Estudo: meninos vão 18 vezes menos ao urologista que meninas ao ginecologista
Campanha da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) enfatiza a importância dos cuidados da saúde genital e reprodutiva de jovens e adolescentes
Um levantamento inédito realizado pela Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), com dados do Sistema de Informação Ambulatorial do Ministério da Saúde, aponta que o número de atendimentos de adolescentes meninos de 12 a 18 anos ao urologista é 18 vezes menor que o de atendimentos de meninas ao ginecologista da mesma faixa etária.
Em setembro, a SBU realiza a campanha #VemProUro, que enfatiza a importância de que os meninos também cuidem da saúde genital e reprodutiva, além de incentivar a vacinação contra o HPV na luta contra os cânceres provocados pelo vírus.
“Enquanto as meninas, após saírem do pediatra, em sua maioria seguem conectadas com a sua saúde sobretudo através do ginecologista, cuidando e sendo orientadas sobre sua saúde geral e genital, o menino de repente cai em um limbo de assistência médica, muitas vezes por achar que não é necessária, mas outras simplesmente porque não tem ideia do que isso possa trazer em termos de benefício”, diz a médica Karin Anzolch, diretora de comunicação da SBU.
A especialista afirma que a cultura de que homem só vai ao médico quando está doente pode trazer prejuízos à saúde a longo prazo.
“Talvez o legado mais importante de toda a campanha seja realmente a aproximação precoce do menino com os cuidados de saúde, incluindo a genital, tão importante para a qualidade de vida, para as relações e para a saúde global, seja através do urologista, do clínico geral, do hebiatra ou do médico da família”, complementa.
Os dados de atendimentos gerais dos adolescentes pelo Sistema Único de Saúde (SUS) vão ao encontro do levantamento realizado pela SBU. Números de 2020 do Sistema de Informação Ambulatorial (SIA), do Ministério da Saúde, mostravam que o acesso das meninas entre 12 e 19 anos ao SUS foi quase 2,5 vezes maior que o dos meninos: 10.096.778 de meninas, contra 4.066.710 de meninos.
Ações de promoção de saúde
Desde 2018, ano da primeira campanha da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), são abordados os mais variados aspectos da saúde de meninos, com ênfase em algum assunto específico.
Neste ano, serão destaques as Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs), com foco especial no HPV e na importância da vacinação no período inicial da adolescência, antes da primeira relação sexual. O HPV é a principal causa de câncer de colo do útero e também está associado ao câncer de pênis.
Dados do Ministério da Saúde apontam que menos de 40% dos adolescentes masculinos foram vacinados com as duas doses da vacina contra o HPV.
“A cada ano percebe-se um maior engajamento dos urologistas e um maior alcance da população de adolescentes masculinos e seus pais. Acredito que, com o passar do tempo, essa campanha contribuirá decisivamente para uma mudança de cultura de cuidados à saúde dos meninos, equiparando ao que vemos hoje nos cuidados à saúde das meninas adolescentes”, ressalta o urologista Daniel Suslik Zylbersztejn, coordenador da campanha.
Dados do Ministério da Saúde, obtidos com exclusividade pela SBU, mostram que em 2021 foram registrados 189.943 atendimentos femininos por ginecologistas na faixa etária de 12 a 18 anos, contra 10.673 atendimentos masculinos por urologista nessa mesma faixa etária, o equivalente a cerca de 18 vezes a menos. Em 2020 foram 165.925 atendimentos femininos por ginecologistas e 7.358 atendimentos de meninos por urologistas.
“Esses números enfatizam a discrepância existente entre os cuidados de saúde entre os sexos na adolescência. A ida ao médico de forma regular está presente na vida das meninas, enquanto a visita ao urologista se resume, de forma geral, à presença de alguma doença aguda do trato geniturinário, pouco comum nessa fase da vida”, diz Zylbersztejn.
