Akie Abe, viúva de Shinzo Abe, moldou um novo padrão para primeiras-damas no Japão
Conhecida no país pelas visões progressistas, ela ficou conhecida como "partido de oposição doméstico" de Shinzo Abe
Quando Akie Matsuzaki casou-se com Shinzo Abe, que era naquela época um auxiliar político em ascensão, em 1987, ela seguiu um caminho bem pavimentado por esposas japonesas e abriu mão de seu emprego na maior agência de publicidade do país.
Mas após mais de três décadas de casamento – nove deles sendo a primeira dama do Japão – ela se provou ser qualquer coisa menos uma esposa de político convencional.
No Japão, Akie Abe é conhecida por sua visão extrovertida e progressista. Ao contrário de suas antecessoras, ela se recusou a ficar na sombra de seu marido. Ao invés disso, a socialite construiu um papel público para si mesma, de uma maneira similar às primeiras damas americanas.
Akie Abe, de 60 anos, tornou-se viúva na sexta-feira (8), após o ex-primeiro-ministro ter sido fatalmente baleado à luz do dia enquanto discursava na cidade de Nara, um assassinato que chocou e enfureceu a nação.
Na sexta-feira, ela fez uma longa viagem de trem para correr para o lado de seu marido em um hospital em Nara. No dia seguinte, trouxe seu corpo de volta para casa em Tóquio de carro. Na segunda-feira (11), ela o velou ao lado de convidados e da família em uma cerimônia privada no tempo Zojo-ji.
Ao longo dos últimos dias, Akie Abe permaneceu composta e silenciosa quando aparecia em público.
Na terça-feira (12), ela será a anfitriã de um funeral privado, que deve ser seguido de cerimônias maiores em um momento posterior.
Após seu marido ter renunciado como primeiro-ministro em dezembro de 2020, Akie Abe desapareceu da vida pública. Agora, ela foi jogada de volta aos holofotes – e a nação está olhando para ela enquanto está enlutada pela morte de seu ex-líder.
“Partido de Oposição Doméstica” de Abe
“Akie Abe – como primeira-dama – foi certamente diferente de muitas de suas antecessoras”, disse Tobias Harris, pesquisador sênior sobre Ásia no Centro para o Progresso Americano.
Seu apoio a causas progressistas, maneiras desinibidas e confiança alegre a tornaram querida pelo povo japonês.
Entre a mídia japonesa, Akie Abe recebeu um apelido – de “partido de oposição doméstico” de Shinzo Abe.
Com uma propensão a falar o que pensa, ela desafiou abertamente uma série de políticas de seu marido, desde a pressão pela energia nuclear até o acordo comercial da Parceria Transpacífico.
Em 2016, ela encontrou manifestantes em Okinawa que se opunham à expansão de uma base do Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos, apoiada por Shinzo Abe.
“Eu quero identificar e levar as visões que não chegam a meu marido ou seu círculo”, disse ela à Bloomberg em 2016. “Se parece um pouco com um partido de oposição, eu suponho”.
Suas visões progressistas às vezes aparentam contrariar valores mais conservadores.
Akie Abe apoia e faz campanhas pelos direitos LGBTQ+, se juntando à parada do orgulho LGBTQ+ em Tóquio em 2014. Ela também apoia o uso da maconha medicinal, e posou para fotos em campos de plantação de cannabis em 2015.
Akie Abe também se envolveu em controvérsias ocasionais, incluindo um escândalo sobre um negócio obscuro de venda de terras envolvendo uma escola nacionalista com a qual ela tinha ligações.
Apesar de suas visões frequentemente opostas, o casal tinha um relacionamento amoroso – e Akie Abe não tinha vergonha de deixar o público saber. O casal muitas vezes segurou as mãos desembarcando de aviões em viagens oficiais – uma demonstração de afeto raramente vista nos círculos políticos japoneses.
Shinzo Abe aparecia frequentemente nas publicações no Instagram da esposa, sorrido ao seu lado em eventos ou caminhadas cotidianas, fazendo carinho em seu cachorro no sofá, ou lendo o jornal no carro.
Em seu aniversário de 30 anos de casamento, Akie Abe postou uma foto da cerimônia com os dois usando kimonos. Em seu 32° aniversário, celebraram com um bolo de cereja e vinho.
Ela foi a primeira esposa de um ministro japonês a usar as redes sociais ativamente, principalmente o Facebook e o Instagram, compartilhando trechos da sua vida com dezenas de milhares de seguidores.
Sua própria pessoa
Filha de um magnata da confeitaria, Akie Abe cresceu em uma família rica e privilegiada em Tóquio.
Ela foi educada em uma escola particular católica e em uma escola vocacional apenas para mulheres, e fala inglês fluentemente.
Depois de se formar, Akie Abe trabalhou na agência de publicidade japonesa Dentsu. Aos 22 anos, conheceu Shinzo Abe, que era sete anos mais velho e trabalhava como político assistente. Eles namoraram por dois anos antes de oficializar a união em 1987.
O casal nunca teve filhos. Akie Abe disse à mídia japonesa que buscaram tratamentos de fertilidade no início do casamento, sem sucesso.
Akie Abe não estava satisfeita sendo confinada a um trabalho doméstico. Ela trabalhou como DJ em uma rádio na década de 1990, e após seu marido renunciar de seu posto como primeiro-ministro em 2007, ela planejou abrir um pub izakaya.
“Quando (Shinzo) Abe estava ansioso para voltar à liderança em 2012, foi no mesmo momento quanto ela se preparava para abrir um restaurante. Era algo que ela queria fazer a algum tempo, e pensou que com Shinzo Abe fora do poder em 2007, ela teria essa oportunidade finalmente”, disse Harris, o autor de “O Iconoclasta: Shinzo Abe e o Novo Japão” (sem edição em português).
“So she made him promise she would still be able to open her business and she went ahead with it and it was a really nice restaurant.”
“Então ela o fez prometer que ela ainda poderia abrir seu negócio. Ela insistiu e abriu um restaurante muito bom.”
O izakaya, chamado “UZU” – que significa “hidromassagem” em português –, foi aberto em 2012 no distrito de Kanda, em Tóquio, meses antes de Shinzo Abe começar seu segundo mandato como primeiro-ministro.
Ela até mesmo plantava seu próprio arroz orgânico, em um arrozal localizado perto da prefeitura natal de seu marido, e servia em seu restaurante.
Em 2015, ela foi fotografada em um arrozal plantando arroz com a então embaixadora dos EUA no Japão, Caroline Kennedy, vestindo calças de trabalho femininas tradicionais, descalça na água turva.
Nos anos antes de ela voltar ao cargo de primeira-dama, Akie Abe voltou para a faculdade e obteve um mestrado em estudos sociais da Universidade de Rikkyo.
“Esse foi um período de dificuldades e frustrações para nós como casal”, ela disse ao Wall Street Journal em 2013. “Depois de algum tempo, ele decidiu focar em sua carreira política, e eu senti a necessidade de ter minha própria vida”.
“Isso mostra que ela realmente tentou – ao longo da carreira política do marido – ser si mesma, e não apenas uma esposa de político que apareceria e faria tudo o que é esperado de esposas de políticos do Japão”, disse Harris.
“Eu não acho necessariamente que ela estava feliz, ou mesmo ansiosa, para ter esse papel.”