Com R$ 69,5 mil pelo quilo, caviar de Madagascar movimenta mercado de luxo

Especialistas diziam ser impossível produzir caviar nas montanhas do país africano

Joshua Korber Hoffmanda CNN

Quando Delphyne Dabezies anunciou que queria lançar a primeira produção de caviar na África, muitos no setor de alimentos sofisticados acharam a ideia absurda.

Quinze anos depois, a Acipenser, empresa fundada por ela e dona das marcas Rova e Kasnodar Caviar, conquistou seu espaço em algumas das cozinhas mais prestigiadas do mundo.

Nas montanhas de Madagascar, a leste da capital Antananarivo, o Lago Mantasoa se tornou uma fonte inesperada desse ingrediente luxuoso. “Todos os especialistas diziam que era impossível”, contou Dabezies ao CNN Travel.

 

 

Tradição e sofisticação

O caviar, feito com ovos de esturjão salgados, tem uma longa história de exclusividade. No século XVII, o czar Alexei Mikhailovich I transformou a iguaria em monopólio estatal na Rússia, consolidando seu status de luxo.

Com o tempo, a produção se espalhou para outras partes do mundo. Com a chegada da Acipenser a Madagascar, hoje o caviar é produzido em todos os continentes habitados, exceto na Austrália.

Além da tradição, o longo tempo de maturação do esturjão — de oito a 20 anos — contribui para o alto valor do produto, que pode chegar a US$ 27 mil (R$ 156 mil) por colher de chá. Claro, também há o sabor inconfundível.

“Você pressiona suavemente contra o céu da boca e os pequenos ovos se dissolvem em pura delícia”, descreve Nichola Fletcher, autora de “Caviar: A Global History” (caviar, uma história global, em tradução livre).

Mercado de luxo do caviar

Inspirados por um programa de TV sobre a criação de esturjões na França, Dabezies, seu marido Christophe e o amigo Alexandre Guerrier decidiram tentar algo semelhante em Madagascar, onde já trabalhavam no setor têxtil.

Sem nenhuma experiência na produção de caviar, eles enfrentaram desconfiança e falta de apoio. Foi só com a ajuda inesperada de um especialista aposentado em criação de esturjões, que estava de férias no país, que o projeto começou a ganhar forma. Então, em uma viagem para sua casa de fim de semana, avistaram o lago.

Localizado a 1.400 metros de altitude, o Lago Mantasoa tem um clima mais ameno que o resto do país, com temperaturas entre 13°C e 23°C. Isso evita que os peixes parem de crescer no frio intenso, como acontece em outras partes do mundo, acelerando seu ciclo de maturação em até dois anos.

O que começou como um sonho distante de três empreendedores inexperientes tornou-se realidade. Hoje, a Acipenser cultiva seis espécies de esturjão em tanques na terra e no lago.

Quando a Acipenser lançou seu primeiro lote do caviar Rova em 2017, a reação inicial foi de ceticismo. Madagascar sempre foi conhecida por sua baunilha — nunca por suas ovas de peixe.

“No começo, ninguém levava a sério”, lembra Dabezies. “Diziam que era piada. Mas a única maneira de provar que nosso caviar era excelente era fazendo as pessoas experimentarem.”

Rova Caviar Madagascar
Lake Mantasoa is a site of sturgeon maturation – part of Acipenser’s caviar production • Divulgação/Rova Caviar Madagascar

A grande oportunidade veio em 2019, quando chefs renomados degustaram o produto na feira gastronômica Sirha Lyon. Desde então, o Rova Caviar passou a integrar cardápios de prestígio, como os do Hôtel de Crillon, em Paris, e do Hôtel du Palais, em Biarritz.

“Esse caviar tem um sabor indulgente”, descreve Julia Sedefjian, a mais jovem chef a comandar um restaurante estrelado na França. “É cremoso, com notas amanteigadas, de brioche e um toque final de avelã.”

A iguaria também ganhou espaço na África, sendo servida em hotéis cinco estrelas como o Le Saint-Géran, na Maurícia, e os Constance Lemuria e Constance Ephelia, nas Seychelles.

Para Dabezies, o sucesso fala por si: “Ter caviar de Madagascar no prato virou um diferencial para os chefs.”

O produto mais exclusivo da Rova chega a custar €11.670 (R$ 69,5 mil) por quilo.

Impacto local e preservação

Há quase 30 anos vivendo em Madagascar, Dabezies e seus sócios fazem questão de retribuir à comunidade.

A Acipenser emprega cerca de 300 pessoas, sendo 80% da região de Ambatolaona. Além de treinamento em piscicultura e produção de caviar, a empresa oferece assistência médica, cursos de alfabetização e programas de planejamento familiar.

Recentemente, a empresa recebeu do governo a concessão de 200 hectares ao redor do Lago Mantasoa para reflorestamento e preservação ambiental. Também implementou iniciativas para garantir a sustentabilidade do lago, como monitoramento da água, repovoamento da fauna local e medidas contra a poluição.

Caviar mais cobiçado do mundo

O grande desafio para qualquer produtor de caviar é criar Beluga, a variedade mais rara e cara, extraída do esturjão que leva mais tempo para atingir a maturidade e produz as maiores ovas.

No ano passado, a Acipenser introduziu seus primeiros esturjões Beluga no lago. Agora, em 2025, a expectativa é colher as primeiras ovas dessa espécie.

“Madagascar é um lugar único, com um potencial incrível”, afirma Dabezies. “Temos orgulho de fazer parte dessa história e compartilhar suas riquezas com o mundo.”

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