Sergio Vale: Por que a economia não ajudou Bolsonaro nas eleições?
Seis fatores indicam por que os números positivos não impulsionaram candidatura do presidente
A poucos dias da eleição, a melhora na economia não parece ter surtido o efeito que o presidente Bolsonaro esperava. E não foi pouca coisa que se viu acontecer: deflação em três meses seguidos, algo inédito; desemprego abaixo de 9% em queda rápida, crescimento do PIB que era esperado em zero e agora está beirando os 3% para o ano. Números que dariam bom resultado em propaganda eleitoral, mas que não tem repercutido na eleição do presidente. O que acontece?
Primeiro, é uma recuperação desigual. Os estados que estão em crescimento são aqueles do agronegócio. A massa real de renda tem crescido de forma significativa nesses estados, com forte peso da agropecuária, mas nos estados do Sudeste e alguns do Nordeste especialmente a recuperação tem sido mais lenta. A agropecuária melhorou esse ano pelo forte empuxo das commodities em preço e volume, que foi recordo histórico e ajudou a alavancar o crescimento nessas regiões. As outras têm recuperação por conta de serviços, na saída pós-pandemia. Mas vejam que nem uma nem outra razão tem a ver com o governo. Não foi política fiscal nem alguma medida específica do governo que engatou crescimento este ano.
Segundo, a deflação aconteceu em itens específicos de energia e combustíveis, com impacto relevante para a classe média. Mas a virada de voto que Bolsonaro precisaria está na classe baixa de renda. Para esta o essencial era uma queda forte de alimentos, que não aconteceu. Pode ser que agora no final do ano a inflação de alimentos caia, mas já terá passado a eleição. De qualquer maneira, a sensação térmica para a população é ruim, pois mesmo que para de subir, os preços de alimentos se encontram em patamares extremamente elevados.
Terceiro, o Auxílio Brasil veio tarde e apenas isso não basta. Diversos outros programas sociais tiveram cortes ao longo desse ano para acomodar os gastos do Congresso com o orçamento secreto. Aumentar a renda da população mais pobre quando se diminui o acesso a medicamentos e alimentos foi um tiro no pé do governo.
Quarto, a economia só não basta, mas é quase tudo. Se a máxima de James Carville lá atrás na eleição de Bill Clinton deu a tônica de muitas campanhas eleitorais na sequência, não se pode esquecer que a memória do eleitor vai longe. Se o ontem era melhor do que o hoje, ficamos com o ontem. Esse tem sido o sinal da população, que tem memória afetiva dos tempos Lula em detrimento de um governo Bolsonaro que entregou baixo crescimento econômico nos últimos anos. Não basta entregar o que se tem agora, pois é menos do ponto de vista de percepção da população mais pobre em relação ao que ela tinha lá atrás.
Quinto, Bolsonaro causou um estrago inigualável na questão ambiental em um momento em que esse tema é diplomaticamente sensível. A entrada de Marina Silva na campanha de Lula manda um sinal importante para o mundo de atenção para esse tema
cada vez mais relevante para investimentos estrangeiros aportarem aqui. Indiretamente isso acaba ajudando a eleição de Lula.
Por fim, não podemos esquecer que eleição presidencial apela muito para o carisma do candidato. Lula, nesse sentido, mostra mais empatia para a população, especialmente quando se trata da pandemia em que Bolsonaro errou do início ao fim. Quase 700 mil mortes depois, o presidente não tem tempo hábil para desculpas que a população consiga acreditar.
Uma virada para o presidente Bolsonaro poderá acontecer, mas é muito provável que não. Os próximos meses serão essenciais para a economia, mas na busca de quem poderá ser o próximo ministro da Economia (ou da Fazenda), tema que será o foco de atenção do mercado no último trimestre deste ano.
*Este texto não representa, necessariamente, a opinião da CNN Brasil.
Fotos – as imagens dos candidatos à Presidência que serão exibidas nas urnas
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