O clima mudou e pede uma nova abordagem
O clima mudou. Durante a Brazilian Climate Summit, realizada em New York nos dias 15 e 16 de Setembro, o ar estava diferente – e não era por causa do agradável mormaço do final do verão de Manhattan. O evento foi de alto nível e contou com participantes brasileiros e estrangeiros, todos interessados em investir no Brasil, em projetos inclusivos e associados aos processos de reestruturação produtiva relacionados à uma economia de baixo carbono. O destaque foi o retorno da esperança e o olhar para o futuro. A excitação era decorrente das possibilidades de novas políticas públicas pautadas pelos princípios de sustentabilidade associados ao potencial dos mercados de investimentos verdes
A comunidade internacional aguarda ansiosa o retorno do Brasil à cena global. Todos se ressentem da ausência daquele simpático país, um dos principais protagonistas do multilateralismo e de importantes contribuições para a construção de uma ordem internacional mais cooperativa e solidária. Os tempos em que o país posava orgulhosamente como pária, após a derrota de Trump na eleição presidencial dos Estados Unidos, estão ficando para trás.
As negociações internacionais sobre clima estão travadas. Outros assuntos mais prementes a remeteram para segundo plano: A fragilização do multilateralismo especialmente, a pandemia do Covid, a crise e econômica financeira subsequente, a guerra na Ucrânia, a desglobalização e a desorganização das cadeias produtivas globais criaram um impasse de difícil superação. A Europa que tradicionalmente liderava os avanços nas negociações internacionais está desarrumada em função da delicada situação econômica alemã e da ascensão da extrema direita em vários países. Estados Unidos e China, por razões distintas, voltaram-se para dentro em função das prioridades domésticas. A Rússia está em guerra militar e midiática, com suas energias consumidas no conflito com a Ucrânia. A Índia vive um momento de ascensão de seu nacionalismo, observado com tensão por seus vizinhos e parceiros. Há ansiedade pelo retorno do Brasil à arena global porque no passado o Brasil funcionava como um empático broker de todos estes protagonistas, por causa de seu soft power e de sua diplomacia ambiental.
No plano doméstico, no limiar de uma mudança de governo, uma confluência de coalizões vem amadurecendo um conjunto de proposições destinadas a instrumentalizar os novos dirigentes do país no enfrentamento dos desafios de uma agenda que coloca o Brasil no mundo e atrai as atenções globais para o país, em especial para a Amazônia. Este grupo vem sendo liderado por movimentos e organizações como a Concertação pela Amazônia, a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, o Amazônia 2030, o Observatório do Clima e o Instituto Clima e Sociedade, dentre outros.
Esta reversão das expectativas relacionadas ao Brasil está intimamente relacionada com a substituição do governo atual por um conjunto de forças políticas comprometidas com um Brasil maior e melhor, que tenha a agenda climática e de desenvolvimento sustentável como âncoras. A Emergência Climática não é mais um tema da agenda ambiental apenas, pelo contrário. A descarbonização da economia encontra-se no centro da agenda de crescimento dos países desenvolvidos, dos países emergentes e dos países pobres. China, União Europeia e Estados Unidos estão se movendo nesta direção faz tempo. A fragilização do multilateralismo nos últimos anos – Trump, Covid, Guerra – desacelerou o movimento global galvanizado pela plataforma dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis no contexto da Agenda de Desenvolvimento 2030, ancorada nas Nações Unidas. A interdependência das negociações internacionais e das políticas públicas nacionais afetas à Emergência Climática exigirá do próximo governo um tratamento diferenciado do assunto. As negociações sobre metas globais em acordos internacionais são, cada vez mais, conduzidas não apenas ou exclusivamente por quadros dos ministérios de meio ambiente e relações exteriores, mas principalmente por representantes de Presidentes da República e Gabinetes de Primeiros Ministros e por altos dirigentes dos Ministérios da Economia e Desenvolvimento Econômico.
O novo governo brasileiro possivelmente já estará participando das Conferências das Partes de Clima e Biodiversidade, no Egito e no Canadá, por meio dos quadros designados para participar da transição presidencial. Esta situação de compasso de espera não se confunde com paralisia porque a sociedade civil organizada, o empresariado engajado na economia de baixo carbono e os setores acadêmicos especializados no debate da mudança climática estão trabalhando juntos na instrumentalização das visões do Brasil, no futuro próximo, em relação às transformações necessárias para o desenvolvimento das potencialidades do país associadas às infraestruturas verdes.
Discute-se a criação de uma Secretaria Extraordinária de Emergência Climática, diretamente vinculada ao Presidente, no próximo governo, porque o assunto precisa ser tratado de forma supraministerial, buscando a coordenação e integração das ações orientadas para lidar com desafios intersetoriais, intergovernamentais e internacionais, com acesso próximo ao Presidente da República.
As negociações climáticas internacionais não têm como ser tratadas como monopólio do Ministério das Relações Exteriores. O Ministério do Meio Ambiente não tem nem os meios nem as condições políticas para lidar com uma temática em grande parte fora de sua jurisdição. O Ministério da Economia – que nos últimos anos incluiu competências dos antigos Ministérios da Fazenda, Planejamento e Indústria & Comércio Exterior – não pode tratar assuntos como alocação de recursos, concessão de crédito e subsídios sem entender do assunto e sem levar em conta as metas nacionais de neutralização de carbono. O Ministério da Ciência e Tecnologia tem um papel neste debate que vai além da elaboração do relatório do país sobre emissões de carbono, que inclui uma política científica e tecnológica orientada para inovação voltada para a neutralização de emissões. O Ministério da Agricultura e Pecuária precisa recuperar seus lampejos modernizadores do passado que colocam a agricultura sustentável, de baixo carbono no centro de sua agenda política e da sua pauta exportadora. O Ministério da Integração Nacional só concentrará suas atenções na Amazônia – prioridade nacional e global do ponto de vista da ótica climática se for induzido e empoderado a priorizá-la. A agenda social do governo, incluindo educação, saúde, combate à pobreza, gênero, raça, populações indígenas, justiça climática e outras não tem como avançar em suas áreas específicas, aprisionadas em silos organizacionais. A área financeira do governo já internalizou a problemática da neutralização do carbono como demonstram iniciativas do Banco Central, BNDES, BB e CEF. Mas esta é uma problemática em que, se cada um fizer a sua parte, não é suficiente para as necessidades do país
A criação da Secretaria de Emergência Climática pode alavancar sinergias para lidar com uma agenda portadora de futuro, na qual o Brasil possui um lugar único no mundo. New York discute o Clima no Brasil. Demorou, mas … o clima mudou, para melhor, muito melhor.
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