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    Análise: Rússia evita colapso econômico, mas o declínio começou

    Êxodo de empresas ocidentais e sanções punitivas contra as exportações vitais de energia da Rússia e seu sistema financeiro estão tendo um impacto, mas não da maneira que muitos esperavam

    Clare Sebastiancolaboração para a CNN

    Seis meses depois de invadir a Ucrânia, a Rússia está atolada em uma guerra lenta que não previu, mas está tendo sucesso em outra frente – sua economia dependente do petróleo está em profunda recessão, mas se mostra muito mais resiliente do que o esperado.

    “Estou dirigindo por Moscou e os mesmos engarrafamentos estão lá como antes”, diz Andrey Nechaev, que foi ministro da Economia da Rússia no início dos anos 1990.

    A disposição da China e da Índia para comprar petróleo russo barato ajudou, mas Nechaev e outros analistas dizem que a economia do país começou a declinar e provavelmente está enfrentando um período prolongado de estagnação como consequência das sanções ocidentais.

    Na superfície, a situação não mudou muito, exceto algumas vitrines vazias que já abrigaram marcas ocidentais que fugiram do país. O McDonald’s agora é chamado de “Vkusno i tochka”, ou “Saboroso, e é isso” e os cafés da Starbucks estão reabrindo gradualmente sob a marca mal disfarçada Stars Coffee.

    O êxodo de empresas ocidentais, e onda após onda de sanções ocidentais punitivas contra as exportações vitais de energia da Rússia e seu sistema financeiro, estão tendo um impacto, mas não da maneira que muitos esperavam.

    Nechaev, que presidiu alguns dos períodos econômicos mais turbulentos da Rússia e ajudou a conduzir sua transição para uma economia de mercado, credita parte disso ao banco central.

    O rublo caiu para uma baixa recorde em relação ao dólar americano no início deste ano, após a invasão, quando o Ocidente congelou cerca de metade das reservas russas de US$ 600 bilhões em moeda estrangeira. Mas voltou ao seu nível mais forte em relação ao dólar americano desde 2018.

    Isso é em grande parte o resultado de controles de capital agressivos e aumentos de juros na primavera, muitos dos quais já foram revertidos. As taxas de juros agora estão mais baixas do que antes da guerra, e o banco central diz que a inflação, que atingiu quase 18% em abril, está desacelerando e ficará entre 12% e 15% durante todo o ano.

    O banco central também revisou para cima sua previsão do Produto Interno Bruto (PIB) para o ano e agora espera que ele encolha de 4% a 6%. Em abril, a previsão era de contração de 8% a 10%. O Fundo Monetário Internacional (FMI) também prevê agora um recuo de 6%.

    Ajudou que o Kremlin tivesse oito anos para se preparar para esse cenário, estimulado pelas sanções que o Ocidente impôs depois que Moscou anexou a Criméia em 2014.

    “A saída da Mastercard, da Visa, teve pouco impacto nos pagamentos domésticos porque o banco central tinha seu próprio sistema alternativo de pagamentos”, diz Nechaev. A Rússia configurou o cartão de crédito Mir e seu próprio sistema de processamento de transações em 2017.

    E há uma razão pela qual os fãs russos do McDonalds e da Starbucks ainda conseguem obter sua dose de fast-food, afirma Chris Weafer, sócio-fundador da Macro Advisory, uma consultoria que assessora empresas multinacionais na Rússia e na Eurásia.

    Desde 2014, muitas marcas ocidentais na Rússia cederam à pressão do governo e regionalizaram algumas ou todas as suas cadeias de suprimentos. Assim, quando essas empresas foram embora, foi relativamente fácil para os compradores russos adquiri-las e continuar administrando-as simplesmente trocando o invólucro e a embalagem.

    “Mesmas pessoas, mesmos produtos, mesma oferta”, diz Weafer. Não é uma estratégia totalmente estanque, no entanto.

    As lojas renomeadas do McDonald’s relataram uma escassez de batatas fritas em meados de julho, quando a colheita de batatas da Rússia ficou aquém do esperado, e os fornecedores estrangeiros não preencheram a lacuna devido às sanções.

    O boom energético da Rússia pode continuar?

    A continuidade do fast food é uma coisa. A estabilidade de longo prazo da Rússia depende de seu setor de energia, ainda de longe a maior fonte de receitas do governo.
    Dizer que os altos preços da energia até agora ajudaram a Rússia seria um eufemismo.

