Prime Time

seg - sex

Apresentação

Ao vivo

A seguir

    Argentina Flybondi planeja voar mais pelo Brasil, mas sem gratuidade para despachar malas

    Em entrevista à CNN, CEO da companhia argentina contou sobre novas rotas planejadas, como a empresa sobreviveu à pandemia e como batalha por preços baixos em meio aos altos custos da região

    Juliana Eliasda CNN , em São Paulo

    Ser um negócio nascente já é um desafio. Ser um negócio nascendo, no momento em que uma pandemia sem precedentes atinge a economia global, deixa o desafio bem mais difícil.

    Mas ser um negócio nascente, no meio de uma pandemia e no setor de aviação – um dos mais atingido pela quase total paralisia do mundo causada pelo coronavírus em 2020 – torna a tarefa de sobreviver praticamente impossível.

    Era essa a situação da argentina Flybondi. A companhia aérea de baixo custo tinha acabado de completar seu segundo ano de vida quando a Argentina, ao lado de uma infinidade de outros países, fechou completamente a circulação em março de 2020.

    “Não existia no mundo nenhuma indústria que pudesse ter um plano para sobreviver pelos nove meses que durou o lockdown na Argentina. Deixamos de voar em 22 de março de 2020 e só voltamos em 12 de dezembro”, contou o presidente da companhia, Mauricio Sana, em entrevista à CNN.

    Com voos que, por valores a partir de R$ 1.000 a ida e a volta, ligam Buenos Aires a três cidades brasileiras – Rio de Janeiro, São Paulo e Florianópolis -, a Flybondi tem no Brasil seu segundo maior mercado fora da Argentina. E quer seguir expandindo.

    Paraguai e Uruguai são outros destinos que a empresa atende além das rotas domésticas.

    Em conversa com a CNN, Sana falou sobre os novos voos que a companhia planeja para o Brasil e como isso pode mudar caso o país volte a obrigar o despacho gratuito de bagagem.

    Também deu detalhes de como sobreviveram à turbulência sem precedentes da pandemia e contou como fazem para ser uma “low cost” e batalhar por preços mais baixos a despeito da explosão de custos da pandemia, dos altos impostos da região e da pouca integração entre os países da América do Sul.

    Novos voos no Brasil e mala obrigatória

    “No Brasil, temos uma lista de ao menos seis cidades que estamos analisando”, diz Sana sobre os planos de novos voos para cá.

    Belo Horizonte e Porto Alegre, além de rotas diretas daqui para Bariloche, são alguns dos projetos planejados pela Flybondi, se tudo der certo, ainda até o fim deste ano. Atualmente, todas as linhas do Brasil vão para Buenos Aires.

    A expansão, porém, depende de uma coisa: o Brasil não tornar obrigatório o despacho gratuito de bagagem de novo. Isto, afirma Sana, necessariamente puxa seus preços para cima.

    “Se o Congresso aprovar a obrigatoriedade, passará a haver um excesso na minha tarifa além do que eu tinha planejado. Muda a nossa análise”, diz.

    Se, mesmo que a exigência volte, percebermos que a ocupação dos nossos voos segue alta, seguiremos com os planos do mesmo jeito. Se a demanda cair, aí vamos ter que fazer outras contas: vale mais a pena um voo a mais para o Rio ou um voo novo para Lima ou para a Bolívia?

    Mauricio Sana, CEO da Flybondi

    Hoje, a Flybondi opera diariamente três voos para o Rio, de dois a três para Florianópolis e um para São Paulo.

    A volta da mala inclusa na passagem chegou a ser aprovada pelo Congresso no ano passado, depois vetada pelo ex-presidente Bolsonaro e, desde então, voltou para o Congresso e precisa ser votada de novo.

    Até lá, as companhias aéreas no Brasil continuam liberadas para cobrar separadamente as bagagens levadas por seus passageiros além da mala de mão.

