Harmonização com café? Especialistas dão dicas de combinações que funcionam

Que tal ir além do cafezinho com pão de queijo? Experts dão dicas de como harmonizar a bebida tão apreciada pelos brasileiros

Fábio Galibcolaboração para o Viagem & Gastronomia

Um pouco a mais de acidez em um vinho branco permite que ele intensifique os sabores de um prato sutil. Para um tinto com alto teor de taninos, uma carne mal passada faz ótima parceria por moderar nossa percepção deles. As harmonizações gastronômicas são assim, ajudam a escolher alimentos e bebidas que formam o casamento perfeito, revelando a plenitude dos aromas e sabores de cada um. Mas não é só nas manjadas combinações com alcoólicos que elas se aplicam: uma das bebidas mais populares do país, o café também pode resultar em excelentes experiências.

Harmonização com café é algo que, de uns cinco anos para cá, vem sendo trabalhado com mais relevância não só por baristas como por chefs de cozinha”, afirma Caio Tucunduva, coffee hunter responsável pela torrefação No More Bad Coffee e um dos sócios do Café Hotel, em Pinheiros.

“E os mesmos princípios que se aplicam a vinhos, destilados e cervejas, valem para o café”, diz o especialista.

Ou seja, conforme explica a chef confeiteira Giuliana Cupini, independentemente da harmonização pretendida, inclusive com café, deve-se fazer por similaridade ou contraste. “Por similaridade, a gente se baseia sempre na soma das características comuns da bebida e do alimento, onde elas vão combinar entre si e se intensificar. Por contraste, são componentes que se opõem para buscar o equilíbrio.”

Chef confeiteira Guiliana Cupini / Divulgação

Especialista há 27 anos em mesa de doces de festa e casamento, Giuliana há três se dedica a compreender os mecanismos utilizados pelo nosso cérebro para processar e interpretar as informações relacionadas ao ato de comer, trabalho que batizou de “neuroconfeitaria”. E, segundo ela, harmonização “também é um estudo”.

O primeiro passo, diz, é analisar as características do café. Afinal, existem grãos das mais variadas qualidades, em que fatores como tipo, safra e torra influenciam nas características da bebida, como notas aromáticas, corpo, doçura e acidez. E não é preciso ser nenhum expert para identificá-las, já que essas informações costumam constar nas embalagens dos grãos de melhor qualidade.

“Os métodos de preparo também influenciam na harmonização, pois cada um deles dá um resultado diferente”, frisa. Tucunduva concorda: “Cada método enaltece diferentes qualidades do mesmo grão. Um espresso bem tirado, por exemplo, pode ir muito bem com chocolate amargo, mas o mesmo café na Hario V60 talvez não fique tão bom.” A temperatura é outro fator que deve ser levado em consideração, já que, segundo Giuliana, a bebida quando está quente se destaca pelo corpo mais intenso; à medida que esfria, se revela mais frutada.

Mas, em linhas gerais, há alguns exemplos práticos de parcerias que têm tudo para ser um sucesso, segundo Giuliana: cafés coados, adocicados e suaves combinam com a simplicidade de pedidas como bolos tradicionais e biscoitos. Os de média intensidade costumam ir bem com um beijinho de coco ou doces com mel, mais doces e marcantes. Já a complexidade de uma torta de nozes e figo ou de um tiramisù faz boa companhia ao espresso. “É preciso equilíbrio para potencializar os sabores e resultar uma experiência mais agradável.”

Tucunduva dá outra dica: “Cafés com mais acidez funcionam muito bem com doces brasileiros de frutas, como goiabada e doce de abóbora. Já as bebidas mais adocicadas vão muito bem com um chocolate amargo, por exemplo.” Giuliana complementa: “Um café com notas de cacau pode deixar um chocolate de amargor elevado ainda mais intenso na boca. Já para sobremesas à base de chocolate, um cappuccino bem cremoso é sem erro.”

Cappuccino também é a escolha de Elena Boscato para acompanhar “doces mais ‘chocolatudos’”. “Temos uma infinidade de métodos de preparo e proporções de receitas, além das bebidas com leite e as diferentes porcentagens de cacau no chocolate que podemos trazer nas combinações”, diz ela, que é barista e coordenadora de processos operacionais da badalada rede de cafeterias We Coffee. “E, claro, não esquecer do que se quer evidenciar. O café ‘perde’ para o chocolate, mas o chocolate ganha muito nessa combinação!”

Combinar o cafezinho do dia a dia com salgados é outra ótima opção. Um exemplo? “Sanduíches, principalmente os que levam queijo, com café coado de notas mais frutadas e acidez mais elevada”, diz Elena. Para Tucunduva, a bebida vai muito bem com queijo. “Gosto muito de combinar com canastra, meia-cura, gorgonzola ou mesmo queijo branco.” E aí, vale a regra geral: com os cafés encorpados, os queijos fortes são a melhor opção; com frutados, os mais leves – em todos os casos, o sabor umami e salgado do queijo tem a capacidade de “limpar” a acidez da bebida e revelar notas escondidas.

Dá até para arriscar combinações diferentonas. “Gosto muito de carnes com café”, confessa Elena. Mas, no fim, todos são unânimes em afirmar que o que vale é testar. “Apesar de todas as regras para a harmonização, não tem certo e errado. Vai da boca de cada um”, reforça Giuliana. “É para ser uma experiência leve, gostosa e divertida.”

*Os textos publicados pelos Insiders e Colunistas não refletem, necessariamente, a opinião do CNN Viagem & Gastronomia.

Fábio Galib

Fábio Galib é jornalista e há quinze anos escreve sobre gastronomia. Foi repórter do Jornal da Tarde e do Estadão, nos quais integrou a equipe que lançou os guias Divirta-se. Na Editora Abril, editou as publicações regionais de Veja Comer & Beber e foi crítico de bares e comidinhas de Veja São Paulo.


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