    A Agência Internacional de Energia (AIE) diz que as receitas do país com a venda de petróleo e gás para a Europa dobraram entre março e julho deste ano, em comparação com a média dos últimos anos. Isso apesar dos volumes em declínio. Os dados da IEA mostram que as entregas de gás para a Europa caíram cerca de 75% nos últimos 12 meses.

    O petróleo é uma questão diferente. A previsão de março da AIE de que 3 milhões de barris por dia de petróleo russo sairiam do mercado a partir de abril por causa de sanções, ou a ameaça delas, não se concretizou. As exportações se mantiveram, embora os analistas da Rystad Energy observem uma ligeira queda durante o verão.

    O principal fator tem sido a capacidade da Rússia de encontrar novos mercados na Ásia.

    De acordo com Houmayoun Falakshali, da consultoria de commodities Kpler, a maior parte das exportações marítimas de petróleo da Rússia foi para a Ásia desde o início da guerra. Em julho deste ano, a participação era de 56%, ante 37% no mesmo mês de 2021.

    Entre janeiro e julho deste ano, a China aumentou em 40% suas importações marítimas de petróleo russo dos Urais com grande desconto, em comparação com o mesmo período do ano passado, segundo dados da Kpler. Isso apesar dos esforços iniciais da China para evitar a aparência de tomar partido na guerra contra a Ucrânia.

    As importações marítimas da Índia aumentaram mais de 1.700% no mesmo período, de acordo com a Kpler. A Rússia também vem aumentando as exportações de gás para a China por meio de um oleoduto siberiano.

    Mas ainda resta saber o que acontecerá quando o embargo da Europa a 90% do petróleo russo entrar em vigor em dezembro. Estima-se que 2 milhões de barris por dia de petróleo russo estarão no limbo e, embora seja provável que parte disso vá para a Ásia, os especialistas duvidam que a demanda seja alta o suficiente para absorver tudo.

    Falakshali diz que a China não pode comprar muito mais petróleo russo do que a quantidade atual por causa de uma desaceleração doméstica na demanda e porque simplesmente não precisa de muito mais do tipo específico de petróleo que a Rússia exporta.

    O preço também desempenhará um papel crítico para saber se a Rússia pode se dar ao luxo de continuar com descontos para atingir novos mercados.

    “Um desconto de 30% a partir de US$ 120 o barril é uma coisa”, aponta Nechaev. “Um desconto partindo de US$ 70 é outra questão”.

    “Queima mais lenta”

    Enquanto a inflação global está ajudando o setor de energia da Rússia, ela está prejudicando seu povo. Assim como o resto da Europa, os russos já estão sofrendo uma crise de custo de vida, agravada pela guerra na Ucrânia.

    Nechaev, que ajudou a conduzir a Rússia através de um colapso econômico muito mais dramático na década de 1990, está preocupado.

    “Em termos de padrão de vida, se você medir pela renda real, retrocedemos cerca de 10 anos”, diz ele.

    O governo russo está gastando para tentar combater isso. Em maio, anunciou que aumentaria as pensões e o salário mínimo em 10%.

    A Rússia está montado um sistema onde os funcionários das empresas que “suspenderam suas atividades” podem se transferir temporariamente para outro empregador sem quebrar o contrato de trabalho.

    O país também está gastando 17 bilhões de rublos, ou US$ 280 milhões, comprando títulos de companhias aéreas russas, prejudicadas por proibições de espaço aéreo e sanções que impedem a manutenção e o fornecimento de peças por fabricantes estrangeiros.

    São as sanções tecnológicas, como as que afetam o setor aéreo, que podem ter o impacto mais profundo nas perspectivas econômicas de longo prazo da Rússia. Em junho, a secretária de comércio dos Estados Unidos, Gina Raimondo, disse que as exportações globais de semicondutores para a Rússia caíram 90% desde o início da guerra.

    Isso está prejudicando a produção de tudo, de carros a computadores, e, afirmam os especialistas, a deixará ainda mais para trás na corrida tecnológica global.

    “O impacto das sanções será mais uma queima mais lenta do que um golpe rápido”, diz Weafer. “A Rússia está agora olhando para potencialmente um longo período de estagnação.”

    Nechaev é ainda mais definitivo. “Neste momento, o declínio econômico começou”, avalia.

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