Investidor da FTX processa Tom Brady, Gisele Bündchen e outras celebridades
Ação judicial coletiva alega que famosos endossaram plataforma de criptomoedas que agora faliu e espalhou crise no ecossistema de criptos e ativos digitais
As consequências do colapso da gigante FTX desencadearam um efeito dominó de amplo alcance: a empresa seduziu diversas celebridades que endossaram a plataforma agora falida, e o contágio financeiro está se espalhando pelo vasto ecossistema de criptos e ativos digitais.
Na quarta-feira (16), o braço de empréstimos da corretora de criptomoedas Genesis suspendeu os resgates e novas solicitações de empréstimos, após um número “anormal” de pedidos de retirada que excedeu sua liquidez atual, citando a turbulência no mercado devido ao colapso da FTX.
A Genesis disse que estava trabalhando com consultores “para explorar todas as opções possíveis”, acrescentando que divulgaria um plano para seu negócio de crédito na próxima semana. “Estamos trabalhando ininterruptamente para identificar as melhores soluções para o negócio de empréstimos, incluindo, entre outras coisas, a encontrar uma nova fonte de liquidez”, afirmou a empresa.
O braço de empréstimos da Genesis tinha cerca de US$ 2,8 bilhões (aproximadamente R$ 14,9 bilhões) em empréstimos ativos no terceiro trimestre, de acordo com seu site.
A suspensão ocorre num momento em que toda a indústria cripto está no limite após a quebra repentina da exchange FTX e do fundo de hedge cripto Alameda Research, ambas empresas de Sam Bankman-Fried e que pediram falência no fim da semana passada.
“No mundo das criptomoedas, na hora que você ouve uma empresa anunciar ‘estamos suspendendo temporariamente os saques’ – caramba”, disse Daniel Roberts, editor sênior da Decrypt Media, agência de notícias dedicada a criptoativos. “Você meio que os coloca no leito de morte. Não é comum alguém dizer ‘estamos suspendendo os saques’ e depois falar, ‘tudo certo, as retiradas estão liberadas, estamos bem'”.
Mas esse “leito de morte” não se limita à Genesis.
Logo após a suspensão de retiradas pela empresa, a Gemini, exchange de criptoativos fundada por Tyler e Cameron Winklevoss e que tem parceria com a Genesis, avisou aos clientes que os resgates de seu programa “Earn” seriam adiados. A Gemini disse que estava trabalhando com a Genesis para ajudar os clientes a resgatar fundos do programa, o que permitiu aos clientes ganharem juros sobre as participações criptográficas.
Nenhum outro produto ou serviço da Gemini foi afetado, afirmou a empresa.
Enquanto isso, outro grande player no mundo cripto, o BlockFi, suspendeu os saques na semana passada após a quebra repentina da FTX. Na terça-feira (15), o The Wall Street Journal reportou que o BlockFi estava se preparando para uma possível declaração de falência.
É claro que os principais players do setor estão correndo para se distinguir da FTX e de outras empresas que faliram no ano passado, já que os preços de tokens despencaram.
Um deles é Brian Armstrong, CEO da Coinbase, que na quarta-feira (16) disse à Julia Chatterly, da CNN, que embora as consequências estejam prejudicando a indústria agora, no fim isso pode ser positivo para empresas como a dele.
“Os criptoativos não vão a lugar nenhum”, disse ele em entrevista que vai ao ar na quinta-feira (17), no programa First Move. “Um player ruim não prejudica a coisa toda – da mesma forma que Bernie Madoff não nos fez questionar todo o sistema financeiro tradicional”.
Ação judicial cita Tom Brady, Gisele Bündchen e outros
E as dores de cabeça jurídicas para Bankman-Fried, fundador da FTX que se demitiu do cargo de CEO na semana passada, estão só começando.
Na quarta-feira (16), um investidor da FTX entrou com um processo contra Bankman-Fried, assim como contra várias celebridades que endossaram a plataforma, incluindo Tom Brady, Gisele Bündchen e Steph Curry. “A enganosa plataforma FTX, mantida pelas entidades FTX, era verdadeiramente um castelo de cartas”, declarou a proposta de ação judicial coletiva.
Adam Moskowitz e David Boies, dois advogados peso-pesado, entraram com a ação em nome de um cliente da FTX, Edwin Garrison.
Moskowitz, advogado da Flórida, também está por trás de uma ação coletiva contra o credor de cripto Voyager Digital, que também entrou com pedido de recuperação judicial no início deste ano. Boies talvez seja mais conhecido por representar o vice-presidente Al Gore no caso de Bush contra Gore, no ano 2000.
Em um e-mail para o CNN Business, Moskowitz alegou que a FTX era “um esquema Ponzi gigantesco, ainda maior que o esquema de Madoff”.
“A FTX era genial em relações públicas e marketing, e sabia que… só poderia ter sucesso com a ajuda e promoção das celebridades e influenciadores mais famosos, respeitados e amados do mundo”, escreveu Moskowitz.
Representantes de Brady, Bündchen e Curry não responderam imediatamente aos pedidos de comentário do CNN Business.
Advogados que não estão envolvidos no caso disseram ao CNN Business que uma questão-chave no processo será se os criptoativos podem ser tratados como títulos, de acordo com a lei. A Securities and Exchange Commission (SEC, a CVM norte-americana) disse que sim, o setor discorda totalmente.
Em seu auge, a FTX recebeu o apoio de vários atletas e celebridades. Brady e Bündchen, em especial, assumiram em 2021 uma participação acionária de quantia não revelada na corretora.
Não está claro no processo qual a relação econômica que as celebridades tinham com a FTX, comentou Charles Whitehead, professor da Faculdade de Direito de Cornell, que não está envolvido no caso. Mas a promoção de cripto tem implicações diferentes das de endossar bebidas ou roupas esportivas.
“Vender um ativo que é um instrumento financeiro… não é a mesma coisa que vender um tênis”, advertiu Whitehead. “Existem regras antifraude e de proteção ao consumidor para a venda de tênis ruins”. “Há regras ainda mais restritivas quando se fala de vender ativos financeiros”.
E acrescentou: “todas essas celebridades que estão fazendo esse tipo de patrocínio deveriam parar e contratar um advogado de títulos e valores mobiliários”.
Crescentes pedidos de regulação
Nos últimos dias, reguladores, legisladores e até mesmo líderes da indústria cripto apelaram publicamente para que o Congresso norte-americano tomasse medidas no mercado de criptomoedas, que é pouco regulado e carece de diretrizes claras para os traders.
“O recente colapso de uma gigante corretora de criptomoedas e o impacto que isso tem para os detentores e investidores de criptoativos demonstra a necessidade de uma supervisão mais eficaz dos mercados de criptomoedas”, declarou a Secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, na quarta-feira (16). “Onde os regulamentos existentes se aplicam, eles devem ser rigorosamente implementados, para que haja as mesmas proteções e princípios para ativos e serviços criptográficos”.
*Jennifer Korn, do CNN Business, contribuiu para esta reportagem