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    “Houve fraude?”: quatro perguntas que a Americanas deve responder ao mercado

    Varejista divulgou rombo de R$ 20 bilhões, em análise preliminar, na noite da última quarta-feira

    Tamara Nassifda CNN , em São Paulo

    Um rombo histórico nas contas da Americanas, estimado em R$ 20 bilhões, culminou em uma queda de 77% nos papéis da companhia no pregão desta quinta-feira (12), negociados abaixo de R$ 3 por volta das 15h da tarde.

    Desde a divulgação do comunicado ao mercado – Fato Relevante – da gigante varejista, pouco foi esclarecido para agentes do mercado sobre as inconsistências contábeis, que levaram à saída do diretor-presidente, Sergio Rial, e do  diretor de Relações com Investidores, André Covre, empossados em 2 de janeiro deste ano.

    Em consulta com especialistas, a CNN reuniu algumas das dúvidas que investidores e gestores têm levantado desde que a notícia veio à tona. Confira abaixo.

    O que aconteceu, afinal?

    Logo após o fato relevante comunicando as inconsistências contábeis nos lançamentos da Americanas, da ordem de R$ 20 bilhões, analistas de mercado se propuseram a especular sobre o que pode ter acontecido, de fato, com as contas da gigante varejista.

    Para Lucas Pogetti, sócio da RGS Partners, “aparentemente se trata de uma prática contábil incorreta”.

    “Devem ter decidido adotar essa prática no passado e, desde então, deve ter se tornado um padrão aceito internamente, embora em desacordo com as regras contábeis.” É uma teoria de grande adesão entre os especialistas — uma que, até o momento de publicação desta reportagem, não encontra confirmação ou negativas de caráter oficial por parte da gigante varejista.

    No fato relevante divulgado na noite de quarta-feira, a Americanas disse que o Conselho de Administração da empresa “decidiu criar um comitê independente para apurar as circunstâncias que ocasionaram as referidas inconsistências contábeis”.

    De qualquer forma, na visão de Victor Bueno, analista da Nord Research, a “Americanas precisa trazer esclarecimentos para apagar esse fogo que não é pequeno, mas uma queimada dos fundamentos da empresa e de suas ações”.

    “O que realmente aconteceu? Por que essas inconsistências em lançamentos contábeis foram detectadas e por que foram feitas? Há quanto tempo elas existem? Nada ali foi feito para tratar deste rombo de pelo menos R$ 20 bilhões e trazer explicações sobre até onde vai essa dívida”, questiona Bueno.

    Até o presente momento, a leitura dos analistas é que a empresa “tem se comunicado muito mal”, mas que, por causa da dimensão que o caso tem tomado, além do próprio montante estimado em análise preliminar, será difícil fugir das perguntas.

    Foi erro ou fraude?

    A estratégia de tornar pública a inconsistência bilionária dificilmente deixará o caso no escuro. Uma das dúvidas mais imperativas no momento é entender a natureza do rombo: foi causado por erro contábil ou por fraude? E a diretoria anterior tinha conhecimento disso?

    Para Felipe Cima, operador de Renda Variável da Manchester Investimentos, a falta de respostas da Americanas coloca os investidores numa posição de “não saber nem o que perguntar”.

    “É um momento de extrema incerteza, que faz com que os acionistas se perguntem o porquê de estarem nesse barco cheio de furos. Se até o diretor-presidente saiu, o que isso diz para eles?”

    Cima supõe que já era um problema sabido pela diretoria anterior, “que pode não ter tido ânimo para falar sobre o assunto”.

    “É difícil imaginar que uma coisa desse tamanho não tenha passado por ninguém antes de chegar ao Sergio Rial. E a empresa explicou muito mal. Deveria ter deixado o comunicado para quem ia assumir, não para quem deixou a empresa. Isso tudo pode descambar para uma investigação judicial. Uma coisa é dizer que houve erro; outra, que houve fraude. Uma série de pessoas ligadas à empresa, de acionistas majoritários a membros da diretoria, podem se sentir lesadas.”

    Qual o tamanho do impacto das inconsistências no balanço da empresa?

    As ações da gigante varejista fecharam a quarta-feira a R$ 12, com valorização de 0,76%. A cifra colocava o valor de mercado da companhia em R$ 10 bilhões até antes da notícia vir a público — cerca de metade do buraco previsto pela análise preliminar.

    Einar Rivero, da TradeMap, aponta que as ações tiveram valorização de 63,27% desde a menor cotação do papel no dia 16 de dezembro de 2022 quando atingiu R$ 7,25 a ação.  “Se considerarmos o preço máximo do papel, historicamente, que foi no dia 3 de agosto de 2020, a queda até o dia 11 de janeiro de 2022 foi de 90,24%”.

    No dia 14 de julho de 2017 a ação registrou R$ 12,25 e a valorização até o pico em agosto de 2020 foi de 903,20%, lembra Einar.

    “Ainda é cedo para avaliar o tamanho dos impactos, mas a companhia sem dúvida terá que revisar os balanços passados”, diz José Eduardo Daronco, analista da Suno Research.

    “Além disso, vivendo um cenário de juros altos, com uma retração na demanda e um resultado financeiro negativo, a empresa vive um dos momentos mais difíceis da sua história”, avalia.

    Ainda assim, segundo o ex-CEO Sergio Rial em teleconferência promovida pelo banco BTG Pactual, a empresa é hábil para seguir em operação, mesmo com a necessidade de mais capital.

    “O que temos é uma empresa que está trabalhando bem, crescendo, ganhando mercado”, disse ele. “Não vejo impacto de curto prazo no caixa. A não ser que os bancos decidam acelerar a dívida e daí a história é judicializada. Acho que o interesse de todos agora, fora o fígado e a dor de estômago, é ver que essa empresa é viável. Ela poderia perfeitamente gerar entre R$ 1,5 bilhão e R$ 1,7 bilhão de Ebitda esse ano”, apontou Rial.

    Como contornar esse problema?

    Na visão de Bueno, da Nord Research, a empresa também deve esclarecimentos claros sobre “até onde essa história toda vai”.

    “O que pode trazer um pouco de conforto, ou racionalidade, para os investidores da companhia é a necessidade que ela mesma tem de contornar esse problema, que não é um problema pequeno. A Americanas vai precisar aumentar sua dívida e índices de alavancagem, e vai precisar fazer uma captação também.”

    A princípio, segundo Rial, uma das únicas certezas é que a “empresa vai precisar, sem dúvidas, de uma capitalização”.

    “Ninguém definiu o valor, até porque o número não foi auditado. Mas sabemos que não será uma capitalização [apenas] de milhões”, disse Rial, que ainda acrescentou que a 3G — acionista de referência formada por Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira — assumirá parte da responsabilidade de injetar capital.

    “Eles são parte da solução, mas não toda a solução”, frisou. Os sócios da 3G já entraram, lembrou Rial, com um terço da capitalização de R$ 8 bilhões feita pela empresa em 2020.

    “A necessária infusão de capital vai ser capital por si só ou com algum movimento estratégico, mas aqui tem uma oportunidade de se redesenhar as coisas. Fora o balanço da Americanas, redesenhar algumas coisas do setor”, disse o ex-CEO na teleconferência.

    “A empresa é grande o suficiente para poder ser uma peça importante e ser redesenhada.”

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