    Modelo “a la carte”

    A lógica, explica o CEO da Flybondi, é que, a partir do momento em que o despacho de uma mala de até 23 quilos se torna obrigatório, as companhias aéreas passam a ter que embuti-lo no preço da passagem. “Pesa e gasta mais combustível”, diz.

    Sana: negociação com 250 fornecedores e ofertas relâmpago ajudaram a sobreviver à pandemia / Divulgação

    A exigência atinge diretamente o modelo definido como “a la carte” por ele e que está na essência das companhias de baixo custo, também conhecidas como low cost: cobrar por tudo que for possível a parte.

    Na Flybondi, como em outras low costs do mundo, a tarifa base inclui essencialmente o embarque e a mala de mão. Bagagem, escolha dos assentos e a possibilidade de passar pelo check-in sem fila são opcionais cobrados por fora.

    Os lanches também não estão inclusos e são vendidos a bordo.

    “Quem vier a Buenos Aires só para um fim de semana provavelmente precisará de uma mochila de seis quilos e a passagem, nada mais”, diz Sana.

    “No nosso avião, você compra uma água se quiser, se não quer água, compra um café. Não cobro na passagem um serviço de bordo que te obriga a tomar o café com o bolinho que tem. Se você não gosta de bolinho, vai pagar do mesmo jeito.”

    Combustível pelo dobro do preço

    Fazer mais voos com os mesmos aviões e lutar por manter a ocupação sempre alta são outras estratégias comuns que fazem fechar a conta de uma low cost.

    Para a Flybondi, foi também o que ajudou a sobreviver a outro problema da pandemia sem precisar subir demais o valor das tarifas: a explosão dos preços dos combustíveis no mundo.

    Eles são o principal custo de qualquer companhia aérea – cerca de 30% a 40% para a Flybondi – e mais que dobraram de preço a partir de 2021.

    De acordo com Sana, a Flybondi passou pela pressão de custo fazendo “alguns aumentos não tão exagerados” em suas tarifas, o que permitiu “pagar os custos e ainda manter [a empresa] nesse segmento” das companhias aéreas baratas.

    Ser low cost é aproveitar ao máximo os recursos que eu tenho.

    Mauricio Sana

     

    “O combustível ou o arrendamento dos aviões não são mais baratos para mim porque eu sou uma low cost, então eu tenho que ser eficiente. Em vez de voar com 100 passageiros, queremos voar com 180. Um avião nosso voa de seis a sete vezes por dia, enquanto o de uma companhia tradicional provavelmente voa quatro, e está tudo bem.”

    Longe do padrão europeu

    Mesmo com todos os esforços, ainda é difícil achar, dentro ou fora da Flybondi, no Brasil ou na Argentina, voos tão baratos quanto os vendidos pelas companhias aéreas de baixo custo da Europa, região onde o modelo se consagrou com empresas como a irlandesa Ryanair, a britânica EasyJet ou a espanhola Vueling.

    Enquanto as viagens da Flybondi, e também das concorrentes na região, partem de pelo menos R$ 1.000 para as rotas de duas a três horas que fazem entre Buenos Aires e as cidades brasileiras, na Europa é possível achar passagens para distâncias semelhantes a partir dos R$ 270, ida e volta.

    É o caso de um voo de duas horas entre Londres e Barcelona feito pela Ryanair para maio. Os preços foram pesquisados pela CNN em março.

    De acordo com Maurício Sana, a enorme diferença passa pelos altos impostos cobrados dos voos internacionais aqui na região e pela já bastante consolidada integração entre as fronteiras europeias e que ainda está longe de acontecer na América do Sul.

    “Uma passagem de Buenos Aires para o Rio custa mais que o dobro do que uma para Bariloche, sendo distâncias comparáveis”, conta, “mas metade do valor são impostos, por ser um voo internacional”.

