Créditos de Carbono na Lei de Concessões Florestais: solução ou novos desafios?
Publicada há poucos dias, a Lei 14.590/23 altera o regramento das concessões florestais permitindo, dentre outras alterações, que os editais de concessão e seus respectivos contratos prevejam a possibilidade de geração e comercialização de créditos de carbono pelo concessionário, salvo se os créditos forem gerados em áreas ocupadas por comunidades locais.
Apesar da boa intenção, a solução legislativa é insuficiente. Ao tratar da titularidade dos créditos como transferível ao concessionário, exceto para a área ocupada por comunidades locais, a norma dá a entender que a titularidade dos créditos em áreas ocupadas ou utilizadas por comunidades locais não é transferível e, portanto, permanece com o poder concedente.
A solução ignora duas realidades em projetos de geração de créditos de carbono:
A primeira é a de que os projetos de geração de créditos de carbono podem e devem incluir e beneficiar comunidades locais. A exclusão das áreas ocupadas por comunidades locais traz dúvidas quanto a possibilidade de o concessionário atuar em conjunto com tais comunidades, nas áreas ocupadas por elas.
Há, em projetos de geração de créditos de carbono do mercado voluntário, regras de salvaguarda que visam proteger comunidades locais e a biodiversidade que integram projetos de geração de créditos de carbono. Ademais, há certificações específicas, como a CBS, que servem como atributo dos créditos de carbono, aumentando seu valor de mercado.
Ademais, a nova lei cria uma contradição sobre o tema quando, de um lado, exclui as áreas ocupadas pelas comunidades da possibilidade de cessão da titularidade de créditos de carbono ao concessionário (art. 16, §2º) e, de outro lado, obriga a repartição da receita decorrente da comercialização de créditos com a comunidade (art. 30, IX).
A segunda realidade ignorada é que comunidades locais que ocupam legalmente o território deveriam poder, legitimamente, gerar créditos de carbono decorrentes de suas ações. A redação da norma põe em cheque essa possibilidade e não resolve o problema da titularidade do crédito gerado na área da concessão ocupada por comunidades tradicionais. Só o poder concedente poderá gerar e comercializar créditos a partir de tais áreas?
Enquanto o proprietário do imóvel tem o dever de preservar sua terra e aproveitar dos frutos por ela gerados, é inegável que a geração de créditos de carbono impõe uma série de ações e custos relativos à sua geração e ao seu reconhecimento e certificação. E quanto maior a área coberta, maior o ganho de escala em tais projetos.
A exclusão de áreas das comunidades tradicionais da possibilidade de transferência de titularidade, se não resolvida no regulamento e nos editais, poderá, na prática, excluir tais áreas e as próprias comunidades do mercado.
Pela redação da lei, tais definições ficarão a cargo do regulamento e dos editais de concessão.
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