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    ‘Ergueu-se contra mim uma narrativa falsa e hipócrita’, diz Araújo a Bolsonaro

    Ex-ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, escreveu uma carta ao presidente após pedir demissão

    Anna Gabriela Costa, da CNN, em São Paulo

    O ex-ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, divulgou em seu Twitter, na noite desta segunda-feira (29), uma carta direcionada ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), onde “coloca à disposição o cargo de Ministro das Relações Exteriores”. O conteúdo da carta revela a insatisfação de Araújo com “correntes adversas” e a afirmação de que sua atuação prejudicaria a obtenção de vacinas . Ernesto Araújo pediu demissão do cargo nesta segunda-feira. 

    “Ergueu-se contra mim uma narrativa falsa e hipócrita, a serviço de interesses escusos nacionaos e estrangeiros, segundo a qual minha atuação prejudicaria a obtenção de vacinas. Exibi todos os fatos que desmentem tais alegações, mas infelizmente, neste momento da vida nacional, a verdade não importa para as correntes que querem de volta o poder – esse poder que, durante as décadas que o exerceram, só trouxe ao Brasil atraso, corrupção e desgraça”, escreveu Araújo. 

    O ex-ministro disse ainda, em sua carta destinada ao presidente, que a atual situação tornou impossível seguir trabalhando pelos ideais que compartilham. 

    “Nesse choque – do qual não posso recuar sem renunciar aos princípios que com o senhor compartilho – surgiu nestes últimos dias uma situação que me torna impossível seguir trabalhando por nossos ideais na posição que neste momento ocupo”, afirmou. 

    Ernesto Araújo encerra a carta dizendo que “coloca à disposição de Vossa Excelência o cargo de Ministro das Relações Exteriores” e que “seguirá lutando pelo povo brasileiro até o fim de seus dias”.

    Ernesto Araújo, pediu demissão do cargo durante um encontro com o presidente Jair Bolsonaro nesta segunda-feira. Ele vinha sendo pressionado, principalmente por parlamentares, que o criticaram por falhas nas relações diplomáticas que teriam prejudicado a aquisição de vacinas contra a Covid-19.

    Nesta segunda, um grupo de senadores se preparava para apresentar um pedido de impeachment  de Ernesto Araújo.

    Em mensagem postada no Twitter, ele afirmou que a senadora Kátia Abreu (PP-TO), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, cobrou o apoio dele à tecnologia chinesa do 5G, indicando que este era o real interesse dos parlamentares, e não as vacinas.

    Em nota, a senadora Kátia Abreu reagiu. A parlamentar classificou o ministro como “a face de um marginal”, que viveria “à margem da boa diplomacia, à margem da verdade dos fatos, à margem do equilíbrio e à margem do respeito às instituições”.

    Pressão pela queda

    A demissão de Ernesto Araújo já unia diversos setores do Congresso e da sociedade civil. Nos dias em que antecederam a queda do ministro, deputados e senadores foram à público e às redes sociais para pedir a saída do chanceler.

    Os parlamentares criticavam falhar nas relações diplomáticas do Itamaraty sob Araújo, especialmente no que diz respeito a medidas contra a Covid-19, como a aquisição de vacinas. 

    Ainda nesta segunda-feira, alguns senadores já se preparavam para apresentar um pedido de impeachment de Ernesto Araújo. Houve também um movimento para que o Senado barrasse sabatidas e votações de embaixadores indicados pelo ministro. 

    Gafes e erros de Ernesto Araújo

    O agora ex-ministro da Relações Exteriores acumulou gafes, polêmicas e erros durante sua gestão a frente do Itamaraty. Em maio de 2020, por exemplo. Araújo publicou um texto em seu blog pessoal em que aparecem críticas a China em razão da pandemia.

    No artigo, o Araújo falava em “comunavírus” e em “jogo comunista-globalista de apropriação da pandemia para subverter completamente a democracia liberal e a economia de mercado.”

    Em outubro de 2020, o Brasil decidiu não apoiar uma proposta da Índia e da África do Sul na Organização Mundial do Comércio (OMC) que defendia a suspensão de patentes e de outros instrumentos de propriedade intelectual vinculadas ao combate e tratamento da Covid-19. A postura do Brasil contrariou também o histórico do país, tradicionalmente favorável a quebra de patentes farmacêuticas. 

    Sem o apoio, a proposta da Índia perdeu força, especialmente frente aos países desenvolvidos, e em janeiro de 2021, quando os indianos começaram a exportar vacinas contra a Covid-19 produzidas pelo Instituto Serum, o Brasil ficou de fora da lista de prioridades. 

    Na última quarta-feira (24), em audiência no Senado na qual Araújo falava sobre as dificuldades do Brasil em conseguir vacinas do exterior, o assessor da presidência para Assuntos Internacionais, Filipe Martins, fez um gesto que os senadores interpretaram como ofensivo, ligado a supremacistas brancos.

    Confira na íntegra a carta de demissão de Ernesto Araújo:

    No cargo de Ministro das Relações Exteriores para o qual o senhor me proporcionou a imensa honra de me designar, lutei desde o início pela liberdade e dignidade do Brasil e do povo brasileiro, pela soberania e grandeza em todos os aspectos. Procurei à frente de muitos e muitos colegas para os quais “diplomata” e “patriota” não são antônimos, colocar o Itamaraty a serviço do sonho de um novo Brasil. Nessa luta, deparei-me cada vez mais, ao longo do tempo, com correntes frontalmente adversas.

    Nesse choque – do qual não posso recuar sem renunciar aos princípios que com o senhor compartilho – surgiu nestes últimos dias uma situação que me torna impossível seguir trabalhando por nossos ideais na posição que neste momento ocupo. 

    Ergueu-se contra mim uma narrativa falsa e hipócrita, a serviço de interesses escusos nacionaos e estrangeiros, segundo a qual minha atuação prejudicaria a obtenção de vacinas. Exibi todos os fatos que desmentem tais alegações, mas infelizmente, neste momento da vida nacional, a verdade não importa para as correntes que querem de volta o poder – esse poder que, durante as décadas que o exerceram, só trouxe ao Brasil atraso, corrupção e desgraça. 

    A verdade liberta e a mentira escraviza. Hoje, a mentira é despudoradamente utilizada para um projeto materialista que visa escravizar o Brasil e os brasileiros, a escravizar o próprio ser humano e roubá-lo de sua dignidade material e, principalmente, espiritual. 

    Assim, em benefício do projeto de transformação nacional que o senhor encabeça, e em nome de minhas convicções profundas, de meu orgulho profissional e do amor que dedico ao Brasil e ao nosso povo – esse povo pelo qual me comprometo a seguir lutando até o fim dos meus dias – coloco à disposição de Vossa Excelência o cargo de Ministro das Relações Exteriores .

    Com todo meu respeito, admiração e afeto. 

    Ernesto Araújo 

     

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