Perfumada, refrescante e saudável: o que é a tão aclamada gastronomia mediterrânea

Azeite, ervas, especiarias, peixes e frutos do mar: a comida dos países banhados pelo Mar Mediterrâneo conquista um público cada vez maior em busca de sabor e saúde

Uso de vieiras, polvo e camarões marca o cardápio do tradicional restaurante mediterrâneo Lafayette, em Salvador
Uso de vieiras, polvo e camarões marca o cardápio do tradicional restaurante mediterrâneo Lafayette, em Salvador Divulgação

Carolina Dahercolaboração para o Viagem & Gastronomia

Esse assunto de comida mediterrânea é coisa antiga. Antiga mesmo. Lá no século V a.C., Platão já dizia que moderação era uma condição para uma dieta saudável. O filósofo, que teve contato com diversas sociedades do mediterrâneo, como Egito, Sicília, Palestina e Babilônia, registrou que os cerais, leguminosas e frutos eram considerados a base da alimentação, já o uso da carne era bem restrito. Seu colega Hipócrates seguia o mesmo caminho. É dele, inclusive, a famosa frase “Que o alimento seja o teu remédio e o remédio o teu alimento.”

Mas o que é essa tal de dieta mediterrânea? Primeiro é bom ter em mãos um mapa. Quando se pensa nesse tipo de alimentação, imediatamente nos concentramos na Espanha, França, Grécia, Mônaco e Itália.

No entanto, os países banhados pelo mar mediterrâneo vão muito além dos 13 países da Europa. Na Ásia, por exemplo, Síria, Líbano, Israel e Palestina também fazem parte desse recorte, assim como o Egito, Líbia, Tunísia, Argélia e Marrocos, localizados na África.

Ou seja, a comida mediterrânea não é uma só, mas muitas. “São culturas muito diferentes e que utilizam os ingredientes de formas diversas. Na Europa, o fruto do mar é essencial. Já no Oriente, vemos o uso da carne de carneiro, cordeiro e cabra. E a África é marcada pelo perfume das especiarias”, diz Jorge Ferreira, chef do Olivia Mediterrâneo, em Belo Horizonte.

No Olivia Mediterrâneo, em Belo Horizonte, o chef Jorge Ferreira aposta em pratos preparados com ingredientes vindos de pequenos produtores do interior de Minas Gerais / Victor Schwaner / Divulgação
No Olivia Mediterrâneo, em Belo Horizonte, o chef Jorge Ferreira aposta em pratos preparados com ingredientes vindos de pequenos produtores do interior de Minas Gerais / Victor Schwaner / Divulgação

Apesar de estar longe do litoral, o chef aposta no uso de peixes e frutos do mar, a maioria vinda de Santa Catarina. “O Olívia é tão mediterrâneo quão consigo ser. Minas também tem um território muito vasto que permite que eu tenha ótimos produtos ao meu redor”, completa. Os derivados de leite de búfala vêm de Barbacena, a 173 quilômetros da capital, já os de cabra saem diretamente de Ferros, também no interior do estado.

Em seu menu, as influências se misturam e ganham releituras interessantes. Na categoria compartilhar, o kebab de cordeiro com salada de tomates, cebola roxa e coalhada seca no pão de iogurte é uma opção que foge do óbvio. Entre os principais, a cavaquinha grelhada é servida com risoto de abobrinha e limão siciliano.

Cheirinho de mar

Tradicional em Salvador, o restaurante Lafayette, que existe há 17 anos, acaba de dar uma incrementada no cardápio.

Prato de comida mediterrânea do Lafayette
O tradicional restaurante Lafayette, em Salvador, ganhou um reforço com dez sugestões de pratos assinados pelo chef Elia Schramm, da Babbo Osteria / Divulgação

Ele convidou o chef Elia Schramm (leia-se Babbo Osteria, no Rio de Janeiro) para assinar um menu especial com o tema litoral. “Quando se chega em um lugar já reconhecido pelo público, é preciso tomar muito cuidado e respeito para não deixar o cliente confuso”, diz o chef.

Para isso, ele fez uma seleção de dez sugestões entre três entradas, seis principais e uma sobremesa. O caminho que escolheu foi exatamente trazer esse perfume mediterrâneo com o uso de peixes, frutos do mar e ervas frescas. “É uma comida leve em que utilizamos muito mais o azeite do que a manteiga”, explica Elia.

Para começar, a sugestão do chef é o Polpo alla siciliana, uma caponata siciliana, straciatella (queijo de búfala com creme de leite) e vinagrete de polvo. Em seguida, o cliente pode escolher entre uma massa, que é o caso da Vieiras seladas, tagliollini nero di sépia e beurre blanc de limão siciliano ou o Polvo alla Milos, polvo grelhado com mel e balsâmico, purê de grão de bico e molho vierge.

Pioneirismo em comida grega

Azeite, azeite e azeite.

Assim a chef Mariana Fonseca responde qual o ingrediente que não pode faltar na sua cozinha. Ela é dona do MYK, primeiro restaurante grego contemporâneo do país.

chef Mariana Fonseca
A chef Mariana Fonseca foi uma das primeiras a investir nas receitas gregas em seu MYK, inaugurado em 2013 / Ricardo D’Angelo / Divulgação

Localizado em São Paulo, foi inaugurado em 2013 e trouxe a cultura da comida mediterrânea para o prato, com a utilização de muitos frutos do mar.

