OAB-RJ cobra respostas sobre operação no Jacarezinho que deixou 28 mortos
Presidente da Comissão de Direitos Humanos diz que nada justifica uma ‘operação desastrosa’ e que não cabe à polícia decidir quem vive e quem morre
A Comissão de Direitos Humanos da seção do Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ) cobrou explicações sobre a operação realizada na semana passada pela Polícia Civil comunidade do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, que terminou com 28 mortos.
O presidente do colegiado, Álvaro Quintão, diz que a polícia, ao ressaltar a informação de que todos os mortos têm envolvimento com o crime, tenta construir uma narrativa para esconder possíveis falhas.
“Independente disso, podem ser todos bandidos ou inocentes, nada justifica uma operação desastrosa. Mesmo que tivessem passagem pela polícia, nada justifica a chacina praticada por agentes do Estado. A polícia não pode definir quem vive e quem morre. Se havia mandados de prisão, eles deveriam ser cumpridos respeitando o Estado de Direito”, afirmou à CNN.
Quintão também disse que espera uma investigação feita por agentes imparciais. “Que sejam apuradas as responsabilidades daqueles que decidiram pela morte de quase três dezenas de pessoas, inclusive de um policial. Que sejam apuradas as responsabilidades de quem deu a ordem para descumprir uma decisão do [Suprem Tribunal Federal] STF que proíbe ações desta natureza durante o período de pandemia”, declarou.
Em entrevista à CNN no domingo (9), o delegado Rodrigo Oliveira, subsecretário de Planejamento e Integração Operacional da Polícia Civil, negou qualquer execução e afirmou que as equipes foram recebidas por traficantes fortemente armados.
“A gente está enfrentando o crime organizado a ponto de uma quadrilha com tantos elementos fortemente armados estarem enfrentando o Estado. E a gente vai se fazer valer, a gente vai se fazer presente. Dessa investigação específica, três elementos foram presos e três elementos vieram a falecer no confronto. Isso é a prova cabal que aqueles que não quiseram enfrentar foram presos. Aqueles que, de alguma forma, tentaram enfrentar o Estado e a Polícia Civil, eles acabaram vindo a falecer”, afirmou.
Números da operação no Jacarezinho
A operação realizada na quinta-feira (9) causou a morte de 28 pessoas – o policial civil André Frias e 27 suspeitos, segundo a polícia. No sábado (7), os nomes dos mortos foram divulgados, com a informação de que 25 têm antecedentes criminais e existem provas contra os outros 2.
“A gente não pode considerar uma operação bem-sucedida, um sucesso, uma operação que termina com tantas vítimas”, afirmou Oliveira.
“Todos eles, sem absoluta exceção, nós temos a convicção e as provas cabais no sentido de que são envolvidos com o tráfico de drogas. Uma vez feita a opção por eles no sentido de fazer o enfrentamento, o Estado se fez presente com a Polícia Civil”, completou..
Ao justificar a ação ao Ministério Público, como determina a decisão do STF que restringe operações policiais em comunidades durante a pandemia, a Polícia Civil citou o cumprimento de mandados de uma investigação sobre tráfico de drogas.
Dos 27 mortos considerados suspeitos, 3 são citados no processo. De acordo com informações da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente, outros 3 foram presos e 15 estão foragidos.
A Polícia Civil, em entrevista coletiva após a ação no Jacarezinho, apontou que a organização criminosa investigada ainda atuaria no aliciamento de crianças e adolescentes, roubo de cargas, assaltos a pedestres, homicídios e sequestros de trens.
No entanto, como relatou o analista da CNN Fernando Molica, os crimes não são citados na denúncia, baseada em fotografias publicadas pelos suspeitos em redes sociais em que aparecem armas e drogas.
Questionada sobre os crimes não serem elencados na denúncia, a Polícia Civil informou que um segundo inquérito tramita em sigilo e apura a cooptação de jovens para o tráfico no Jacarezinho. Também disse que as apurações “não necessariamente precisam estar vinculadas a um mesmo inquérito” e que a operação foi baseada em diversos “trabalhos de investigação e inteligência”.
“No que diz respeito à operação propriamente dita, é uma investigação de mais de dez meses, 21 mandados de prisão foram expedidos, o que corrobora o entendimento de que o Ministério Público, tanto com Judiciário, entendem que aquela operação era necessária. Por essa razão, foram expedidos os mandados e a gente fez a diligência”, relatou.