Vinho premiado e feijoada de Janaína Torres: o melhor do Brasil à mesa
A Casa Tés desponta como uma vinícola que promete colocar a qualidade brasileira no radar internacional e, ao mesmo tempo, a melhor chef do mundo cozinha novos projetos



Abraçando São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, a Serra da Mantiqueira é uma verdadeira joia brasileira que vai além do turismo de natureza e da desconexão. O conjunto de montanhas, vales e picos esconde cidadezinhas charmosas que esbanjam um rico patrimônio cultural, com destaque para os seus sabores.
Pense em cafés, azeites e queijos como alguns dos produtinhos mais deliciosos desta terra. Mas vou além: o clima ameno, a variação de altitude, o solo e, claro, as pessoas, resultam em vinhos premiados, que têm chamado a atenção do cenário internacional.
Foi na Casa Tés, uma das vinícolas mais especiais e recentes da Mantiqueira, que mergulhei na região com a temporada especial CNN Viagem & Gastronomia: Sabores do Brasil.
Por aqui, pude apreciar um pouquinho dos sabores do Sudeste em um almoço confeccionado por ninguém menos que Janaína Torres, eleita a melhor chef do mundo, em que duas grandes paixões comungaram à mesa: feijoada e vinho.
Casa Tés e o Vale da Grama

Quando um dos maiores conhecedores e produtores de vinho do mundo dirige seu olhar a um projeto brasileiro de vitivinicultura, também devemos analisar a proposta com carinho. Falo de Pierre Lurton, por trás do Château Cheval Blanc e do Château d’Yquem, de peso imensurável na produção de vinhos em Bordeaux.
Amante do Brasil, Pierre ficou surpreendido com a qualidade da produção na Mantiqueira e atua como um padrinho, ou melhor, um consultor informal da Casa Tés. A vinícola nasceu em 2017 no Vale da Grama, que é marcado por um terreno acidentado, rochoso e com falésias de granito na cidadezinha de São Sebastião da Grama.
Fundada pelo advogado Pedro Testa, por aqui só são plantadas Cabernet Franc, Merlot, Cabernet Sauvignon, Sauvignon Blanc e Sémillon. E foi apenas no ano passado que os vinhos da casa começaram a ser vendidos e apresentados.
“A estrela desse projeto é a uva, não sou eu, não é a vinícola e nem o tanque de concreto. É o lugar, é a natureza”, diz Pedro enquanto tiramos algumas taças dos tanques e vamos brincando com possibilidades de blends. Apaixonado pelos grandes vinhos de Bordeaux, em especial o Cheval Blanc, ele não esconde que quer produzir os melhores rótulos do país.
E os frutos já têm caído do pé: na semana passada, o tinto Casa Tés 2022, um corte de Cabernet Franc e Merlot, foi o único brasileiro que entrou para a lista dos melhores vinhos do mundo na visão dos sommeliers mais respeitados do mercado. Ele aparece ao lado de grandes nomes da França, Itália, Espanha e da Argentina na seleção World’s Best Sommeliers’ Selection 2025.
Dedicação e um pouco de “loucura”

O rótulo faz parte da produção de vinhos de colheita de inverno da casa. A propriedade está entre 950 e 1.300 metros acima do nível do mar, onde a amplitude térmica ajuda no terroir.
“Aqui não tem geada, uma vez que temos vento. Além disso, temos amor, mas também um pouco de loucura”, brinca Pedro ao falar do pontapé do projeto. Ele demonstra ainda que a qualidade prezada pela vinícola tem um fator humano envolvido no processo.
“Este lugar em 2024 teve um clima perfeito. Mas também melhoramos muita coisa no campo. Trouxemos, por exemplo, mulheres para trabalhar com os maridos, o que melhorou muito a qualidade do processo e da produtividade, assim como a atenção ao detalhe”, diz.
O Casa Tés 2022, por exemplo, foi descrito pela seleção dos sommeliers como um “tinto poderoso” que exala frutas vermelhas, cerejas, ervas aromáticas e folhagem verde. O vinho passa pelo processo de maceração a frio, a 7°C, por cinco dias. É vinificado em tanque de concreto a 22°C e passa por estágio em barricas de carvalho francês por cerca de 12 meses.
O resultado, segundo a avaliação, é uma “intensidade média, acidez alta, taninos granulados, corpo cheio e final mineral”, caindo bem com carne e vegetais com pimenta do reino ou ainda com pizza de espinafre e bacon. Mas, na data da minha visita, uma outra harmonização deu conta do recado.
Almoço “à brasileira”
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Daniela Filomeno, Janaína Torres e Pedro Testa se reúnem para feijoada, receita que conquistou o Brasil ao longo dos séculos • CNN Viagem & Gastronomia
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Janaina Torres veste camisa de seu novo projeto, o "À Brasileira", e prepara uma feijoada para o CNN Viagem e Gastronomia: Sabores do Brasil • CNN Viagem & Gastronomia
Minha ida à vinícola encerrou com chave de ouro a busca pelos sabores do Sudeste. Para brindar essa andança, uma feijoada feita por ninguém menos do que a melhor chef do mundo, Janaína Torres, coroou a experiência.
Ela, que retomou as rédeas do Bar da Dona Onça e ainda é coproprietária da Casa do Porco, do Hot Pork, do Merenda da Cidade e da Sorveteria do Centro, todos no centro da capital paulista, separou um tempinho para celebrar a cozinha brasileira ao meu lado.
“Existem várias formas e interpretações sobre a feijoada. Ela vem da Europa, passa pela África e chega no Brasil, quando se torna um prato único”, comenta a chef. O cheirinho vai subindo, e o trabalho primoroso vai dando as caras.
“Minha feijoada torna-se mais acessível pelo fato de eu não comprar nada industrializado. São todos produtos muito frescos. É uma alquimia. É devagar, é aos poucos”, explica.
O caldinho que fumega da panela é um bom abre alas para o que vem a seguir. Com uma concha, ela despeja o líquido em uma cumbuca e finaliza com um pingo de cachaça, jeitinho “à la Janaína”.
Essa é uma palinha do novo projeto que a chef vem desenhando há um tempo, o “À Brasileira”, que visa mostrar para o mundo a filosofia e a arte de viver à brasileira. Durante viagens internacionais, Jana, como é chamada pelos íntimos, sempre fez questão de cozinhar o que tinha à disposição tanto para outros chefs quanto para as equipes. As pessoas então clamavam pela comida feita “pela brasileira”.
No fim, sentar à mesa e degustar a feijoada de Janaína com os vinhos de Pedro, uma combinação inusitada, foi como testemunhar um pouco do sabor do Brasil, que defino como uma comunhão em volta do alimento e dos bons momentos.
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