Mauricio Pestana: Uma transição à moda antiga
Movimentação negra na equipe ainda se faz como no passado, em áreas como Cultura, Igualdade Racial, Direitos Humanos e, quando muito, Justiça
A esperada lista de transição que irá balizar o novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sofreu várias críticas quando houve o anúncio dos primeiros 90 nomes.
A pouca presença de pessoas negras e nordestinas – responsáveis diretamente pela eleição do petista, segundo os números das urnas – provocou muitas reclamações. Isso fez com que, na segunda fase de apresentação de nomes, surgissem figuras importantes da vida cultural e progressista nordestina – como a cantora Margareth Menezes, que não havia sido lembrada de antemão.
Mais de duas décadas se passaram desde a posse do primeiro mandato do governo Lula, com o mundo e o Brasil mergulhando em profundas mudanças políticas, econômicas e sociais. Hoje, a diversidade e inclusão racial fazem parte das agendas econômicas de grandes setores como Bolsa de Valores, Fiesp… enfim, o mundo econômico, e não mais só o mundo social como 20 anos atrás.
Mesmo assim, percebemos que a movimentação negra na equipe de transição ainda se faz como no passado, naquelas áreas que parecem historicamente reservadas a nós: Cultura, Igualdade Racial, Direitos Humanos e, quando muito, Justiça.
O Brasil padece de um projeto de desenvolvimento econômico para a população negra e, no campo governamental, isso não vai ocorrer se não estivermos presentes nas áreas econômicas que, ao longo desses séculos de exploração, o racismo não nos permitiu entrar.
Precisamos nos fazer presentes na Fazenda, no Planejamento, nas diretorias e presidências das estatais, no Banco Central, no Ministério da Educação, da Saúde etc. Ou seja: em áreas com recursos, poder e visibilidade, que possam realmente firmar um projeto de inclusão e diversidade negra na macropolítica econômica de poder.
Falo isso porque é dessas áreas que historicamente saem indicações para governadores, prefeitos e onde este sistemão branco e excludente da política brasileira se retroalimenta.
No momento em que os Estados Unidos, com uma população negra de 13%, elegem uma mulher negra como vice-presidente, e que a Colômbia e a Costa Rica elegem vice-presidentes negras, era de se esperar que o maior país negro fora da África, que sequer ousou discutir esta possibilidade, estivesse preocupado em avançar em um projeto político de inclusão e poder pensando no futuro.
Para isso acontecer, áreas estratégicas deveriam estar no centro das discussões e disputas. Mas, infelizmente, o que vemos são movimentações saudosistas do passado que não atenderão sequer as ansiedades negras do presente, muito menos os desafios do futuro.
*Este texto não representa, necessariamente, a opinião da CNN Brasil