ISTs entre jovens
Entre as ISTs mais comuns estão sífilis, herpes simples, cancro mole, HPV, linfogranuloma venéreo, gonorreia, tricomoníase, hepatite B e C e HIV.
“É cada vez mais comum atendermos, em consultório ou no serviço público de saúde, adolescentes com ISTs, o que nos preocupa bastante. Daí pensarmos em focar a campanha deste ano em prevenção de ISTs, incluindo a vacinação por HPV”, afirma José Murillo Bastos Netto, coordenador do Departamento de Urologia do Adolescente da SBU.
Um levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgado em julho, aponta uma queda na utilização da camisinha por adolescentes no Brasil.
De 2009 a 2019, o percentual de pessoas entre 13 e 17 anos que usaram preservativo na última relação sexual caiu de 72,5% para 59%. Entre as meninas, a queda foi de 69,1% para 53,5% e, entre os meninos, de 74,1% para 62,8%.
Os dados são um recorte de um estudo experimental da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), que apresenta indicadores comparáveis de estudantes do 9º ano do ensino fundamental.
“A geração atual não viveu o medo da Aids como as gerações passadas, quando havia inúmeras campanhas para uso de preservativo. Devido a essa redução nas campanhas educativas é que estamos observando dados alarmantes como esses”, comenta Netto.
Vacina contra o HPV
O HPV está associado ao câncer de colo de útero, de pênis, de ânus e de orofaringe. O vírus tem uma prevalência mundial estimada em 11,7% e a faixa etária de maior prevalência é entre os menores de 25 anos. Por ser uma doença na maioria das vezes assintomática e com resolução espontânea em até dois anos, muitas pessoas não descobrem ter o problema e transmitem o vírus aos parceiros.
A vacina contra o HPV é ofertada gratuitamente no SUS para meninas entre 9 e 14 anos, desde 2014, e meninos entre 11 e 14 anos, desde 2017. Dados do Programa Nacional de Imunizações (PNI) revelam baixas coberturas vacinais de HPV com as duas doses para ambos os sexos. Enquanto as meninas com duas doses somam 56,2%, os meninos, 36%.
“A população tem pouca informação sobre a vacina e muitos têm medo de efeitos colaterais e de incentivar o início precoce da atividade sexual, por isso é importante promover campanhas para desmistificação da vacinação contra o HPV”, pontua Netto.
Jovens pesquisam sobre educação sexual na internet
Divulgada em agosto, a pesquisa TIC Kids Online 2021, sobre o uso de internet por crianças e adolescentes, apontou que mais de 22,3 milhões de pessoas de 9 a 17 anos acessam o serviço no Brasil.
O estudo, realizado pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil, indica que os jovens usam a internet para pesquisar sobre saúde, inclusive sobre educação sexual.
Os temas mais buscados são: alimentação (55%), prevenção e tratamento de doenças (38%), exercícios e meios para ficar em forma (36%), informações sobre medicamentos (22%) e discussões sobre saúde sexual e educação sexual (21%).
“Observamos com frequência que o jovem tem noções incorretas sobre diversas questões que envolvem a sexualidade. Muitas vezes há algum grau de dificuldade no diálogo dentro do núcleo familiar, e a procura de informações na internet nem sempre ocorre em sites confiáveis com conteúdo adequado e sobretudo fidedigno”, diz Alfredo Félix Canalini, presidente da SBU.
De acordo com a SBU, a consulta com o urologista permite e avaliação de vários quesitos, como o desenvolvimento físico e a nutrição, condições gerais de saúde, noções sobre a higiene correta do corpo e dos órgãos genitais.
Além disso, é possível identificar e orientar medidas preventivas para o desenvolvimento de doenças futuras como os fatores hereditários e comportamentais. Informações sobre o exame testicular ajudam a detectar anormalidades como a varicocele (veias dilatadas nos testículos que podem levar à infertilidade), hérnias, testículos mal descidos e tumores no órgão.