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    Marco fiscal aprovado na Câmara mantém punições por descumprimento de meta

    Projeto da lei que deve controlar o crescimento dos gastos e da dívida pública teve aprovação concluída nesta quarta-feira na Câmara dos Deputados e segue agora para o Senado

    Juliana Eliasda CNN , em São Paulo

    Com a aprovação concluída nesta quarta-feira (24), e com folgada margem de votos, na Câmara dos Deputados, o projeto do novo marco fiscal (PLP 93/2023) segue agora para apreciação no Senado.

    A versão final aprovada manteve a essência do que foi proposto pelo governo: uma regra que casa metas de resultado fiscal com um novo teto de gasto.

    Por esse novo teto, as despesas anuais deverão ser reajustadas pela inflação do ano anterior, como era o teto de gastos original, mais um aumento real que deverá ser de, no mínimo, 0,6% e, no máximo, 2,5%.

    Dentro dessa banda, a expansão não poderá ser maior do que 70% do crescimento das receitas no ano anterior, sempre consideradas as variações já acima da inflação.

    Com isso, o projeto garante que, no geral, os gastos cresçam sempre menos do que a receita.

    Mudança polêmica e confusa

    A exceção será 2024, que, por ser o primeiro ano a começar com a lei em vigor, ganhou regras especiais depois que passou pela Câmara: na versão aprovada, o relator do texto, o deputado Cláudio Cajado (PP-BA), adicionou um dispositivo que permite que o gasto calculado no orçamento para o ano que vem poderá ser revisto no primeiro semestre e, se necessário, aumentado.

    Esta exceção na largada da lei tem sido o principal ponto de preocupação e crítica de economistas, não só porque ela dá margem para uma folga extra para os gastos que servirão de base para os anos seguintes, como também porque a matemática proposta para esse reajuste do primeiro ano ficou muito complexa.

    Por outro lado, o texto aprovado pelos deputados ficou também mais duro que a proposta original do governo.

    Dependência de mais arrecadação

    A vinculação dos gastos à receita, junto às metas de resultado fiscal ambiciosas já traçadas para os próximos anos pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é o que tem rendido a certeza de especialistas de que o governo só vai conseguir fechar as contas se tiver um aumento considerável na arrecadação.

    As estimativas de alguns é de que a Fazenda precisará encontrar mais de R$ 100 bilhões em receitas adicionais para conseguir cumprir a promessa de zerar o déficit primário em 2024.

    Gatilhos e punições

    Entre as principais mudanças que o projeto ganhou depois de passar pela Câmara dos Deputados está o endurecimento das punições previstas caso o governo descumpra as metas de resultado primário anuais.

    A versão original havia reduzido as exigências e preocupou economistas, que tinham considerado as regras muito brandas para garantir que os presidentes se comprometessem de fato em respeitar os limites de despesa e endividamento esperados.

    O relator do marco fiscal na Câmara, o deputado Claudio Cajado (PP-BA), já havia calibrado isso em sua primeira leva de alterações sobre o projeto do governo, apresentada na semana passada, ao criar gatilhos automáticos de contenção de alguns tipos de despesas nos anos em que a meta não seja cumprida.

    Esses gatilhos foram mantidos na versão final aprovada pelos deputados.

    O que não pode

    Pela proposta aprovada, o governo fica automaticamente proibido de fazer determinadas expansões de despesa, como criar cargos, aumentar programas sociais ou conceder novas isenções tributárias, caso descumpra as metas de resultado primário em um ano.

    Caso não cumpra a meta novamente em um segundo ano consecutivo a lista de travas se amplia, proibindo também reajustes para servidores e realização de concursos para novas contratações.

    O que fica proibido após um ano de descumprimento de meta:

    1. Criação de cargos, caso implique em aumento de despesas;
    2. Reestruturação de carreiras que implique aumento de despesas (como criar novos cargos ou benefícios em carreiras como as de militares, do Judiciário, profissionais de saúde e outras áreas públicas);
    3. Criação ou aumento de auxílios, vantagens e benefícios;
    4. Criação ou expansão de programas e linhas de financiamento (como o Minha Casa, Minha Vida, o Programa de Aceleração do Crescimento ou as linhas de crédito direcionadas da Caixa e do BNDES);
    5. Renegociação ou refinanciamento de dívidas que impliquem em ampliação de subsídios;
    6. Concessão ou ampliação de incentivos tributários (como desonerações a combustíveis, à cesta básica ou a algum setor empresarial);
    7. Criação de despesas obrigatórias (alguns exemplos são as aposentadorias, pensões, salários dos servidores, abono salarial e seguro-desemprego);
    8. Reajustar alguma despesa obrigatória acima da inflação — à exceção do salário mínimo.

