O Grande Debate: Quando protesto vira ato terrorista como classificou Bolsonaro?
Thiago Anastácio e Gisele Soares divergiram sobre a classificação de atos como terroristas e discutiram se Bolsonaro imita Donald Trump
O Grande Debate da manhã desta quinta-feira (4) abordou a declaração do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que classificou como terroristas os manifestantes que, nas palavras dele, “promovem o caos, queimam a bandeira nacional e usam da violência como uma forma de ‘protestar'”. “Manifestante, contra ou a favor do governo, é outra coisa”, completou ele, em publicação feita no Twitter, na quarta-feira (3).
A declaração foi relacionada aos protestos realizados na avenida Paulista, no último domingo (31), que terminou em tumulto e enfrentamento com policiais. O presidente também já havia criticado o ato de Curitiba, na segunda-feira, que teve depredação de agências bancárias, pontos de ônibus e alguns comércios.
O mediador da edição matinal, Evandro Cini, citou a declaração do presidente e questionou os advogados Thiago Anastácio e Gisele Soares sobre se é possível qualificar esses movimentos como terroristas – como fez Bolsonaro – e quando eles se tornam atos dessa alcunha.
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Gisele Soares avaliou que a classificação feita pelo presidente tem base no conhecimento popular. “Na capitulação da lei antiterrorismo não há especificamente as manifestações de cunho político, embora o terrorismo, neste caso que foi usado pelo presidente da República, provavelmente, não foi este conceito técnico da lei, mas aquele do conhecimento popular”, avaliou.
“Então, neste caso, atos terroristas são aqueles atos de violência praticados contra pessoas e patrimônios que tenha intenção de provocar terror”.
Thiago Anastácio defendeu que o conceito seja usado com base nas definições legais. “Nós precisamos entender o que é terrorismo para falar se os atos praticados no Brasil são terroristas. Não podemos comparar coisas desiguais. Chamarmos de terrorismo os excessos das manifestações – ou possíveis crimes que ocorram – e equiparar isso ao que já fez o Hamas, o Hezbollah, o ETA, o IRA [Exército Republicano Irlandês] e a Al-Qaeda é desonestidade intelectual. No direito, não podemos admitir que jogar avião sobre torres, bombardear escolas israelenses, explodir shoppings em Barcelona e Madri se comparem a quebra de vidraças na avenida Paulista”, defendeu.
“O excesso deve ser punido como diz a lei. Que as manifestações sejam pacíficas, como devem ser, mas, se houverem excessos, que sejam punidos nos crimes de danos. Terrorismo é outra coisa”, acrescentou.
Bolsonaro segue linha de Trump?
Anastácio fez criticas ao fato da classificação de Bolsonaro ocorrer horas após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, dizer o mesmo sobre as manifestações contra a morte de George Floyd, que já tomaram mais de 140 cidades do país e ocorrem diariamente há mais de uma semana.
“Antes de mais nada, vejo o crime de pirataria aí. Trump alcunhou de terroristas as manifestações americanas pela morte de George Floyd. Então, 48h depois, mais uma vez – como já aconteceu com a cloroquina e quase tudo nessa relação entre Brasil e Estados Unidos – Bolsonaro imita Trump, que não me parece a melhor pessoa do mundo a ser imitada”, afirmou Anastácio.
Gisele defendeu que “o mundo vive situações muito similares” e “não acredita em pirataria”. “O presidente do Brasil está preocupado com as questões brasileiras e os excessos no Brasil que, assim como nos Estados Unidos, devem ser contidos”, analisou. “Ele não imitou. São situações distintas embora semelhantes e a preocupação de Bolsonaro é conter essa escalada aqui no Brasil”, completou.
Considerações finais
Em suas considerações finais, Anastácio falou sobre a importância da imparcialidade na citação fatos. “A opinião é fundamentalmente parcial na sua origem, mas os fatos são muito relevantes. Hoje discordei da minha amiga Gisele Soares porque vi os fatos ocorrendo ao vivo. Não houve agressão por parte das pessoas vestidas de preto até elas serem colocadas para fora do [vão] do Masp. Depois esse estopim foi acionado, infelizmente”, afirmou.
“É importante dizer que precisamos, de uma vez por todas, nos portamos como nação. Precisamos de respeito. Tem gente que sofre todos os dias”, finalizou.
“Meus argumentos finais são, na verdade, um convite para que as pessoas leiam a Constituição Federal”, disse Gisele, destacando o Art. 5º, que fala sobre as garantias fundamentais.
“Isso porque nós temos debatido aqui uma série de temas jurídicos e, justamente, é muito importante para o aprofundamento do exercício da cidadania que as pessoas se assenhorem de seus direitos e compreendam quais são seus deveres e responsabilidades”, encerrou.
Ouça a íntegra do debate:
(Edição: Sinara Peixoto)