Por que Alexandre de Moraes liga fraude no cartão de vacina de Bolsonaro às milícias digitais
Pedido para que caso da fraude no cartão de vacinação fosse incluído no âmbito do inquérito das milícias partiu de Fabio Shor, delegado da Polícia Federal
A operação que terminou com a busca e apreensão do telefone celular de Jair Bolsonaro (PL) e a prisão de pessoas ligadas ao ex-presidente por fraudes no cartão de vacinação dele e da filha está relacionada ao inquérito em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF) que investiga a atuação de “milícias digitais”.
O STF analisa investigação de que as chamadas “milícias digitais” teriam organizado os protestos no Dia da Independência em 2021 e a depredação da sede dos Três Poderes, em Brasília, em 8 de janeiro.
O pedido para que o caso da fraude no cartão de vacinação fosse incluído no âmbito do inquérito das milícias partiu de Fabio Shor, delegado da Polícia Federal.
O relatório levou ao ministro Alexandre de Moraes, do STF, a informação de que pode haver ligação dos suspeitos alvos das buscas e prisões da última semana com grupos que lideraram manifestações a favor do governo em 7 de setembro de 2021.
Outros argumentos
A PF aponta que o deputado federal Gutemberg Reis (MDB-RJ), alvo de busca e apreensão na quarta-feira, também teria se beneficiado do esquema de falsificação dos dados. Isso, segundo a Polícia Federal, possibilitou a “materialização no mundo real” dos objetivos do grupo.
No relatório da PF, a investigação aponta que “a estrutura criminosa se consolidou no tempo, passando a ter a adesão de outras pessoas, atuando de forma estável e permanente para inserir dados falsos de vacinação contra a Covid-19 em benefício do então Presidente da República”.
E, o fato que é considerado “principal”, é a descoberta de tratativas para a execução de um golpe de Estado, com um conteúdo incriminatório encontrado no celular e nos arquivos em nuvem, envolvendo o militar da reserva Ailton Gonçalves Moraes Barros, ex-candidato a deputado estadual pelo PL do Rio, que foi preso na quarta-feira (3).
“Seja nas redes sociais, seja na realização de inserções de dados falsos de vacinação contra a Covid-19, ou no planejamento de um golpe de Estado, o elemento que une seus integrantes está sempre presente, qual seja, a atuação no sentido de proteger e garantir a permanência no poder das pessoas que representam a ideologia professada”, afirma a PF.
O delegado diz ainda, no pedido de busca e apreensão, que a “milícia digital” estaria ligada às manifestações nas portas de quartéis após a vitória de Lula e a destruição dos prédios dos Três Poderes, em 8 de janeiro, que também é investigada por Moraes.
O pedido faz sentido?
No CNN Arena, a comentarista Janaína Paschoal disse que não. Ela considera que não há ligação entre os dois casos, afirmando que “são situações completamente distintas”.
Já o José Mário Wanderley Gomes, doutor em Ciência Política e professor na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), explica que é possível correlacionar as duas investigações.
Quando se autoriza a investigação por um delito — mesmo um delito menor, como a falsificação de certificados — o produto dessa investigação pode ser utilizado em outras investigações paralelas envolvendo o mesmo grupo de pessoas, diz Gomes.
“Por exemplo, o conteúdo de um celular apreendido na Operação Venire pode servir posteriormente às investigações do inquérito sobre a incitação aos atos antidemocráticos. É permitido na legislação processual penal e bastante comum haver compartilhamento de informações entre inquéritos, principalmente se conduzidos pelo mesmo relator”, afirma.
O que é o inquérito das milícias digitais?
Foi aberto por Alexandre de Moraes em 2021, após o arquivamento, a pedido da Procuradoria-Geral da República, do inquérito dos “atos antidemocráticos”. Tem sido usado para investigar diversos fatos relacionados a um grupo ligado ao ex-presidente que promoveria, nas redes sociais, “ataques” às instituições.
O que Moraes decidiu?
Na decisão dele, o envolvimento de Bolsonaro estaria no “posicionamento público do político contra a vacinação e da investigação em curso na CPI da Pandemia e na Suprema Corte”.
Assim, seria “plausível e lógica” a linha investigativa que apura a possibilidade do ex-presidente, de maneira velada, “ter buscado vantagens próprias e para terceiros por meio da inserção de dados falsos nos sistemas do SUS, visando à efetiva imunização, especialmente considerado o fato de não ter conseguido a reeleição nas Eleições Gerais de 2022”.