Enchente catastrófica na Líbia ocorreu em 90 minutos, dizem autoridades
Equipes de resgate relatam centenas de corpos sendo retirados diariamente do mar
Autoridades afirmaram à CNN que a destruição e mortes pelas enchentes na Líbia aconteceram cerca de 90 minutos após o rompimento das duas barragens acima de Derna, provocando a inundação da cidade, destruindo bairros inteiros, casas e infraestruturas, transportando-as para o mar.
Mais de 6 mil pessoas morreram, e outras 10 mil estão desaparecidas, embora as estimativas de diferentes autoridades e grupos de resgate líbios tenham variado e o número de vítimas deva aumentar.
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Todos com quem a CNN falou em Derna temem e acreditam que o número de mortos aumentará significativamente nos próximos dias.
Dirigir até Derna de madrugada era como chegar a uma cidade fantasma, dizimada pelas inundações repentinas que devastaram casas e ruas no início desta semana.
Mesmo à noite, danos e destruição podiam ser vistos em todos os lugares que você olhasse. À luz do dia, uma cena de devastação total.
Para a equipe da CNN no local, que viajou para a área com o Exército Nacional da Líbia, foi como entrar numa zona de guerra, onde bombas enormes tinham explodido.
As pessoas estão em choque. Este é um país que tem vivido anos de turbulência desde a derrubada do regime de Muammar Gadhafi em 2011 – mas o desastre atingiu duramente os líbios.
Eles dizem que ainda não conseguem compreender o que aconteceu. Mesmo acostumados com a guerra e a morte, nada poderia tê-los preparado para isso: eles sentem como se uma cidade inteira tivesse sido destruída.
Ao passar por uma das entradas da cidade de Derna na madrugada, havia um grande quadro feito à mão que dizia “Triste Derna”.
Dois jovens estavam sentados ao lado dele, em volta de uma fogueira, numa rua totalmente escura, com os pés cobertos de lama e as roupas em pó. Eles acenaram para a escolta do Exército Nacional da Líbia, sorriram e fizeram um gesto de “V” com a mão.
As autoridades da cidade estão realizando operações de busca e resgate, recuperação, drenagem das águas das cheias, ajuda aos deslocados – situações com as quais nunca lidaram antes. Entretanto, um funcionário do governo disse à CNN que não acredita que a busca por sobreviventes tenha terminado.
Autoridades líbias dizem que os corpos ainda aparecem nas margens de Derna, dias depois que a água varreu a cidade.
“Meses, talvez anos” para cidadãos se recuperarem
Objetos pessoais também podem ser vistos nas águas do Mediterrâneo – caixilhos de portas, janelas, móveis, roupas, carros – tudo.
Enquanto isso, pelo menos 30 mil pessoas foram deslocadas, informou na quinta-feira (14) a Organização Internacional para as Migrações. A preocupação com o bem-estar dos sobreviventes está crescendo.
O chefe da delegação da Cruz Vermelha na Líbia disse que levaria “muitos meses, talvez anos”, para que os residentes se recuperassem da devastação causada pelas fortes chuvas da tempestade Daniel.
As inundações danificaram estradas e pontes, dificultando o acesso à cidade e arredores. Foram necessárias mais de sete horas para viajar do aeroporto de Benghazi até Derna na noite de quinta-feira – uma viagem que normalmente levaria três horas.
Isto, combinado com uma situação de insegurança, dificulta a passagem da ajuda humanitária. No entanto, alguns líbios disseram à CNN como consideram que esta tragédia uniu um país dividido, pelo menos por agora.
A Líbia tem sido devastada por turbulências políticas desde que a guerra civil eclodiu em 2014, e agora tem dois governos rivais: o de Benghazi, apoiado pelo parlamento oriental, e o governo internacionalmente reconhecido de Trípoli.
Mas no caminho de Benghazi, podiam ser vistos muitos carros chegando de diferentes cidades de toda a Líbia – do extremo-oeste e das montanhas ocidentais, ou da cidade costeira de Misrata, a sul – transportando voluntários ou trazendo ajuda.
Alguns motoristas pintaram seus carros com spray ou hastearam bandeiras com uma frase que poderia ser traduzida como “solidariedade fraterna” ou “correr em socorro de nossos irmãos”.
Os voluntários que chegam a Derna vindos de todo o país estão tentando ajudar nos esforços de recuperação. Mas alguns disseram à CNN que não estavam preparados para lidar com este tipo de situação.
Um jovem descreveu como os voluntários amarravam cordas em volta dos seus corpos para mergulhar no mar e retirar os corpos. Ele contou ter retirado 40 corpos sozinho no decorrer de um dia.
Os voluntários pontuam que precisam de equipamento pesado que possa remover do mar objetos grandes, como carros — que podem ainda conter cadáveres. Eles também precisam de mergulhadores e de equipamento de mergulho, adicionam.
Mesmo com apoio internacional, incluindo uma equipe de resgate turca em um barco de borracha, não é o suficiente para lidar com este desastre.
E ao aterrissar no aeroporto de Benina, em Benghazi, parecia não haver grande afluxo de ajuda, como seria de esperar após uma catástrofe desta escala.
Os responsáveis do Exército Nacional da Líbia afirmaram, no entanto, que o apoio que receberam dos países que enviaram equipes os ajudou a lidar com uma situação sem precedentes.
“Dor imensa”, diz voluntário
Mohammad Shteiwi, um ativista nas redes sociais de Misrata que foi a Derna para ajudar nas operações de resgate, contou à CNN que viu equipes internacionais de mergulho retirarem oito corpos da água na tarde desta sexta-feira (15).
“Os mergulhadores me disseram que viram centenas de corpos a cerca de 15 a 20 quilômetros a leste do porto de Derna”, destacou ele por telefone.
“Vi tantos corpos nos últimos dois dias. Contei pelo menos 200 corpos que foram levados à costa. Eram corpos que estavam em edifícios, engolidos pelo mar e empurrados de volta para a costa”, relatou.
“As estatísticas não são precisas, há muitos números circulando por aí. Tudo o que posso dizer é que as operações estão em andamento. Eu mesmo retirei os corpos”, complementou.
Shteiwi afirmou que seu “coração dói por todos aqueles que foram perdidos”, mas que viu um sinal positivo com a união dos líbios do leste e do oeste.
“As forças de segurança que antes estavam separadas trabalham agora em conjunto, como se essas diferenças estivessem no passado. Dói ver que esta unificação é resultado de imensa miséria e imensa dor.”
Celine Alkhaldi e Sarah Sirgany, da CNN, contribuíram para esta reportagem