Ao assumir Itamaraty, Mauro Vieira diz que “Brasil está de volta” ao cenário internacional
Embaixador nomeado por Lula para chefiar o Ministério das Relações Exteriores criticou “visão ideológica limitante” na gestão Bolsonaro
Logo após assumir o comando do Ministério das Relações Exteriores (MRE), embaixador Mauro Vieira afirmou que “o Brasil está de volta” ao cenário internacional.
O novo ministro recebeu simbolicamente o cargo das mãos do antecessor nesta segunda-feira (2), após ter sido empossado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Palácio do Planalto no domingo (1º) – pouco depois de o petista ter recebido a faixa presidencial.
Praxe que não foi seguida em todas as cerimônias desta segunda (2), o cargo foi transmitido a Vieira pelo antecessor, e agora ex-ministro da pasta, Carlos Alberto França.
No discurso, Mauro Vieira criticou o que chamou de “visão ideológica limitante” na gestão da pasta no governo de Bolsonaro. “Estivemos alijados do cenário internacional por força de uma visão ideológica limitante.”
Vieira avaliou, no entanto, que a “boa notícia” com a posse de Lula “é que o Brasil está de volta” nas relações internacionais.
O diplomata escolhido por Lula para chefiar o Itamaraty disse estarmos vivendo “uma crise de governança global sem precedentes”, um “momento complexo para nossa região”, com “problemas graves” e afirmou que “será necessário ampliar e recuperar essa capacidade”
Mauro Vieira também afirmou que o “quadro [internacional foi] agravado pela emergência climática” e destacou que a “pandemia da Covid-19 reforçou importância da diplomacia da saúde”.
Vieira declarou que o “Brasil terá de reassumir a posição de liderança entre os países de desenvolvimento” e avaliou que, ao oferecer o país como sede da COP 30 em 2025, o presidente reforçou credenciais para o fortalecimento da matéria. “O presidente Lula deu o tom do que será sua política para condução do clima.” O novo ministro também prometeu fortalecer o tratado de cooperação amazônica. “A proposta do presidente Lula de cúpula amazônica será elaborada com grande atenção.”
“O Brasil e os demais países emergentes querem ter vez e voz nas decisões internacionais”, disse, ao prometer que trabalhará pela nomeação permanente do Brasil no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU).
“Colaboraremos no Conselho da Assembleia-Geral da ONU para implementação da agenda de mulheres, paz e segurança, além de políticas de desarmamento e proibição de armas nucleares.”
Vieira disse ainda que o Brasil retomará o compromisso de reformas das instituições financeiras internacionais e prometeu buscar novos acordos bilaterais e de fortalecimento do comércio internacional, além de utilizar de maneira “criativa” o G20 e o BRICS.
Defendeu o retorno do protagonismo local e reforçou a importância das relações bilaterais com a Argentina e multilaterais com os países que formam o Mercosul. “Nossa ideologia será da integração”. Vieira também prometeu retomar e fortalecer a União de Nações Sul-Americanas (Unasul). “O abandono da América Latina e do Caribe foi o que causou maiores prejuízos.”
O novo ministro afirmou que o Brasil fará uma “retomada da política externa verdadeiramente universalista”, incluindo de maneira efetiva um diálogo de alto nível com países africanos, para tratar de “desafios comuns”, como alimentos. “Seguiremos atentos à importância de fortalecer as instituições democráticas, sempre com respeito à soberania dos países.”
Sobre Israel e Palestina, o novo ministro defendeu retomar uma posição de equilíbrio, defendendo as fronteiras estabelecidas e o direito internacional. Também prometeu reforçar o comércio com o Oriente Médio. Já com a União Europeia, Vieira afirmou que “as relações com países europeus serão retomadas com novas bases”, como inclusão social e de gênero e questões climáticas, no entanto, “vitando que o meio ambiente seja utilizado como pretexto para o protecionismo”.
Com os EUA, Vieira disse que a pasta tratará a relação bilateral sem preconceito sobre qualquer assunto e prometeu “dinamizar o relacionamento econômico”. “Trataremos de maneira madura eventuais diferenças naturais entre as duas nações.”
O chefe do Itamaraty reforçou a importância do fato de a Embaixadora Maria Laura da Rocha a ser a mulher a atingir o posto mais alto dentro da carreira diplomática, ao assumir o cargo de secretária-geral do MRE, e afirmou que vai criar políticas de inclusão no Itamaraty.
“Buscaremos recrutar mais mulheres, negros e indígenas. Ampliaremos sua presença em cargos de liderança. (…) Bolsas de ação afirmativa para negros.”
“Excelente escolha”, diz ministro de Bolsonaro
À CNN, o agora ex-ministro Carlos França avaliou a escolha de seu sucessor como “excelente” e elogiou Vieira como alguém “preparadíssimo” para o cargo de ministro. “Gostaria de ter tido o privilégio de chefiar a pasta por duas vezes após assumir embaixadas importantes no exterior”, afirmou o ex-ministro.
Apesar das críticas de Vieira à gestão Bolsonaro, Carlos França avaliou como positiva a transição da pasta e agradeceu ao novo ministro por tê-lo convidado para lhe transmitir o cargo na cerimônia.
No discurso de abertura, França agradeceu ter sido escolhido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e fez um balanço da gestão à frente do MRE.
Carlos França ressaltou a eleição de Leonardo Nemer Caldeira Brant para o cargo de juiz da Corte Internacional de Justiça, para ocupar até 2027 o restante do mandato deixado vago pelo falecimento do juiz brasileiro Antônio Augusto Cançado Trindade. O ex-ministro também elogiou o mandato do Brasil como integrante do comitê de segurança da ONU.
Biografia do novo ministro
Mauro Vieira estava como embaixador do Brasil na Croácia desde 2018 – cargo que já havia ocupado também entre 2015 e 2016, durante o governo Dilma Rousseff (PT).
Além disso, Vieira já esteve à frente alguns dos principais postos no exterior, como as embaixadas brasileiras na Argentina e em Washington, além da representação do Brasil nas Nações Unidas, em Nova York.
Nascido no Rio de Janeiro, Mauro Luiz Iecker Vieira, 71 anos, estudou no Colégio Salesiano Santa Rosa, em Niterói, e é bacharel em direito pela Universidade Federal Fluminense. Diplomata de carreira, é formado pelo Instituto Rio Branco.