Conselho do MP opera para adiar órgão de Aras
O procurador-geral da República, Augusto Aras, pretende criar um órgão para centralizar em Brasília as diretrizes do combate à corrupção no país
A oposição ao procurador-geral da República, Augusto Aras, articula o adiamento da análise da proposta de resolução que prevê a criação da Unidade Nacional de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado. A ideia é aproveitar a maioria independente que as eleições do Conselho Superior do Ministério Público nos últimos dias formaram para postergar o debate.
Aras pretende criar o órgão para centralizar em Brasília as diretrizes do combate à corrupção no país. Para tanto, procuradores aliados seus elaboraram uma proposta de resolução nesse sentido para ser aprovada no colegiado. Ocorre que uma votação ocorrida nesta semana e outra na semana passada mudou o placar interno no Conselho em relação ao procurador-geral. A nova composição tem seis independentes e quatro alinhados a Aras. Antes, eram cinco de cada lado que, em caso de empate, caberia a Aras desempatar.
Com maioria formada que tomará posse em agosto, a articulação em curso é para que o projeto da Unac sequer seja analisado neste ano. Ou, se for, que seja desidratado. Uma ideia aventada é que todo compartilhamento de dados com o comando central do MP seja obrigatoriamente autorizado pelo juiz que autorizou a quebra de sigilos.
A ideia da Unac nasceu mediante o “anteprojeto de Resolução nº 119, que altera dispositivos da Resolução CSMPF nº 146, de 5.8.2013”. Não houve oposição a ela no começo. Ao contrário, há o sentimento de boa parte da categoria de que é preciso repetir o modelo de Ministérios Públicos estaduais de ter órgãos centralizados de apoio às investigações que são feitas na ponta.
Um substitutivo, porém, apresentado no final de maio, a empoderou. O novo texto, em seu artigo 6, descreve 13 finalidades para a unidade, dentre elas “instaurar procedimento de investigação criminal”, “acompanhar tramitação de inquérito policial”, “acompanhar e promover as técnicas especiais de investigação”, “promover medidas cautelares e assecuratórias”, “promover a ação penal, firmar acordos de colaboração premiada e de leniência”, “receber relatórios de inteligência oriundos de agências externas ou órgãos de inteligência ou contrainteligência internos”, “receber dos demais órgãos de execução do Ministério Público documentos ou peças, bem como solicitação de apoio para os atos de investigação criminal”. O artigo 17 diz que “as bases de dados atualmente custodiadas pelas forças-tarefas serão transferidas e administradas” pela Unac.
Ele coincidiu com as iniciativas da PGR para levantar os procedimentos das forças-tarefas, em especial as da Lava Jato de Curitiba, e acabou, segundo procuradores alinhados e independentes em relação a Aras, “ideologizando” o debate. Alie-se a isso o fato de um dos símbolos da operação, Sergio Moro, ter deixado o governo com graves acusações contra o presidente Jair Bolsonaro. Nesse sentido, qualquer debate que atinja a Lava Jato passa a ser visto como algo para atingir Moro, adversário do governo.
Assim, o que era para ser um debate sobre um modelo ideal de suporte técnico, operacional e de recursos humanos em grandes investigações, com compartilhamento de conhecimento e expertise, acabou sendo contaminado por outro debate: o do controle pelo comando central do que os órgãos regionais investigam e a afronta aos princípios do procurador natural e da independência funcional.
Outros movimentos que exporão as divergências internas no MPF podem ocorrer no Conselho nos próximos meses. Um deles, o debate sobre o Orçamento de 2021. Será o primeiro apresentado pela gestão Aras. É no Orçamento que são definidas a destinação e eventuais realocações de recursos, deixando claras as prioridades de uma gestão. A gestão Aras também tem investido na otimização de unidades país afora. Unidades estão sendo anexadas umas às outras e procuradores sendo removidos de um local para outro. Construções e reformas também estão sendo revistas. Tudo isso tem gerado insatisfação interna. Haverá também uma eleição para a vice-presidência do Conselho. O escolhido é o sucessor direto de Aras em caso de vacância. Em gestões passadas, interinos aproveitaram o tempo de vacância para impor suas prioridades, ainda que em curto espaço de tempo.
Outro debate é sobre a prorrogação das forças-tarefas, caso o debate sobre a Unac seja mesmo adiado. A força-tarefa de Curitiba, por exemplo, tem prazo de validade até setembro. A cúpula do MPF avalia redistribuir melhor os procuradores perante outras forças-tarefas pelo país, sob o argumento de que Curitiba está muito maior que nos outros locais. Há possibilidade de que, na ausência da criação da Unac, surja um debate sobre a regulamentação das forças-tarefas, para que elas funcionem com prazos e metas definidas.