Congresso articula ofensiva contra agências reguladoras
Emenda apresentada à MP 1.154, medida provisória que redesenha a estrutura da Esplanada dos Ministérios, altera as leis de criação de 11 agências e diminui o atual escopo das atividades exercidas pelos órgãos reguladores
A Câmara dos Deputados se articula para mexer, nas primeiras semanas de trabalho legislativo, em um tema considerado sensível para investidores privados: o poder e a autonomia das agências reguladoras.
Uma emenda apresentada à MP 1.154, medida provisória que redesenha a estrutura da Esplanada dos Ministérios, altera as leis de criação de 11 agências e diminui o atual escopo das atividades exercidas pelos órgãos reguladores.
Se vingar, a mudança desidrata o poder normativo das agências e concentra decisões regulatórias em novos “conselhos”, ligados aos ministérios setoriais. Hoje as agências têm diretores com mandato fixo e, pelo menos em tese, autonomia decisória.
Já esses conselhos seriam formados por integrantes do próprios ministérios, das agências, das empresas reguladas, dos consumidores e da academia. Na prática, restaria intacta aos órgãos reguladores a fiscalização dos contratos, mas sem a mesma capacidade para elaborar novas regras em setores que vão de energia elétrica à aviação civil.
A emenda foi apresentada pelo deputado Danilo Forte (União-CE), um dos principais aliados do presidente reeleito da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Ele foi o escolhido pela Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE), que endossa a mudança, para protocolar o texto nesta sexta-feira (3).
A FPE congregava pouco mais de 210 deputados no fim do ano passado. A cada recomeço de legislatura, as frentes parlamentares precisam ser recriadas — por isso, não é possível ainda saber o tamanho exato do grupo, mas isso dá uma ideia do grau de articulação que ele tem na Câmara.
Em dezembro, a Câmara já havia avançado em outra medida polêmica, alterando a lei das estatais (13.303/16) para flexibilizar os critérios exigidos na indicação de dirigentes de empresas controladas pela União. Falta a votação no Senado.
As mudanças pretendidas agora pelos deputados abrangem Anatel (telecomunicações), ANP (petróleo e gás), Aneel (energia elétrica), ANM (mineração), ANA (águas e saneamento básico), Anac (aviação civil), ANTT (transportes terrestres), Antaq (transportes aquaviários), Anvisa (vigilância sanitária), ANS (saúde suplementar) e Ancine (cinema).
Além dos conselhos para atividades normativas, a emenda prevê a criação de um “órgão administrativo julgador independente” em cada setor regulado para tratar de contenciosos administrativos, como multas por descumprimentos contratuais.
Hoje os autos de infração são emitidos e julgados administrativamente, com direito a recurso, dentro das próprias agências. A proposta é para que esse novo órgão garanta “duplo grau de jurisdição” e “direito à ampla defesa” antes de decisões finais.
Diante da magnitude das mudanças nas leis das agências reguladoras, a aposta inicial dos deputados era em uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que circulou amplamente nos meios econômicos, mas nunca chegou a ser protocolada. O texto foi levado ao colégio de líderes e tinha o nome formal de “PEC dos Freios e Contrapesos” — uma tentativa de tirar o rótulo intervencionista da medida.
Agora, com a MP 1.154, a análise jurídica da frente parlamentar é que não existe mais a necessidade de emenda constitucional. Isso porque o objetivo da medida provisória já é a reorganização da estrutura de governo, com novos ministérios e órgãos sendo erguidos do zero.
Nos bastidores, deputados relataram à CNN que um dos gatilhos para a ofensiva contra as agências foi um mal-estar entre a Câmara e a Aneel no ano passado, em torno de uma nova regra sobre as tarifas de transmissão de energia.