Expedição Pantanal: área equivalente à Holanda já foi destruída no Pantanal
Trata-se da maior queimada já registrada no Pantanal
Na região onde o ciclo da vida é marcado pela seca e cheia, a sobrevivência depende do equilíbrio entre os elementos da natureza. Fogo, água, terra e ar sempre fizeram parte da rotina do Pantanal, mas recentemente estes elementos saíram de harmonia, e o menor bioma do Brasil sofre, desde meados de julho, com os intensos incêndios.
Dados mais atualizados da Lasa (Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais) da Universidade Federal do Rio de Janeiro – e que norteiam o trabalho de bombeiros na região pantaneira – mostram que, entre janeiro e outubro, mais de 27% do bioma já foi consumido pelo fogo.
No total, 4 milhões de hectares foram destruídos pelos incêndios, o que equivale à área total da Holanda.
Trata-se da maior queimada já registrada no Pantanal, que ocorre, segundo especialistas, na maior estiagem dos últimos anos.
“Um incêndio florestal depois de determinado tamanho, depois de determinada dimensão, você não consegue controlar nem combater. Você só protege o que tá no caminho dele”, explica o Paulo Barroso, secretário executivo do Comitê Estadual de Gestão do Fogo do Mato Grosso.
Um exemplo é a RPPN (Reserva Particular do Patrimônio Natural) Sesc Pantanal. A maior reserva privada do Brasil teve mais de 90% da área queimada, mesmo com a instituição contando com uma brigada preparada para controlar as chamas.
Para Cátia Nunes, ecóloga e uma das principais referências acadêmicas no estudo sobre áreas úmidas do mundo, ainda é cedo para se falar sobre as causas do incêndio.
Apesar das polícias Civil e Federal terem aberto investigações para apurar o ocorrido e já terem suspeitos, o descontrole generalizado no manejo da terra pode estar associado a tragédia.
“Já não sabemos mais quanto esse comportamento [incêndio] é de processo normal [reflexo do período seco] ou o quanto nós já interferimos no sistema da terra e isso já está ficando sem comando”, afirmou Nunes.
Uma das explicações para a severa estiagem deste ano pode estar a centenas de quilômetros do Pantanal: no Cerrado.
Foto: DOC. Filmes
O bioma vizinho, um dos mais castigados pelo desmatamento ao longo dos anos, é considerado a caixa d’água pantaneira, uma vez que é ali onde nascem os principais rios que formam a maior planície alagável do mundo.
“As águas que nascem aqui escorrem para o Pantanal, que devido sua baixa declividade, vê seus rios transbordarem. No entanto, o regime de chuvas já não é mais o mesmo”, disse Ibraim Fantin, professor da pós-graduação em recurso hídricos da Universidade Federal do Mato Grosso.
Em outubro a régua de Ladário, importante indicador de volume de água no rio Paraguai em Corumbá (MS), registrou o menor número nos últimos 50 anos. Sem chuva na cabeceira dos rios formadores do Paraguai (Cuiabá, Piquiri e São Lourenço), a tendência é o volume de águas baixar prejudicando o abastecimento de milhares de pessoas e castigando ainda mais o frágil bioma pantaneiro.
Fantin acredita ser necessário se debruçar diante do fenômeno para tentar encontrar soluções que mitiguem os dados causados pela seca e consequentemente as possíveis queimadas que ocorrem. A hipótese mais segura, de acordo com o pesquisador, pode estar no desequilíbrio climático.
“Os rios voadores, que é o fenômeno característico do bioma amazônico, podem estar em menor intensidade reflexo do desmatamento acelerado. O Pantanal é um bioma muito frágil e muito dependente do que acontece em volta”.
Alessandro Rodrigues é pantaneiro e vive a três décadas na região. Guarda-parque do Sesc Pantanal, a maior reserva particular do Brasil, ele está surpreso e preocupado com a seca.
“Nesses 33 anos de vida é a primeira vez que eu vejo um ano tão seco, com tanta fumaça, tanto fogo assim. Nunca tinha visto na vida algo parecido. O meu pai também é morador aqui e tem 58 anos no Pantanal e também nunca viu assim. Já vi seca, como uns anos atrás, mas isso é novidade”, lembrou Rodrigues.
Ele ainda completa: “No jogo entre o homem e o fogo, este ano, o homem está perdendo”.
(*Da DOC. Filmes, especial para a CNN)