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    Carta ao presidente: o que (nós, pretos e pardos) esperamos de você, companheiro!

    CNN ouviu alguns dos representantes da pauta racial no Brasil em busca de uma projeção sobre o que deve ocorrer no governo Lula

    Letícia Vidicada CNN

    A escolha do presidente Lula para governar o Brasil pelos próximos quatro anos reforçou ainda mais uma ideia que carrego comigo há muito tempo (talvez mais que uma ideia, uma inquietação): a de que as “minorias” são as maiorias.

    Não só escrevo com aspas como sempre gosto de falar ASPAS quando me refiro aos grupos minorizados porque sempre me questiono: como pode um grupo que representa mais de 50% da população brasileira – os pretos como eu – ser considerado minoria?

    As minorias, mais uma vez, mostraram que são maioria, que tem voz e vez e que a soma de muitas vozes diversas tem força de mudar o rumo de um país. Isso me dá esperança de que pautas que considero tão importante para o avanço de uma sociedade possam continuar (ou voltar) a serem priorizadas.

    Pautas sociais que consideram que só com oportunidades iguais podemos ter um país mais igualitário. Oportunidades iguais que nos inserem e não nos excluem. Oportunidades iguais que tratem de representatividade mas também de inclusão.

    E então, companheiro Lula, tem muita gente esperando que o apertar do verde da urna somado ao seu discurso no domingo último sobre sua vitória, no qual destacou a importância dessas pautas no seu governo, avance neste quesito.

    Para isso, a gente foi ouvir alguns dos representantes da pauta racial sobre o que eles esperam do seu governo nos próximos anos.

    Reconhecimento do racismo

    “Seria extremamente emblemático que o presidente Lula faça um reconhecimento público do racismo. Um reconhecimento de que o estado brasileiro produziu e continua produzindo racismo contra a população negra, prejudicando ainda em muito essas pessoas.”, destaca Irapuã Santana, presidente da comissão de igualdade racial da OAB-SP.

    Apesar do racismo ser um crime no Brasil (Lei 7.716/1989) com pena de reclusão, as práticas racistas e o racismo estrutural ainda permeiam a nossa sociedade. Coisas que gente como eu sente na pele quase que diariamente. Heranças de um Brasil escravocrata, que por três séculos e meio fez do nosso país o maior o maior território escravista do hemisfério ocidental: 12,5 milhões de africanos foram trazidos para cá em condição de escravizados! E, mesmo depois da ‘Abolição’ da escravatura seguiram à própria sorte, sem meios de seguir a vida para terem de fato oportunidades iguais.

    “A gente precisa fazer com que a União volte seus olhos para a população negra. Ela precisa de dinheiro para fazer política pública, precisa de um fundo para isso. Isso é a pedra fundamental para gente conseguir começar a promover políticas públicas e para que haja emancipação da população negra brasileira”. Irapuã Santana e a Educafro entraram com uma ação civil pública pedindo esse reconhecimento e também a criação de um fundo de para financiar políticas públicas voltadas para a população negra.

    Políticas públicas que devem não só ser criadas mas também mantidas como a política afirmativa de cotas.

    “Eu desejo que as cotas nas universidades possam ser mantidas, ampliadas e aprimoradas. Manter os jovens negros no sistema de ensino. Que as políticas de cotas nos serviços federais também possam ser renovadas, já que a lei termina em 2024”, deseja José Vicente, reitor da Universidade Zumbi dos Palmares.

    Compartilho do mesmo desejo de Zé Vicente. Nos últimos dez anos, é inegável o aumento de pessoas pretas e pardas que ingressaram no ensino superior. Vi muita gente parecida comigo – conhecida ou não – de diploma na mão, sendo o primeiro da casa a ir para a faculdade, quebrando um ciclo de pobreza e trazendo um pouco mais de oportunidade social para a próxima geração de suas famílias.

    Mais representatividade e pluralidade

    Ao falar de desejos, caro companheiro, se somos 54% da população brasileira por que não nos vemos tanto assim? Por que, por exemplo, ao viajar para os Estados Unidos sempre tenho a impressão de que vejo mais negros por lá, sendo que eles somam pouco mais de 10% de pretos em sua população?

    É hora de ocuparmos mais espaços de poder, de nos vermos mais representados e colorirmos mais os espaços. Para Zé Vicente, a fisionomia dos brasileiros que representam essa estética multicultural tem que ser a marca profunda da reconstrução de onde emerge um país dividido.

    “É importante considerar que o negro emerge como força política com bastante relevância. É preciso que essa força seja reconhecida para manutenção das políticas públicas de inclusão e que o negro seja colocado no alto escalão do governo. Queremos representatividade e inclusão de negros no governo”, destaca Zé Vicente.

    Pela primeira vez no país, tivemos uma maioria de candidatos que se apresentaram como pretos ou pardos. Muitos eleitos. E, segundo o reitor, o negro se transformou numa força política relevante e crucial para a vitória de Lula.

    “Diversidade seja mantida como agenda importante, assim como combate e enfrentamento ao racismo, manutenção de políticas afirmativas, de pertencimento e que a estética multicolorida do país possa ser expandida e consolidada como nova formulação de um Brasil de todos”, reforça Zé Vicente.

    Uma país de todos, o qual também espero que possa ver mais pessoas como eu (de pele escura ou não mas pretas e pardas igualmente) representadas em mais espaços da sociedade, mostrando a força da ‘minoria maioria’, avançando de fato para um país mais igualitário em oportunidades e acessos.

    É o que – pessoas pretas como eu – esperamos de você, companheiro!

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