Elcio Franco diz que Pfizer ‘não confiava no que estava oferecendo’ ao Brasil
Na avaliação do ex-número dois da Saúde, a farmacêutica "queria se isentar da responsabilidade sobre o efeito colateral grave"
O ex-secretário executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco, disse à Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia que a Pfizer não “confiava no que ela estava oferecendo” ao Brasil, referindo-se aos imunizantes contra a Covid-19 produzidos pela empresa farmacêutica dos Estados Unidos.
Ao responder um questionamento do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), o número dois da pasta durante a gestão de Eduardo Pazuello afirmou que o objetivo do ministério era obter uma vacina segura e eficaz, e disponibilizar o imunizante no menor período possível.
“Nos pareceu que ela queria se isentar da responsabilidade sobre o efeito colateral grave. Nem ela confiava no que ela estava oferecendo para a gente”, relatou Elcio Franco.
O coronel também ressaltou que as cláusulas do contrato apresentado pela farmacêutica eram “draconianas” e citou reportagens que apontam que a Pfizer teria feito exigências a países pobres que não foram solicitadas aos EUA.
Até março de 2021, o Ministério da Saúde recebeu um total de 44,1 milhões de doses de vacinas contra a Covid-19. O número, aponta projeção baseada nas ofertas feitas ao Brasil, poderia ser ter sido de 73,1 milhões caso os contratos do governo federal com o Instituto Butantan e com a Pfizer tivessem sido assinados sem atrasos.
A diferença — 27,2 milhões — seria suficiente para imunizar 8,5% da população brasileira acima de 18 anos. A projeção é da analista de Economia da CNN Raquel Landim.
A projeção começa nas ofertas iniciais dos laboratórios, que previam, entre dezembro e março, a entrega de 60 milhões de doses da Coronavac e de 4,5 milhões de doses da Pfizer. Já a AstraZeneca/Fiocruz, que tinha, acordo com o Brasil desde meados do ano passado, entregou 7,8 milhões de doses nesse período.
Com os atrasos, o Brasil acabou recebendo apenas 36,3 milhões de doses da Coronavac. Os imunizantes da Pfizer só começaram a chegar em abril.
Técnicos da CPI da Pandemia elencaram o número total de interações feitas entre a farmacêutica Pfizer e o governo federal no ano de 2020.
O levantamento, ao qual o analista da CNN Caio Junqueira teve acesso, mostra que, entre 17 de março – data do primeiro contato – e 10 de dezembro – quando foi fechado uma espécie de pré-acordo de compra de vacinas -, a farmacêutica fez 34 contatos com o governo federal que, por sua vez, interagiu com ela em 12 situações.
O primeiro contato da Pfizer com o governo federal, segundo a CPI, foi no dia 17 de março de 2020, em um e-mail enviado pela empresa ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no qual informa que a empresa estava buscando “soluções médicas para combate à Covid-19”. Não houve resposta.
Pouco mais de dois meses depois, no dia 20 de maio, a empresa enviou mais dois e-mails. Um ao então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, pedindo uma agenda e outra ao vice-presidente Hamilton Mourão também com o mesmo objetivo.
Esse e-mail a Pazuello foi respondido no dia seguinte, em 21 de maio. Nele, a secretaria-executiva do Ministério da Saúde agenda uma reunião com o secretário-executivo Elcio Franco para o dia 28.
O mês de agosto se mostra um mês-chave nessa relação. No dia 14 a Pfizer envia um e-mail ao ministério com a proposta formal de 70 milhões doses e pede resposta até o dia 29. No dia 17 manda documentos a Saúde e informa a proposta ao Ministério da Economia. No dia seguinte informa que conseguiria antecipar doses. Nos dias 19, 21 e 25 pede posições.
No dia 12 de setembro é enviada a carta, revelada pela CNN, do CEO mundial da Pfizer ao presidente Jair Bolsonaro. O pré-acordo seria fechado em dezembro.