    Os impostos sobre voos internacionais na América do Sul chegam a 120% do valor da passagem, de acordo com o executivo – e não é um problema de um ou outro país.

    “Todos os governos tinham que sentar e discutir as condições, assim como fazem com os acordos econômicos”, diz ele.

    Tomara que algum dia seja assim, mas não acontece na América do Sul a mesma coisa que na Europa. Lá, além das distâncias muito menores, todo o sistema é articulado, e você passa três fronteiras em duas horas como se fosse um voo doméstico.

    Mauricio Sana

    4 aviões devolvidos e 1 parado

    Sobreviver ao choque da pandemia, no começo de 2020, quando a companhia, que fez seu voo inaugural em 28 de janeiro de 2018, mal tinha completado o segundo ano de vida, exigiu da Flybondi um malabarismo impensável.

    A primeira coisa, ainda em março, foi convencer os empregados de uma redução nos salários. A segunda, devolver cinco dos quatro aviões que já tinha, alugados sob contratos de seis anos que não estavam nem no meio ainda.

    Ficamos com um avião porque era a única maneira de, legalmente, continuar sendo uma companhia aérea. Em abril não voamos e as vendas foram quase zero. Nunca chegaram a zero, mas quase.

    Mauricio Sana

    A luta pela sobrevivência também incluiu renegociar as dívidas e compras já encomendas de coisas que não tinham ideia de quando iam precisar novamente – de combustível a batatinhas, refrigerantes e uniformes.

    “Tínhamos uniformes de inverno para receber, mas nem sabíamos se íamos poder voar no inverno”, conta o CEO.

    “Negociamos com mais de 250 fornecedores: ‘sabe aquela dívida que eu ia te pagar em março? Não vou pagar. Me dá tempo até que eu possa voar de novo’. Quando? Não tínhamos ideia.”

    O retorno

    Promoções relâmpago, deixando os passageiros comprarem viagens sem data marcada foi o que ajudou a gerar algum caixa enquanto o esforço de contenção dos gastos fixos impediu dívidas ainda maiores do outro lado.

    Uma indústria que despencou toda de uma vez também ajudou na tarefa.

    Todas as companhias aéreas do mundo devolveram aviões. O resultado foi que os arrendamentos baixaram de preço, então as quatro aeronaves que se foram caras, voltaram depois mais baratas.

    Mauricio Sana

    A Flybondi voltou a voar com seu único avião, carregado de passageiros, em dezembro de 2020 – a companhia mantém a ocupação média dos assentos em 90% desde então.

    Em março de 2021 já estava com três aviões; em agosto, com quatro e, em 2022, voltou aos cinco com que tudo começou.

    Foi em julho de 2021 que a empresa conseguiu tapar o buraco financeiro aberto pela pandemia – “pagamos todas as dívidas negociadas com aqueles mais de 250 fornecedores”, diz Sana.

    Em setembro, retomou o mesmo volume de passageiros que estava carregando ao fim de 2019, logo antes de a pandemia mudar tudo, e, também em 2021, conseguiu – pela primeira vez, no quarto ano de vida – fechar o ano no lucro.

    Hoje, a Flybondi está com 12 aeronaves – “11 delas com melhores custos do que tínhamos em 2020”, de acordo com o executivo -, e já passou dos 300 mil passageiros transportados por mês, o dobro de 2019.

    Em 2022, a companhia carregou 2,3 milhões de pessoas, número que é o quadruplo de 2021 e quase o dobro de 2019. Em 2023, Sana acredita que será possível dobrar esse número mais uma vez, e chegar aos 5,5 milhões de passageiros.

    É, de toda maneira, um retrato bastante diferente de onde a companhia se imaginou estar em cinco anos quando abriu as portas, cinco anos atrás.

    O plano era chegar ao quinto ano com algo como 30 aviões, mas não dá nem para comparar. Os planos mudaram completamente.

    Mauricio Sana

    Tópicos