    O que fica proibido após o 2º ano seguido de descumprimento da meta:

    1. Todos os anteriores seguem vedados da mesma maneira;
    2. Dar aumentos ou reajustar os salários dos servidores;
    3. Realização de concursos públicos;
    4. Admissão ou contratação de pessoal (à exceção de cargos vagos).

    Todas as vedações valerão por um ano ou até que os resultados das contas do governo voltem para os limites da meta.

    Em quaisquer dos casos, o governo poderá, a qualquer momento, enviar um projeto de lei complementar ao Congresso Nacional pedindo “permissão” para realizar as ações que ficaram bloqueadas — desde que mostre contrapartidas, como corte de gastos ou aumento de algum imposto, ou demonstre como conseguirá arcar com os custos adicionais sem deixar de cumprir a meta novamente.

    Salário mínimo pode ser reajustado sempre

    Ao criar proibições automáticas para diversos tipos de aumento no caso de descumprimento das metas, o próprio texto ressalva que os aumentos ao salário mínimo — seja pela inflação ou acima dela — ficam fora dos bloqueios e poderão continuar sendo concedidos mesmo com os gatilhos de punição acionados.

    O aumento anual do salário mínimo ao menos pela inflação, de maneira a preservar o seu poder de compra, é determinado pela Constituição e é obrigatório.

    Promessa de campanha, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já encaminhou, no começo de maio, seu projeto de lei retomando a política de valorização do piso salarial nacional, pelo qual o reajuste volta a ter também ganhos reais atrelados ao crescimento da economia.

    Bloqueio de verba obrigatório, mas com limites

    A versão da Câmara dos Deputados também recolocou e aprovou no marco fiscal a obrigatoriedade de bloqueio de verbas do Orçamento ao longo do ano caso as contas públicas estejam caminhando para ficar fora da meta.

    Elas retornam, entretanto, de maneira menos rígida do que como é feito atualmente.

    Na versão inicial apresentada pelo governo, os contingenciamentos tinham se tornado completamente opcionais. De acordo com o Ministério da Fazenda, a intenção era estimular a busca de soluções por outros mecanismos antes de fazer cortes compulsórios que podem prejudicar o andamento de programas.

    Os contingenciamentos são um mecanismo criado pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), em 2000.

    Eles são obrigatórios e devem ser feitos pelo governo regularmente, ao longo do ano, caso seja necessário ajustar a trajetória das contas públicas às metas de gasto e arrecadação projetadas no começo do ano pelo Orçamento aprovado.

    Na configuração atual, não há limites para esses bloqueios.

    Pela nova versão do marco fiscal, eles continuam obrigatórios, mas ficam limitados a um piso de 75% da verba originalmente prevista.

    O limite vale para as despesas discricionárias — aquelas que não são obrigatórias (como são aposentadorias, benefícios e salários, por exemplo) e nas quais o governo consegue mexer.

    O que é a meta que deve ser cumprida

    Além dos limites do teto de gasto — princípio mantido na nova proposta, mas com mais folga que o original — o novo regime fiscal resgata o sistema de metas de resultado primário, criado também pela LRF, em 2000, que era o principal mecanismo de controle das contas públicas até a criação do teto de gastos em 2017.

    O resultado primário é o saldo entre o que o governo gasta e o que arrecada, descontados os gastos com juros.

    Essas metas são definidas anualmente pelo governo, no projeto do Orçamento, podendo ser tanto negativas (déficits) quando positivas (superávits).

    A inovação da proposta atual foi incluir bandas de tolerância para essas metas, que serão de 0,25 ponto para mais ou para menos.

    Para 2023, por exemplo, a meta de resultado primário proposta por Haddad é de um déficit de -0,50% do PIB, o que significa que o governo deverá concluir o ano com um déficit entre -0,75% e -0,25% do PIB.

    Todas as punições previstas serão ativadas sempre que o governo concluir o ano com um saldo pior do que o limite mínimo previsto por essas bandas.

    Caso o governo entregue um resultado pior do que o limite mínimo tolerado para o ano (-0,75% em 2023, por exemplo), o limite para o crescimento dos gastos do ano seguinte cai de 70% do aumento das receitas para 50%.

    Ou seja, se o aumento das receitas, no ano anterior, foi de 3%, o aumento dos gastos, em vez de 70% disso — 2,1% —, deverá ser 50% disso, ou 1,5%. Estes aumentos já consideram os reajustes feitos além da inflação, que será sempre garantida.

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