Meus primeiros R$ 12, a carteira com velcro e o frango
Há 29 anos, moeda do real entrava em circulação e abria caminho para o fim da hiperinflação
Era julho de 1994 e eu tinha 14 anos. A seleção brasileira se preparava para as oitavas de final da Copa do Mundo nos Estados Unidos, mas confesso que não sou muito fã de futebol.
Naqueles dias, o que prendia a minha atenção era o que estava prestes a acontecer na minha carteira: a troca do dinheiro.
Pensar que todo o dinheiro existente no Brasil — nota por nota — ia ser trocado no bolso de milhões de pessoas era algo enigmático. A TV só falava nisso, o jornal que chegava todas as manhãs em casa também — e há vários dias.
Na cabeça de um adolescente, era a materialização do mundo do Tio Patinhas. É como se a abertura do desenho animado “Ducktales” estivesse acontecendo, ao vivo, aqui no Brasil.
Nela, o pato mais rico do mundo nada em milhões de moedas em um cofre gigantesco.
No mundo colorido e fluorescente dos anos 1990, a moda eram as carteiras com velcro. Hoje é mais que cringe, mas eu também tinha uma.
A minha era verde e, dentro dela, tinha algumas notas cheias de zero do antigo cruzeiro real no começo de julho de 1994.
E lembro perfeitamente quando entreguei as cédulas ao meu pai com uma missão: trocar pelo dinheiro novo.
E, no fim daquele dia, meu pai voltou com a incrível soma de R$ 12. Certamente, deve ter arredondado para cima com alguns — ou muitos — cruzeiros reais dele, e, nessa, acabei ganhando algum trocado na troca da moeda.
Era um dinheirão. Lembro que minha primeira reação era ver que aquelas poucas notas novas e coloridas eram suficientes para ir três vezes no McDonald’s.
Eu estava rico.
Não lembro como, mas gastei os R$ 12 nas semanas seguintes. Os anos passaram, entrei na faculdade e há 23 anos sou jornalista econômico.
Construí todo o meu entendimento sobre como funciona a economia tendo apenas uma referência no bolso: o real.
Desde 1994, a moeda permitiu avanços fundamentais na sociedade brasileira. E o mais importante deles é o que aconteceu com os pobres.
O controle da inflação deu dignidade financeira às pessoas que estão na base da pirâmide social.
Sem ser queimada pelo dragão da inflação, a moeda estável ajudou a oferecer um direito básico: comer e comer melhor.
Foi assim que o frango chegou à mesa dos brasileiros. Depois, veio o iogurte, o biscoito recheado, a carne bovina…
Esse controle da inflação foi o símbolo de uma economia mais organizada. Essa organização foi essencial para que o Brasil pudesse dar os passos seguintes no esforço de oferecer dignidade e oportunidade econômica aos mais pobres.
Foi a política econômica responsável, coerente e previsível que, no fim das contas, criou o pano de fundo para que milhões pudessem comprar a primeira geladeira, viajar de avião, trocar o jegue pela moto, conquistar o primeiro diploma universitário da família e a casa própria.