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    Enem: inscrições de pretos, pardos e indígenas não retomam patamares pré-pandemia

    Falta de incentivo e vulnerabilidade social são obstáculos para a igualdade étnica nas universidades, de acordo com especialistas

    Guilherme Gamada CNN , São Paulo

    De acordo com os dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), 3.933.992 de pessoas se inscreveram no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) neste ano de 2023. A prova é a principal porta de entrada para o ensino superior no Brasil.

    Desse total, 2.280.932 são pretas, pardas e indígenas, o que corresponde a cerca de 57% dos inscritos.

    A presença de pessoas que se autodeclaram pretas, pardas e indígenas inscritas para o exame apresenta queda desde 2020, quando representavam cerca de 61% das inscrições, com 3.620.767 de inscritos dessas etnias. Esse foi o máximo já atingido desde 2009 – naquele ano, 1.950.839 de inscritos não informaram cor e etnia.

    Após 2020, esses grupos não ultrapassaram 56% do total de inscritos. Em 2021, registrou-se a parcela mais baixa desde 2012: 54% do total.

    “Nossa geração está cada vez mais desesperançosa com a possibilidade de entrar na universidade, porque a necessidade da sobrevivência tomou espaço dos nossos sonhos durante o último período”, afirma Jade Beatriz, presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes).

    Também em 2021, um levantamento da Secretaria de Modalidades Especializadas de Educação (Semesp) indicou queda de 77,4% no número de inscritos com renda familiar de até três salários mínimos.

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    Os dados apontaram uma redução de 20,8% entre os alunos com “inscrição gratuita”, enquanto houve um crescimento de 39,2% das inscrições de alunos que pagaram a taxa de inscrição no Enem.

    Em 2022, a porcentagem de inscrições de pessoas pretas foi a menor em mais de uma década, representando 11,75% — valor superior apenas a 2010, que registrou 11,72%. Já em 2023, foram 12,95%, ainda abaixo dos 13,34% de 2020, pré-pandemia.

    Esses números podem acarretar menor diversidade étnica no ensino superior. Jade Beatriz destaca que, com menos inscritos desses grupos, as chances de haver mais pessoas pretas, pardas e indígenas nas universidades é bem menor.

    “É uma grande perda não só para o povo brasileiro, mas também para as universidades e o desenvolvimento nacional”, avalia.

    Daniel Cara, professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), destaca que, desde 2020, observa-se uma redução no preenchimento de vagas destinadas às cotas.

    “Esse fenômeno precisa ser revertido, caso contrário o Brasil permanecerá como uma sociedade elitista e nada democrática”, pondera.

    Inscrições por estados

    Neste ano, a Bahia lidera com maior número de inscrições pretas, pardas e indígenas, com 249.991; seguido por São Paulo (223.953); Minas Gerais (189.279); Pará (174.864); e Ceará (165.295).

    Quando se fala apenas em inscrições de pessoas indígenas, o Amazonas é o estado com maior número, com 3.633 inscrições. Em segundo lugar está Pernambuco (3.125); seguido por Bahia (2.278); São Paulo (1.806); e Ceará (1.288).

    As inscrições para o Enem foram encerradas no dia 16 de junho, e a prova será aplicada nos dias 5 e 12 de novembro.

    Pandemia e vulnerabilidade social

    Para Jade Beatriz, o ensino à distância escancarou os problemas de falta de acesso à tecnologia. Além disso, também evidenciou como outros aspectos sociais dos estudantes, como situação de vulnerabilidade e fome, afetam os alunos.

    Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2019, 141 mil domicílios brasileiros não têm acesso à energia elétrica, 100 milhões de pessoas não têm rede de esgoto e 35 milhões não têm acesso à água potável.

    “É impossível estudar em casa quando existem esses obstáculos no meio”, completa a presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes).

    Andressa Pellanda, coordenadora-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, afirma que esse cenário de aprofundamento das desigualdades sociais foi demonstrado no balanço do 9° ano do Plano Nacional de Educação (Lei 13005/2014), principal índice para medir avanço do aprendizado no país.

    “Mais da metade do plano apresenta retrocessos em seus dados, especialmente para a população negra, pobre, e das regiões Norte e Nordeste”.

    Essa reportagem teve apoio de Rodrigo Pelegrini Ratier, professor do Departamento de Jornalismo e Editoração (CJE) na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, no curso de Projetos em Jornalismo Digital.

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