No coração da Amazônia: as maravilhas do Parque Nacional de Anavilhanas

Enquanto hotéis sustentáveis nos ajudam a descansar em meio à natureza, passeios de barco e trilhas pela mata nos revelam as potentes belezas naturais da floresta. Bem-vindos à selva!

Daniela Filomenodo Viagem & Gastronomia , Parque Nacional de Anavilhanas, AM

Os pássaros cantam aos montes quando os primeiros raios de sol se infiltram de fininho em meio à mata verde, assim como o coaxar dos sapos forma um coro quando cai a noite quente e estrelada. Com os sentidos aflorados, sentimos a temperatura da floresta em nossa pele, respiramos ar puro com cheirinho de terra e, talvez o mais importante, temos a oportunidade de nos desligarmos de uma vida corrida e apreciar a serenidade que a selva nos dá.

Assim é estar no meio da Amazônia, mais especificamente no Parque Nacional de Anavilhanas, segundo maior arquipélago fluvial do mundo. É como o coração da mata e da água que se estende por 100 km numa área de 350 mil hectares preenchida por 400 ilhas. Sob responsabilidade do ICMBio, a porta de entrada da área fica em Novo Airão, município distante cerca de duas horas e meio de carro – ou 50 minutos de hidroavião – da capital Manaus.

Durante as gravações do CNN Viagem & Gastronomia na Amazônia, acabei saindo da capital amazonense após uma imersão na gastronomia e na hotelaria local para dar início a uma outra jornada mais ligada à floresta.

A partir de hidroavião, em que é possível olhar o emaranhado de ilhas lá de cima, pude aterrissar nas águas do Rio Negro e vislumbrar uma aventura no Parque Nacional de Anavilhanas que carrega apenas predicados: cenários inesquecíveis, hotéis sofisticados integrados à natureza, observação de animais, passeios de barco, trilhas, contato com as raízes indígenas e um merecido descanso.

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Digo que estar na floresta amazônica é como nos reapropriarmos do que é nosso: o zelo com o meio ambiente e a conexão com aquilo que realmente importa são questões que prevalecem aqui, em especial o cuidado com o nosso território – que é muito sensível. Entre areias brancas, rios, matas, sombra e água fresca, a Amazônia, para mim, é um dos lugares mais especiais do Brasil. E estar no meio da selva é isso: brincar com as sensações e trazê-la para dentro de nós com todos seus ensinamentos.

Além de experiências incríveis, este turismo de imersão nos proporciona um contato íntimo com a natureza ao mesmo tempo que nos ensina a respeitá-la. O turismo sustentável e consciente é uma das formas em que exigimos que tudo isso seja preservado. Assim, me acompanhe nesta viagem especial e descubra um dos cantos mais especiais do nosso país.

Onde ficar: hotéis de selva imperdíveis

A porta de entrada para uma das partes mais belas da Floresta Amazônica e do Parque Nacional de Anavilhanas é Novo Airão, município de apenas 20 mil habitantes que fica na margem direita do Rio Negro. Por aqui, a mata também é lar de hotéis sofisticados que unem o melhor da região: uma gastronomia ímpar e um contato íntimo com a fauna e a flora.

O mais importante é que eles se unem com a floresta de uma maneira respeitosa e ainda geram renda, empregos, apoio e conscientização – em que preconizam a mão de obra local junto de seus conhecimentos.

Anavilhanas Jungle Lodge

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Às margens do Rio Negro, a 180 km de Manaus, está o Anavilhanas Lodge, um refúgio exclusivo na selva que fica bem em frente ao Parque Nacional de Anavilhanas. Caso chegue por aqui pelo próprio rio, é curioso notar as marcações das cheias na escada de madeira – o recorde foi atingido no ano passado, em que a água chegou praticamente até os últimos degraus.

Construído em madeira, quase não vemos o hotel de fora até encontrarmos o quarto, já que está camuflado em meio ao verde ao redor. Divididos em chalés, bangalôs e panorâmicos, cada quarto corresponde a um animal amazônico: o escolhido para mim foi o tucunaré, um dos peixes mais marcantes da região. Bem iluminadas e com uso de tons brancos que mesclam com a madeira, as acomodações são como casas na árvore.

É uma verdadeira imersão na floresta, onde a varanda e até o banho ficam ao lado da flora. O interessante é que o hotel surgiu da necessidade de se ter uma boa estrutura no meio da Amazônia que conectasse as pessoas aos principais pontos da floresta, como me conta o sócio-fundador Guto Costa Filho. O local nasceu como uma boa oportunidade para os visitantes conhecerem este pedaço do Brasil que está presente no imaginário coletivo mundial.

Com a consciência de não trazer impactos negativos ao meio ambiente, o hotel também se entende como um facilitador de experiências. E aqui são dois os programas principais: ou curtimos o próprio hotel ou entramos na floresta – a dica é tentar ter um equilíbrio entre eles! Vale ressaltar que os pacotes – de mínimo dois dias – contemplam transfers terrestres a partir de Manaus, pensão completa e passeios pelas redondezas (que dependem da duração da estadia).

