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    Divulgação de exames de Bolsonaro é questão política, diz Mandetta

    Em entrevista à CNN, ex-ministro da Saúde diz não ver utilidade na divulgação dos testes do presidente; ele disse que foi trocado por alguém mais alinhado

    Da CNN, em São Paulo

    O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta afirmou que não vê “utilidade fática” na divulgação dos exames para o novo coronavírus feitos pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

    Em entrevista à CNN nesta quinta-feira (7), 21 dias depois de deixar a pasta, Mandetta disse considerar que exames médicos são uma questão particular do paciente com seu médico. “Tem que ver o que está motivando [o pedido para que os exames sejam divulgados], eu não consigo entender isso”, afirmou.

    A divulgação dos exames de Bolsonaro é consequência de um processo movido pelo jornal “O Estado de S.Paulo”, que pediu à Justiça que Bolsonaro fosse obrigado a apresentar o resultado.

    “Vi um laudo médico falando que o paciente [Bolsonaro] testou negativo. O juiz acha que não é suficiente, quer o papel do exame. Eu vejo isso como algo mais político, mais jurídico.”

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    O ex-ministro disse ter feito vários testes para a doença enquanto esteve à frente da pasta e que todos deram negativo. “Mas eu não tenho nenhum papel [para provar]. Vamos supor que eu teste hoje e tenha anticorpos [comprovando a infecção]. Não tive sintomas, fui assintomático”, afirmou.

    Ele disse ainda manter uma relação respeitosa com Bolsonaro, apesar de as discordâncias entre os dois enquanto ele ainda fazia parte do governo terem ocasionado sua demissão. “Ele foi eleito. Ele é o presidente da República (…) Nessa questão, ele entendeu que teria a necessidade de outra equipe no Ministério [da Saúde]”, afirmou.

    Questionado se achava que a troca do comando na pasta foi um erro, o ex-ministro afirmou que não poderia responder essa pergunta. “Cabe à história, à evolução dos dados. Às vezes, a pessoa que entrou lá vê alguma coisa que minha equipe não estava vendo e acerta. Pontos para o presidente, pontos para a equipe. E eu torço para que isso aconteça”, completo.

    Próximos passos

    Sobre o que fará daqui para frente, Mandetta afirmou que passou alguns dias descansando em sua fazenda e ainda está estudando os próximos passos, mas aguarda um retorno da comissão de ética da presidência sobre o que é permitido, o que eu pode ou não fazer em função de ser ex-ministro.

    “Eu gostaria muito de poder trabalhar, de ajudar, mesmo porque as informações que eu tive são quase todas públicas, não tenho nada que pudesse ser confidencial”, declarou. “Mas eu tenho que aguardar o posicionamento da comissão de ética da presidência para compreender, na forma da lei”, completou.

    Avaliação de Teich

    Sobre Nelson Teich, seu substituto no Ministério da Saúde, Mandetta disse que o novo ministro é alguém “mais alinhado com a visão econômica dos fatos”, ao dizer que Bolsonaro queria um ministro que não entrasse tanto em conflito quanto ele.

    Ele também preferiu não opinar sobre o fato de o novo ministro ter colocado militares no primeiro escalão da pasta, em postos antes ocupada por técnicos da área da saúde.

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    “É natural quando assume outro ministro que quem está no entorno queira ajudar. O Exército brasileiro tem quadros que eu respeito muito. Ele fez uma decisão na sua história pela ciência, pelo iluminismo, pela retidão, números, transparência”, afirmou.

    “Temos que entender que nosso inimigo em comum é o coronavírus, a Covid-19. E diferente de uma guerra convencional, que tem segredos que devem ser muito bem guardados, na guerra contra o vírus é o contrário. Quando mais a imprensa souber, quanto mais a sociedade souber informações desse inimigo, invisível, mais força a gente ganha para poder combatê-lo e enfrentá-lo.”

    Avaliação inicial influenciou atuação

    O ex-ministro negou que sua gestão tenha errado no planejamento ao enfrentar a crise causada pelo novo coronavírus. Na sua opinião, o que acontece ainda hoje, cerca de três meses depois de a doença se espalhar para fora da China, é consequência das avaliações feitas naquele momento a partir do que foi informado por Pequim.

    Mandetta
    O ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta fala sobre a Covid-19 em entrevista à CNN
    Foto: Reprodução/CNN (7.mai.2020)

    “A primeira impressão era que esse vírus tinha dificuldade para passar de pessoa para pessoa. Somente quando ele chegou na Itália, que vimos o comportamento do vírus no mundo ocidental, é que percebemos que ele é muito competente e se transmite em uma velocidade muito grande”, explicou Mandetta.

    “Nos guiávamos pelo princípio de testar por amostragem e apenas casos graves e mortes. Quando a OMS [Organização Mundial da Saúde] veio com o conceito de testar todo mundo, os EUA e Europa compraram toda a produção [de kits, de máquinas de coleta, etc]”, completou – no começo de abril, o embaixador norte-americano no Brasil, Todd Chapman, negou que seu país tenha interceptado equipamentos.

    Ainda na avaliação de Mandetta, não é possível dizer se a China foi negligente ou não na divulgação de informações sobre a Covid-19, como acusam os Estados Unidos.

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    A China notificou a OMS sobre o surgimento de nova doença respiratória em 31 de dezembro de 2019. No entanto, os primeiros casos em Wuhan, epicentro inicial do novo coronavírus, foram identificados semanas antes, em 8 de dezembro.

    “Não temos essa parte da história (…) e só o tempo e publicações científicas livres poderão responder isso.”

    Lições da pandemia

    Para Mandetta, depois que a pandemia do novo coronavírus for superada, os países devem fazer uma discussão séria de um novo regulamento sanitário internacional que encontre soluções para o fato de hoje entre 95% e 96% da produção de itens hospitalares estarem concentrados em um único país: a China.

    O ex-ministro acredita que isso pode ser benéfico para o Brasil, desde que o país consiga entrar na disputa para se tornar referência nesse mercado. “O mundo vai ter que diversificar fornecedores”, afirmou.

    Ele deu como outro exemplo desse problema o fato de a Índia hoje ser responsável pela produção de mais de 90% das matérias-primas usadas na produção de medicamentos, incluindo aqueles usados em tratamentos contra o câncer e outras doenças de alta complexidade.

    “Imagina se eles fazem um lockdown. Como faremos para garantir a soberania nacional?”, questionou.