Novo estudo revela possível aparência de Ötzi, o “Homem de Gelo”
Análise de sua composição genética revelou que a múmia de 5.300 anos tinha pele escura, olhos escuros e provavelmente era careca
Ötzi, o “Homem do Gelo”, cujos restos congelados foram encontrados em uma ravina no alto dos Alpes em 1991, é talvez o cadáver mais estudado do mundo.
O mistério sobre sua morte violenta e sobre quem ele era despertou fascínio muito além do campo da arqueologia. A cada ano, milhares de pessoas visitam sua múmia no Museu de Arqueologia do Tirol do Sul, em Bolzano, na Itália.
Um novo estudo do DNA extraído da pélvis de Ötzi sugeriu que ele ainda tem alguns segredos para revelar. A análise de sua composição genética revelou que a múmia de 5.300 anos tinha pele escura, olhos escuros e provavelmente era careca.
Isso contrasta com a reconstrução até então conhecida de Ötzi, que retrata um homem de pele clara com cabelos e barba em abundância.
“Acreditava-se anteriormente que sua pele escureceu durante o processo de mumificação”, disse Albert Zink, chefe do Instituto de Estudos de Múmias da Eurac Research, um centro de pesquisa privado com sede em Bolzano.
“Parece que a cor escura da pele da múmia é bem próxima da cor da pele do ‘Homem de Gelo’ durante sua vida”, disse Zink, coautor da pesquisa publicada nesta quarta-feira (16) na revista científica “Cell Genomics”.
Não é tão surpreendente que Ötzi tivesse pele escura, afirmou Zink, observando que muitos europeus naquela época provavelmente tinham pigmentação de pele mais escura do que muitos europeus de hoje.
“Os primeiros agricultores da Europa ainda tinham uma pele bastante escura, que mudou com o tempo para uma pele mais clara, como uma adaptação às mudanças no clima e na dieta dos agricultores. Os agricultores consomem muito menos vitamina D em sua dieta em comparação com os caçadores-coletores”, explicou.
“Parece que o ‘Homem de Gelo’ ainda consumia bastante carne, o que também foi confirmado pela análise de seu estômago, mostrando a presença de carne de íbex [animal mamífero] e veado”, acrescentou.
O coautor do estudo, Johannes Krause, diretor do departamento de arqueogenética do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva, em Leipzig, Alemanha, disse que as descobertas sugerem que o “Homem de Gelo” em vida se parecia muito mais com a própria múmia.
“É notável como a reconstrução é influenciada por nosso próprio preconceito de um humano da Idade da Pedra da Europa”, disse Krause em um comunicado.
Embora a antiga análise de DNA sugerisse que Ötzi tinha calvície masculina, não é possível ter certeza até que ponto ele já perdeu cabelo em sua vida, disse o arqueólogo Lars Holger Pilø, codiretor do projeto Secrets of the Ice, na Noruega. Ele estudou Ötzi, mas não esteve envolvido nas pesquisas mais recentes.
“Ötzi pode muito bem ter ficado calvo por razões genéticas, mas a calvície quase completa que ele tem agora é, na minha opinião, mais provável que tenha ocorrido após sua morte”, disse Pilø.
“Os pelos geralmente caem durante a permanência [do corpo] dentro e fora do gelo, à medida que a epiderme se decompõe.”
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Genoma detalhado produz informações mais precisas
O genoma sequenciado do DNA retirado da pélvis de Ötzi era mais completo do que um genoma anterior reunido em 2012, quando o campo do DNA antigo ainda estava em sua infância, conforme o estudo mais recente. A pesquisa atual também ajuda a esclarecer um enigma na ascendência de Ötzi, disse Pilø.
“A aplicação de novos métodos faz de Ötzi um presente científico”, acrescentou Pilø.
O novo estudo mostra que esse resultado inicial foi provavelmente devido à contaminação por DNA humano moderno.
“O avanço nas tecnologias de sequenciamento nos permitiu gerar um genoma de alta cobertura do ‘Homem de Gelo’. Isso nos permitiu obter resultados mais precisos”, afirmou Zink.
O genoma também parecia descartar uma afinidade genética proposta anteriormente entre Ötzi e os atuais sardos [povo nativo do sul da Europa].
Quando os pesquisadores do novo estudo compararam o genoma de Ötzi com o de outros humanos antigos, eles descobriram que ele tinha mais em comum com os primeiros agricultores da Anatólia [hoje Turquia], que não interagiam muito com seus contemporâneos caçadores-coletores europeus.
“Isso não muda completamente nosso conhecimento sobre o ‘Homem de Gelo’, mas torna algumas coisas mais claras”, explicou Zink. “Isso mostra que ele provavelmente viveu em uma área relativamente isolada, com contato apenas limitado com outras populações e baixo fluxo gênico de populações relacionadas a ancestrais caçadores-coletores”.
Quase todas as partes de Ötzi e seus pertences foram analisados, pintando uma imagem íntima de sua vida de 5.300 anos atrás.
O conteúdo do estômago forneceu informações sobre sua última refeição e de onde ele veio; suas armas revelaram que ele era destro; e suas roupas davam uma visão rara do que as pessoas antigas realmente usavam. Zink disse que a equipe espera descobrir mais detalhes, como a composição de seu microbioma.
Não é a primeira vez que um capítulo da fascinante história de Ötzi é reescrito, afirmou Pilø.
Originalmente, pensava-se que Ötzi morreu congelado, mas um raio-x de 2001 revelou uma ponta de flecha em seu ombro, o que teria sido fatal. Ele também teve um ferimento na cabeça, possivelmente sofrido ao mesmo tempo, e sua mão direita mostra um ferimento de defesa.
“Toda a história do ‘Homem de Gelo’ é intrigante, incluindo o mistério de sua morte violenta, e a questão de por que ele estava lá nas altas montanhas quando foi morto”, disse Zink.