A estrutura principal conta com piscina de borda infinita, biblioteca, academia, redário, um mirante de cerca de 13 metros de altura – de onde temos vistas privilegiadas para o rio e o arquipélago – e um deck flutuante disposto no rio. A internet está inclusa, mas funciona nas áreas comuns e pode oscilar – já que estamos literalmente no meio da floresta.

Um dos pontos altos também é a gastronomia: por aqui, as refeições são caprichadas com o uso de ingredientes locais. Arroz de pato com tucupi, jambu e jirimum caboclo, ceviche de tucunaré, pastéizinhos envoltos numa farinha panco – crocante por fora e supercremoso por dentro – e mil folhas de cupuaçu são algumas das pedidas deliciosas.

Mirante do Gavião

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Já mais próximo à cidade, mas ainda às margens do Rio Negro, o Mirante do Gavião é um hotel de selva de arquitetura impressionante: seu design é original e harmoniza com a mata ao redor, em que os quartos têm forma de barco invertido que lembram casas na árvore – há até passarelas suspensas para viabilizar o manejo sustentável do solo.

Digo que é uma acomodação dos sonhos para quem deseja conhecer a exuberância da Amazônia. Integrado à natureza, o hotel possui apenas 12 suítes e é construído com madeira de lei certificada. Como o nome sugere, as vistas do hotel são espetaculares. A piscina tem visão para o rio e fica encravada na floresta (melhor aproveitada ao lado de um gim de maxixe!); o espaço wellness dialoga totalmente com a proposta de se estar em meio à floresta e ainda há mirantes que dão para o Rio Negro e para a selva que fazem total diferença na experiência – um deles chega a ter 15 metros.

Além de todos os atributos, o que me chama mais a atenção no Mirante é que ele não é apenas um local de hospedagem, mas sim um projeto que engloba a floresta, seus conhecimentos e seu povo. A propriedade opera sob o conceito de ser um agente transformador da cidade, trazendo para perto essa mensagem do ecoturismo como uma fonte econômica sustentável por excelência.

Aqui, os sabores amazônicos são igualmente fascinantes: o Camu-Camu, restaurante do hotel de cardápio assinado pela chef Débora Shornik, do Caxiri, em Manaus, faz um trabalho admirável com ingredientes locais, como o caldo do tucupi, o tambaqui, tapiocas e o uso predominante de frutas regionais, como jambu, cupuaçu, caju, graviola ou taperebá. O café da manhã também é caprichado, em que o que mais gosto é dadinho de tapioca – crocante, saborosa e só leva três ingredientes. Ficou com vontade? Aprenda a receita superfácil aqui.

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Uma das vantagens do Mirante é que, como fica mais próximo à cidade, temos a comodidade de sairmos para outros bares e locais pelas redondezas. Uma dessas opções é o Flor do Luar, restaurante flutuante em que podemos chegar também por meio de voadeira. Na simpática casa, é servido um delicioso bolinho de pirarucu com pimentinha de tucupi que casa muito bem com uma cerveja local, a Sarapó. É como um happy hour amazônico!

Juma Amazon Lodge

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Outro hotel de selva que se destaca na região é o Juma Lodge, irmão do Juma Ópera na capital Manaus. O hotel, porém, não fica em Novo Airão, mas sim em Autazes, cidade de cerca de 30 mil habitantes a 100 km ao sudeste da capital. Recluso no meio da floresta, ele fica em uma área preservada de 7 mil hectares às margens do Rio Juma.

São 19 bangalôs que formam um complexo, construídos em palafitas na copa das árvores que oferecem vistas excelentes da fauna e da flora local – é impressionante ver como a paisagem muda no período da cheia, em que a água encobre as palafitas, em comparação com o período da seca, em que as acomodações parecem casas nas árvores.

O espaço conta ainda com piscina de rio, restaurante, decks e redário, além de possuir um museu que reúne uma série de informações sobre a região. Uma torre de observação de 30 metros de altura para contemplar os pássaros e a floresta de cima está prevista para este ano. Programações especiais, como atividades na mata, no rio e em prol do reino animal também são destaques por aqui.

Atividades na natureza

Quando falamos em Amazônia, uma das principais atividades por aqui é justamente este turismo de imersão na natureza – sempre com princípios de respeito e entendimento do nosso redor. Digo que a floresta é um chamado para fazermos um turismo sustentável e vivenciar uma experiência que nos deixa com os sentidos à flor da pele.

Curioso é notar que muitos brasileiros não conhecem a Amazônia ou não não possuem informações sobre seu acesso e turismo, ao contrário de muitos estrangeiros que desembarcam por aqui e ficam encantados com nossa biodiversidade. E repito: o turismo sustentável e consciente é uma das formas em que exigimos que tudo isso seja preservado.

