Sonda detecta escape de gás oxigênio e carbono em áreas inexploradas de Vênus
Descoberta pode ajudar a compreender como a atmosfera de Vênus evoluiu e como o planeta perdeu água ao longo do tempo
A missão BepiColombo, da ESA (Agência Espacial Europeia) e da JAXA (Agência Japonesa de Exploração Aeroespacial), fez uma rápida passagem a Vênus e revelou informações sobre como os gases escapam das camadas superiores da atmosfera do planeta.
A sonda fez detecções, em região ainda não explorada do ambiente magnético de Vênus, que mostraram que os gases carbono e oxigênio estão sendo acelerados a velocidades em que podem escapar da atração gravitacional do planeta. Os achados foram publicados na revista científica Nature Astronomy na última sexta-feira (12).
De acordo com Lina Hadid, pesquisadora no Laboratório de Física de Plasma (LPP) e autora principal do estudo, “essa é a primeira vez que íons de carbono positivamente carregados foram observados escapando da atmosfera de Vênus”.
“Estes são íons pesados que geralmente se movem lentamente, então ainda estamos tentando entender os mecanismos em jogo. Pode ser que um ‘vento’ eletrostático esteja os levando para longe do planeta, ou eles poderiam estar sendo acelerados através de processos centrífugos”, diz, em comunicado à imprensa.
No início da sua história, Vênus apresentava semelhanças com a Terra, incluindo quantidades significativas de água líquida. No entanto, ao contrário da Terra, Vênus não possui seu próprio campo magnético, mas a interação de partículas emitidas pelo Sol (vento solar) com partículas eletricamente carregadas forma uma “magnetosfera induzida” fraca ao redor do planeta. A “magnetosfera” é uma camada superior da atmosfera de um planeta em que o campo magnético ainda exerce uma ação.
Com o tempo, essas interações com o vento solar removeram a água de Vênus, deixando uma atmosfera composta, principalmente, por dióxido de carbono e pequenas quantidades de nitrogênio.
Descoberta pode ajudar a entender como Vênus perdeu sua água
Missões espaciais anteriores, como o Pioneer Venus Orbiter da NASA (Agência Espacial Norte-americana) e o Venus Express da ESA, fizeram estudos detalhados sobre o tipo e a quantidade de moléculas e partículas carregadas que são perdidas no espaço. No entanto, as órbitas dessas missões deixaram algumas áreas ao redor de Vênus inexploradas e algumas questões sem respostas.
Então, em agosto de 2021, a BepiColombo passou por Vênus para desacelerar e ajustar seu curso em direção ao seu destino, que era Mercúrio. Para isso, a espaçonave atravessou uma região da magnetosfera chamada “magnetosheath“, onde o vento solar é desacelerado e aquecido, e emergiu nas regiões magnéticas mais próximas do Sol.
Durante 90 minutos de observação, os instrumentos da BepiColombo mediram o número e a massa de partículas carregadas encontradas nessa região, capturando informações sobre os processos químicos e físicos que impulsionam a fuga de gases na borda da magnetosheath.
Segundo os pesquisadores envolvidos na missão, detectar a perda de íons pesados e entender os mecanismos de escape em Vênus é crucial para entender como a atmosfera de Vênus evoluiu e como o planeta perdeu sua água.
Os dados para o estudo foram obtidos pelo Analisador de Espectro de Massa (MSA) e pelo Analisador de Íons de Mercúrio (MIA) da BepiColombo durante sua segunda passagem por Vênus. Os dois sensores fazem parte do pacote de instrumentos Experimento de Partículas de Plasma de Mercúrio (MPPE), que é transportado por Mio, o Orbitador Magnetosférico de Mercúrio, liderado pela JAXA.
As ferramentas de modelagem climática espacial SPIDER, do Europlanet, permitiram aos pesquisadores rastrear como as partículas se propagaram pela “magnetosheath” de Vênus.
“Essa descoberta mostra os resultados únicos que podem surgir de medições feitas durante passagens por planetas, em que a espaçonave pode se mover através de regiões geralmente inatingíveis por espaçonaves orbitais”, afirma Nicolas André, do Instituto de Pesquisa em Astrofísica e Planetologia (IRAP) e líder do serviço SPIDER.
Missões futuras irão investigar Vênus na próxima década, incluindo a missão Envision, da ESA, o orbitador VERITAS e a sonda DAVINCI, ambos da Nasa, e o orbitador Shukrayaan, da Índia. Juntas, essas espaçonaves fornecerão uma imagem abrangente do ambiente venusiano, desde a magnetosheath, passando pela atmosfera até a superfície e seu interior.
“Resultados recentes sugerem que a fuga atmosférica de Vênus não pode explicar totalmente a perda de seu conteúdo histórico de água. Este estudo é um passo importante para descobrir a verdade sobre a evolução histórica da atmosfera venusiana, e as próximas missões ajudarão a preencher muitas lacunas”, acrescentou a co-autora Moa Persson do Instituto Sueco de Física Espacial.