Boris Casoy: Substituindo o presidente
Constituição não prevê substituição quando o presidente viaja; manobra de Mourão e Lira foi desnecessária
Durante a viagem do presidente Jair Bolsonaro (PL) a Londres, para os funerais da rainha Elizabeth e, para Nova York, onde discursou na abertura da Assembleia Geral da Nações Unidas, quem assumiu o comando do Palácio do Planalto foi o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Isso porque os dois substitutos imediatos do presidente da República, segundo a Constituição, não o fizeram porque ficariam inelegíveis nas próximas eleições.
O vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos) é candidato ao Senado pelo Rio Grande do Sul. Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados, é candidato à reeleição. Ambos tiveram de viajar. Mourão programou uma viagem ao Peru; Lira acompanhou o presidente Bolsonaro na Assembleia Geral da ONU. Pacheco assumiu porque ainda tem pela frente quatro anos de mandato como senador.
Para surpresa de muitos toda essa manobra foi desnecessária. A Constituição brasileira não obriga à substituição do presidente em suas viagens. Isso tem sido feito por mera liberalidade e acabou se transformando num costume que é tido como obrigatório.
Segundo a Constituição de 1988, em seu artigo 79, o vice-presidente substituirá o presidente “no caso de impedimento, e suceder-lhe-á, no de vaga”. Não há qualquer menção a viagens. A não ser que consideremos uma mera viagem um impedimento…
Por acaso, o presidente Bolsonaro deixou a presidência enquanto estava nos Estados Unidos para discursar na ONU? Deixou de ser presidente quando acompanhou os funerais da rainha Elizabeth, em Londres? Nesses casos o Brasil teria um presidente eleito itinerante e um de plantão no Palácio do Planalto… Um impedimento seria uma doença grave ou um acidente que afetasse a consciência do primeiro mandatário.
Essa inexistente “obrigação constitucional” de o presidente ser substituído em suas viagens deriva do tempo em que as viagens eram longas, feitas de navio e o chefe do Executivo ficava incomunicável. Hoje, com os modernos meios de comunicação, o presidente da República pode tomar decisões como se estivesse em seu gabinete. Tem disponível equipamentos de comunicação telefônicos, rádio, internet e satélites etc.
Não deixa de ser plenamente presidente por um segundo sequer. Portanto, essa substituição é desnecessária e não obedece a Constituição. Uma enorme bobagem, talvez mantida para dar ao vice a oportunidade de sentir-se à mesa presidencial brincando de comandar um governo que não comanda.
Este texto não representa, necessariamente, a opinião da CNN Brasil.