Fome volta a rondar o Brasil, que desperdiça 40% dos alimentos produzidos
Mais de 10 milhões de pessoas não têm o que comer no país
A insegurança alimentar voltou a rondar o Brasil depois de anos em queda. Mais de 10 milhões de pessoas – segundo dados mais recentes do IBGE – não têm o que comer no país.
Nos últimos cinco anos, três milhões de brasileiros passaram a integrar a estatística do instituto e o número pode crescer ainda mais.
Esta marca poderia começar a ser resolvida se tanta comida não fosse parar no lixo. No Brasil, 40% de tudo que é produzido é jogado fora, alerta a FAO, braço da Organização das Nações Unidas para alimentação.
“São alimentos que são desperdiçados e que daria para alimentar toda a população que passa fome mais de três vezes ao dia”, diz Daniel Balaban, diretor do Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas no Brasil.
Mas o que impulsiona tanto desperdício? O problema é um velho conhecido dos brasileiros: as dificuldades na distribuição.
Longas distâncias associados a péssimas condições da malha logística do país comprometem a chegada dos alimentos à mesa das famílias.
Toneladas deles, muitas vezes, ainda em bom estado para consumo, se perdem ao longo do caminho seja por má conservação ou, até mesmo, por falta de embalagem adequada para o transporte.
Para quem estuda o assunto, uma das soluções é aproximar o produtor do consumidor final, ou seja, garantir alimentos mais frescos e que não dependam tanto da cadeia logística.
Modelos de fazendas urbanas de produção de hortaliças em pequenos espaços começam a se tornar viáveis como modelo de negócio, no entanto ainda estão longe de se tornar realidade fora dos grandes centros.
“Esse tipo de agricultura casa várias tendências de hoje: tecnologia, automação sensoriamento, economia de insumos. Há a possibilidade de se produzir em desertos alimentares, áreas urbanas onde é difícil e caro conseguir hortaliças ou frutas frescas. Sem contar na melhor qualidade nutricional e maior segurança no alimento”, explica Ítalo Guedes, pesquisador da Embrapa que conduz uma pesquisa em uma fazenda vertical em Brasília.
Segundo a engenheira de alimentos Henriette Azeredo, esta é uma tendência importante para o futuro dos alimentos, uma vez que o crescimento populacional segue em curso e há uma falta de espaço para o plantio.
“A gente tem um espaço finito. Não adianta a gente lutar contra isso, então as formas alternativas de otimizar espaço são bem-vindas”, complementa a pesquisadora.
Em São Paulo, a Fazenda Cubo é uma iniciativa que tenta viabilizar a produção de hortaliças em um pequeno espaço em uma das regiões mais nobres da capital.
Em um pequeno ponto comercial de 56m², o empresário Paulo Bressani produz o equivalente a uma fazenda de mil metros quadrados.
E o desperdício é quase zero com o consumo de energia equivalente a uma padaria. Porém, a popularização da prática esbarra no investimento que pode superar R$ 1 milhão.
Ciência das embalagens
Em todo o país, mais de 35% dos domicílios têm algum grau de insegurança alimentar, ou seja, o alimento não chega com a qualidade necessária.
Já a forma grave da insegurança, quando há falta de alimento no prato, atinge quase 5% dos lares, revela a Pesquisa de Orçamentos Familiares do IBGE.
Proteger as frutas no transporte e armazenamento pode ser uma saída para reduzir o desperdício de alimentos. Pesquisadores brasileiros encontraram na natureza uma alternativa viável e que garante um alimento mais fresco.
Por meio de pesquisas em nanotecnologia, a Embrapa Instrumentação, em São Carlos (SP) elaborou uma emulsão da cera de carnaúba capaz de “envelopar” um alimento com uma fina película aumentando a resistência e impedindo a perda de massa ao longo do tempo.
A parceria com a iniciativa privada viabilizou que este produto passasse do laboratório à indústria em pouco tempo. Ele já está sendo utilizado em escala industrial aplicado principalmente em frutos com casca, como é o caso dos cítricos.
Mas em casos em que não é possível reforçar a casca dos frutos, pesquisadores tentam encontrar uma solução para o plástico das embalagens.
Estudar o comportamento de estruturas em uma escala tão pequena permite que a nanotecnologia seja um importante campo para a ciência dos alimentos. Um dos desafios é elaborar compostos biodegradáveis a partir de fontes naturais, como o caso do amido.
“Com o uso da tecnologia a gente consegue inclusive fazer com que os materiais sejam comparáveis a polímeros de alta resistência, como o caso de uma garrafa pet, por exemplo”, explica o professor de engenharia de materiais da UFSCar, Francis Moreira.
No entanto, a exemplo das iniciativas das fazendas verticais, este tipo de solução esbarra no custo para a produção em grande escala.
(*Da DOC. Films, especial para a CNN Brasil)