Irã nega ligação com ataque a Salman Rushdie e culpa próprio autor
Escritor indiano foi jurado de morte pelo líder supremo iraniano em 1989
O Irã negou qualquer ligação com o esfaqueamento de Salman Rushdie e culpou o autor e seus apoiadores pelo ataque que o deixou com ferimentos que mudaram sua vida.
“Em relação ao ataque a Salman Rushdie, não consideramos ninguém além de [Rushdie] e seus apoiadores dignos de culpa e até de condenação”, disse o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Irã, Nasser Kanaani, em entrevista coletiva televisionada nesta segunda-feira (15), marcando a primeira reação pública do país ao ataque.
“Não vimos mais nada sobre o indivíduo que realizou esse ato além do que vimos da mídia americana. Negamos categoricamente e seriamente qualquer conexão do agressor com o Irã”, disse Kanaani, segundo a mídia estatal iraniana.
Rushdie, um aclamado autor britânico nascido na Índia, recebeu ameaças de morte por décadas depois que o Irã emitiu uma fatwa, ou decreto religioso, pedindo sua morte após o lançamento em 1988 de seu livro “Os Versos Satânicos”.
Ele passou quase uma década vivendo sob proteção britânica antes de se mudar para os Estados Unidos nos últimos anos e foi repetidamente esfaqueado durante um ataque no palco no oeste de Nova York na sexta-feira.
O suspeito, identificado como Hadi Matar, de 24 anos, de Fairview, Nova Jersey, se declarou inocente no sábado de tentativa de homicídio em segundo grau e outras acusações.
Embora o Irã não tenha comentado oficialmente o ataque no fim de semana, vários jornais iranianos de linha dura elogiaram o suspeito no sábado – incluindo o jornal conservador Kayhan, cujo editor-chefe é nomeado pelo líder supremo, Ali Khamenei.
“Mil bravos, cem Deus abençoe. Sua mão deve ser beijada…Bravo para o guerreiro e homem obediente que atacou o apóstata e perverso Salman Rushdie. A mão do guerreiro deve ser beijada. Ele rasgou a veia do pescoço de Rushdie”, disse o jornal.
Outro jornal de linha dura, Khorasan, publicou uma manchete, “O Diabo no Caminho para o Inferno”, enquanto mostrava uma foto de Rushdie em uma maca.
Rushdie – filho de um empresário muçulmano de sucesso na Índia – foi educado na Inglaterra, primeiro na Rugby School e depois na Universidade de Cambridge, onde recebeu um mestrado em história.
A publicação dos “Versos Satânicos” em 1988 o transformou em um nome familiar e lhe trouxe notoriedade. O líder iraniano, o aiatolá Ruhollah Khomeini, emitiu a fatwa contra ele um ano depois.
A recompensa contra Rushdie nunca foi levantada, no entanto, em 1998, o governo iraniano procurou se distanciar da fatwa prometendo não tentar executá-la.
Mas em fevereiro de 2017, o líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, reafirmou o decreto religioso.
E em 2019, Khamenei tuítou dizendo que a fatwa de Khomeini contra Rushdie era “sólida e irrevogável”, levando o Twitter a colocar uma restrição em sua conta.
Lauren Said-Moorhouse, da CNN, contribuiu para esta reportagem.