A vontade de trabalhar com a culinária grega veio depois que a chef passou uma temporada no país. “O que mais me encanta é a simplicidade.

“Com bons ingredientes não precisamos mascarar os sabores com molhos mirabolantes e excesso de temperos”, explica Mariana, que também exalta o lado saudável dos preparos.

“Não é à toa que duas das cinco blue zones do mundo estejam no Mediterrâneo, Icária e Sardenha”. As blue zones citadas são regiões do planeta conhecidas pela longevidade e qualidade de vida de seus habitantes, com grande concentração de pessoas com mais de 90 anos, vivendo com autonomia e baixos índices de doenças crônicas e limitações.

O cardápio do MYK acaba de ganhar um reforço com 25 novas receitas. Mas, claro, alguns clássicos continuam firmes e fortes entre as opções. “Se eu tirar alguns pratos os clientes me matam, pois alguns são muito fiéis ao polvo servido com batatas e o bacalhau assado, por exemplo”, explica Mariana. Entre as novidades, a chef indica como entrada o queijo feta empanado no gergelim com compota de laranja e como principal, o pastitsio, que lembra uma lasanha.

O que diz a especialista

A dieta mediterrânea faz bem para saúde. É o que garante Renata Peixoto, endocrinologista e professora da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Os componentes presentes na dieta mediterrânea que explicam seus efeitos benéficos incluem os antioxidantes, fitosteróis e fibras encontrados em legumes, verduras, frutas, azeite de oliva e vinho.

Além disso, os ácidos graxos monoinsaturados presentes no azeite de oliva, o ômega-3 encontrado em peixes e frutos secos, bem como os probióticos presentes em alimentos fermentados, desempenham papéis importantes no corpo humano. Esses componentes agem de forma sinérgica e contribuem para regular a pressão arterial, o perfil de colesterol, a glicemia e reduzir a inflamação. “O que eu acho mais interessante na dieta mediterrânea é que ela não corta radicalmente nenhum alimento. O que é estimulado é uma escolha consciente por alimentos mais saudáveis. A ênfase está no aspecto qualitativo global dos alimentos e não apenas nas calorias”, diz Renata.

Em resumo, a dieta mediterrânea é essencialmente baseada em alimentos de origem vegetal, minimamente processados. Ela valoriza a sazonalidade dos produtos, priorizando alimentos cultivados localmente.

Mais do que apenas uma dieta, é um estilo de vida que também valoriza a saúde, o exercício físico, o descanso, a hidratação adequada e o bom convívio social à mesa. Além dos benefícios evidentes para a saúde, a dieta mediterrânea destaca-se pela sua sustentabilidade, com menor impacto ambiental, riqueza em biodiversidade e apoio ao comércio local e tradições socioculturais.

Mapa da saúde

Recentemente, o Ministério da Saúde e o Hospital do Coração (HCor) desenvolveram um guia alimentar adaptando alguns conceitos da dieta mediterrânea à realidade brasileira. Chamado de Alimentação Cardioprotetora Brasileira (DICA BR), o guia é dividido em grupos de alimentos de acordo com as cores da bandeira nacional.

O verde representa a maior área da bandeira e é composto por alimentos cardioprotetores que devem ser consumidos em maior quantidade: verduras, frutas, legumes, leguminosas, leites e iogurtes desnatados

O amarelo é a segunda maior área e representa os alimentos que devem ser ingeridos com moderação por serem alimentos mais calóricos ou com maior teor de sal e gordura: pães, cereais, macarrão, tubérculos, farinhas

O grupo azul deve ser consumido em menor quantidade: carnes, ovos, manteiga, doces

O grupo vermelho (que deve ser evitado e, por isso, nem aparece na bandeira) são alimentos ultraprocessados, ricos em aditivos e conservantes, gordura hidrogenada, sal e açúcar: macarrão instantâneo, embutidos, sucos e molhos industrializados

Receita

Receita Polvo Mavromati por Mariana Fonseca, do MYK

Prato de polvo
Polvo Mavromati por Mariana Fonseca, no MYK: combinação de polvo com feijão fradinho / Ricardo D’Angelo / Divulgação

Ingredientes

2 kg de polvo 50

500 g de feijão fradinho

1 kg de tomate italiano

500 g de cebola roxa

50 g de cebolete

150 ml de azeite

Flor de sal a gosto

Sal a gosto

Pimenta do reino moída a gosto

2 folhas de louro

Modo de Preparo

Coloque o polvo em uma panela com água, 400 g de cebola e as folhas de louro. Deixe cozinhar de 40 min a 1h. Até ele ficar macio. Cozinhe o feijão fradinho até ficar no ponto desejado.

Coloque uma panela com água e deixe ferver. Tire o olho do tomate e faça uma cruz na parte de baixo. Coloque os tomates na água deixe 2 minutos. Tire coloque em um bowl com gelo para resfriar. Tire a pele e semente dos tomates e corte em cubos pequenos.

Tempere o feijão com a cebola roxa em brunoise, tomates, azeite , sal e cebolete.

Esquente uma frigideira e grelhe o polvo dos dois lados.

Na hora de servir finalizar o polvo com flor de sal e azeite.