Botos-cor-rosa, passeio de barco e praias de rio

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O Parque Nacional de Anavilhanas foi instituído com o objetivo de preservar o arquipélago fluvial de mesmo nome. O local, sob responsabilidade do ICMBio, tem foco em harmonizar a relação das comunidades da região com ações sustentáveis – não é cobrada taxa nem autorização para entrarmos no parque.

Assim, um dos principais atrativos do parque é a interação com os botos-cor-rosa, ou botos-vermelhos, moradores das águas daqui. Eles são os maiores golfinhos de água doce do mundo, em que chegam a ter 2,5 metros e 200 kg de peso!

Os hotéis de selva de Novo Airão mencionados acima oferecem passeios de barco que nos levam até pontos estratégicos para avistá-los de forma próxima, sempre com cautela e sem interferir em seu ecossistema . Na orla do município, inclusive, há o Flutuante dos Botos, onde podemos interagir com os carismáticos mamíferos aquáticos.

Os passeios de barco são bem comuns – brinco que o Rio Negro é como uma rodovia no Amazonas – e, geralmente, os barcos dos hotéis também chegam a oferecer refeições caprichadas a bordo. O calor desta região, em que as temperaturas médias anuais beiram os 27°C, faz com que tenhamos uma vontade imensa de pular nestas águas caudalosas para nos refrescarmos – foi o que fiz!

No caminho pelas águas do Rio Negro, o mais interessante é apreciar a vegetação – se viermos em épocas diferentes, conseguimos contemplar paisagens completamente distintas: na seca, vemos praias; no período da cheia, vemos a floresta alagada e os vários braços de água em que entramos de bote. É impactante notar os movimentos do rio e vê-lo realmente como algo vivo.

Assim, vale ressaltar que todas as épocas na Amazônia são especiais, mas possuem diferenças que contam na hora de planejar uma viagem. Com um clima bem quente e úmido o ano todo, o período entre junho e novembro é um pouco menos chuvoso, época em que aparecem as praias de areia branca pelo arquipélago. Já de dezembro a maio chove um pouco mais e podemos navegar pelos igapós – a floresta inundada, um cenário incrível para visitação.

Na seca, época em que pus os pés por aqui, não pensei duas vezes e também fiquei encantada com a formação das “praias”, com suas areias brancas e a água do rio – que parece um grande mar – logo em frente. É uma boa maneira de passar uma manhã ou tarde agradável com sombra e água fresca, onde se banhar acaba virando quase que uma necessidade por conta da temperatura.

Trilhas, ensinamentos e Grutas do Madadá

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A partir de Novo Airão, subimos o Rio Negro através de voadeira num percurso de cerca de 50 km para cima da cidade, sempre acompanhados de um guia experiente – fácil de contratar nos hotéis e na cidade.

Já em terra firme, nas margens do rio, nos deparamos com formações rochosas de milhares e milhares de anos, as quais são chamadas de “pedra-sanduíche“. É um prenúncio do que vamos encontrar mais pela frente, em que parece que foram colocadas à mão uma em cima da outra – elas são formadas de areia petrificada, em que a argila serve como uma cola para a areia e, ao longo do tempo, dá esse caráter às pedras.

A partir daqui, na mata, começamos a fazer uma trilha de cerca de uma hora até as Grutas do Madadá. No meio da selva, é admirável contemplar toda a beleza da Amazônia e a força da natureza, com suas raízes e troncos, além de vislumbrarmos o fenômeno do igapó, quando imaginamos tudo isto alagado.

No meio do caminho, mais aprendizados: sabia que há uma formiga que, ao espalhá-la pelo nosso corpo, vira um repelente natural? É a tapiba, que possui um cheiro cítrico. Perto de seus ninhos, batemos palma, em que elas saem aos montes, e estendemos as mãos para que subam em nosso corpo e, assim, para que possamos passá-las pelos braços. É, no mínimo, surpreendente!

Depois de vários minutos na selva, outro ensinamento: se cortarmos um cipó com um facão na perpendicular temos água fresca para tomar em caso de muita sede.

Também nos deparamos com uma formiga tucandeira, que é importante em rituais indígenas da passagem da adolescência para a vida adulta. Grande, em que chega a ter 22 milímetros de tamanho, é uma das maiores formigas da região e sua picada é extremamente dolorida. Melhor observá-la de longe e tomar certo cuidado! Logo, estar aqui é entender as dinâmicas naturais e sair transformado pelos seus encantos.

Após uma hora, chegamos às famosas grutas, que são dois conjuntos compostos por blocos de arenito de cerca de 700 milhões de anos. A primeira das grutas é menor, mas também carrega seu charme. Elas são nomeadas por números (1 e 2), mas tem quem chame a primeira de Gruta do Macaco – pela semelhança com o primata.

As grutas formam um cenário surpreendente e até fotogênico, em que nos fazem refletir sobre o tempo na natureza e nosso período como seres humanos na Terra. Entremeado de vegetação, o local oferece uma bela visão das rochas, sendo também um espaço único para contemplação da flora, da fauna e de paisagens naturais.


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