplicativos de pagamento como o WeChat Pay contribuíram com cerca de 25% da receita, e pouco menos de 20% vieram da publicidade online.
A Tencent opera aplicativos populares de jogos para dispositivos móveis, como o PlayerUnknown’s Battlegrounds ou PUBG. Os jogadores norte-americanos gastam muito dinheiro no PUBG – ele ficou em 10º lugar nos Estados Unidos em gastos de consumo em games no ano passado, segundo a empresa de análise App Annie.
Se a proibição de aplicativos chineses for expandida, o que parece ser a intenção do governo Trump, a Tencent pode perder os Estados Unidos como mercado para seus jogos para celular.
O secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, disse na quarta-feira (5) que “aplicativos chineses não confiáveis” deveriam ser removidos das lojas de aplicativos dos EUA. Pompeo não forneceu mais detalhes sobre como restrições amplas seriam implementadas ou se seria necessário o apoio de empresas privadas.
Os decretos presidenciais de Trump “no mínimo forçariam os fornecedores de lojas de aplicativos dos EUA, a Apple e o Google, a remover os dois aplicativos após o período de 45 dias”, segundo Triolo.
Dano colateral?
O que ainda não está claro é se as lojas de aplicativos da Apple e do Google na China também precisariam retirá-los após 45 dias, já que são operadas por empresas norte-americanas.
“Dado que o WeChat se tornou uma parte crucial da vida cotidiana e do comércio na China, esse movimento provavelmente também seria catastrófico para os negócios da Apple na China – sem o Weixin disponível no iPhone, por exemplo, as vendas provavelmente cairiam”, explicou o consultor Triolo.
Graham Webster, especialista em economia digital da China no think tank New America, com sede em Washington, duvida que as proibições sejam implementadas.
“Existem preocupações reais de privacidade e cibernética com empresas chinesas que usam aplicativos, mas não é isso que está acontecendo. Se fosse essa a questão, a abordagem teria de ser muito mais ampla e técnica”, disse Webster.
“Eu vi um lobby intenso por parte das empresas norte-americanas. As pessoas vão recuar e o governo tem um histórico de adiar e modificar esse tipo de retórica”, acrescentou.
(Brian Fung contribuiu para esta reportagem)
(Texto traduzido, clique aqui para ler o original em inglês).
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