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    Cientistas analisam mamute e encontram fósseis de cromossomos pela primeira vez

    Pesquisadores desenterraram restos mortais de mamute de 52 mil anos, em 2018, na Sibéria

    Jacopo Priscoda CNN

    Em uma descoberta inédita de novo estudo, um pedaço de pele de mamute-lanoso foi encontrado contendo cromossomos fósseis após escavação em um permafost da Sibéria — que é, grosso modo, um solo congelado por longos períodos.

    Pesquisadores desenterraram os restos mortais de um mamute de 52 mil anos, em 2018, perto da vila de Belaya Gora, no nordeste da Sibéria, onde as temperaturas congelantes ajudaram a preservar a constituição dos cromossomos — pequenas estruturas filamentosas que carregam material genético, ou DNA — em detalhes minuciosos.

    Embora amostras de DNA antigo tenham sido encontradas em outras ocasiões, elas costumam ser altamente fragmentadas e conter, apenas, centenas de letras do código genético. Os cromossomos fósseis contêm milhões, oferecendo uma visão muito mais completa do código genético de um animal.

    “Cromossomos fósseis nunca foram encontrados antes”, disse Erez Lieberman Aiden, professor de genética molecular e humana no Baylor College of Medicine e coautor correspondente do estudo publicado na quinta-feira (11), na revista Cell.

    Em descobertas anteriores, os fragmentos também careciam de uma estrutura organizada, acrescentou Lieberman Aiden. “Aqui, os fragmentos estão claramente organizados em 3D — essencialmente como estavam nos cromossomos originais no mamute vivo.”

    De acordo com Olga Dudchenko, professora assistente de genética molecular e humana no Baylor College of Medicine e co-primeira autora do estudo, os cromossomos, apontados como “fósseis não mineralizados, ou subfósseis” pelos pesquisadores, estão em um estado de preservação bom o suficiente para montar o genoma — ou a soma de todo o material genético — de uma espécie extinta.

    “Acreditamos fortemente que isso não se aplicará apenas ao mamute ou a este mamute específico”, disse Dudchenko, que também é pesquisadora sênior no Centro de Física Biológica Teórica da Universidade Rice. “Mas, na prática, é o começo de uma nova área de pesquisa com grandes possibilidades”, completou.

    Difusão de DNA

    Em diferentes tipos de células, o DNA fica em estruturas 3D distintas e específicas que fornecem percepções sobre as propriedades ou características particulares desse tipo de célula, disse Kevin Campbell, professor de fisiologia ambiental e evolutiva na Universidade de Manitoba, no Canadá, que não participou do estudo.

    Após a morte, as células do corpo se degradam rapidamente, e essa estrutura 3D se perde em poucos dias ou menos, acrescentou. Em animais árticos, como o mamute-lanoso, a degradação é mais lenta devido às temperaturas congelantes, mas o DNA ainda fica danificado e, ao longo de longos períodos, espera-se que perca a estrutura e os atributos que compõem a biologia da espécie.

    “No entanto, este estudo é o primeiro a demonstrar que isso nem sempre é o caso,” disse Campbell por e-mail. “O DNA é uma molécula bastante comprida e, após a morte de um animal, ele começa a se deteriorar e a se dividir em fragmentos menores”, explicou Dudchenko.

    Imagem de microscópio da amostra
    Imagem de microscópio da amostra, que exibe a epiderme, derme e tecido subcutâneo remanescentes, além do músculo estriado / Reprodução/Universidade de Estocolmo

    “O que você normalmente espera é que todos esses pedaços comecem a se mover uns em relação aos outros e a se dispersar, perdendo qualquer organização que existia”, disse Dudchenko. “Mas, claramente, nesta amostra específica, isso não aconteceu”.

    Essa perda de estrutura é chamada de difusão, sendo que a forma de evitá-la é bem conhecida pelos cientistas de alimentos — e não é muito diferente da produção de carne seca, acrescentou.

    “Evitar a difusão é fundamental para preservar alimentos, então, se você quer algo que seja estável na prateleira por um longo tempo, você precisa basicamente de uma combinação de desidratação e resfriamento”, ela disse. “Qualquer alimento estável na prateleira que não seja enlatado provavelmente está em um estado de bloqueio de difusão”.

    Quando o mamute da amostra de pele morreu, as condições podem ter sido exatamente as certas para iniciar esse processo naturalmente. “(A carcaça) poderia ter passado espontaneamente pelo mesmo procedimento que usamos comercialmente o tempo todo,” disse Dudchenko, “removendo quantidades substanciais de água, bloqueando a difusão interna e fixando esses pedaços de cromossomos no lugar, permitindo-nos lê-los 52.000 anos depois.”

    Mas, embora estivesse bem preservado, o DNA não estava completamente intacto. “Cada cromossomo, originalmente uma molécula de DNA, fragmentou-se em milhões de moléculas de DNA”, disse Aiden por e-mail. “Mas as moléculas não se moveram muito, mesmo em escala nanométrica, por isso as chamamos de cromossomos fósseis.”

    Se essa amostra fosse um livro, disse Lieberman Aiden, a encadernação teria desaparecido, deixando inúmeras páginas soltas, ou fragmentos de DNA. A difusão é como o vento soprando as páginas, impossibilitando de colocá-las de volta em ordem. Mas, nesta amostra, as páginas nunca foram sopradas; permaneceram em uma pilha organizada, exatamente como estavam antes de a encadernação se perder.

    Testes em carne seca

    Os pesquisadores confirmaram essa teoria de preservação realizando alguns experimentos com carne seca para ver até que ponto poderiam maltratar o alimento antes que os cromossomos perdessem sua estrutura.

    “Decidimos testar o quanto essa bela molécula resiste ao estresse e ao dano, pedindo a um dos arremessadores do time de beisebol Houston Astros para lançar uma bola e disparar uma espingarda contra ela”, disse Dra. Cynthia Pérez Estrada, co-primeira autora do estudo e pesquisadora do Centro de Arquitetura do Genoma do Baylor e do Centro de Física Biológica Teórica da Rice.

    “A carne seca estava se quebrando cada vez mais, mas a estrutura do DNA ainda estava lá, nos dizendo que o DNA é extremamente resistente e ainda mais nesse tipo de estado semelhante ao vidro (como na amostra), onde as moléculas estão basicamente congeladas e se comportando como um cristal”, acrescentou Pérez Estrada.

    Com a nova informação genética descoberta nas amostras de pele, os pesquisadores determinaram, pela primeira vez, que o mamute-lanoso tinha 28 pares de cromossomos, assim como os elefantes modernos.

    Mas a estrutura permitiu que fossem além e vissem quais genes individuais estavam ativos no animal. “Todo mundo quer saber o que exatamente o tornava lanoso”, disse Dudchenko. “Temos algumas ideias graças à maneira como esses cromossomos foram preservados.”

    Sonhos com mamutes

    Os pesquisadores compararam genes individuais da amostra do mamute com os equivalentes nos elefantes modernos, observando diferenças na atividade dos genes que regulam os folículos capilares. Mas o DNA dos elefantes também foi necessário para montar o genoma do mamute.

    “Nossa esperança e sonho era montar o genoma do mamute completamente, mas agora, não é exatamente onde estamos — ainda usamos algumas informações de seus parentes mais próximos para ajudar, porque a quantidade de dados que conseguimos obter do mamute era menor do que o normalmente necessário”, disse Dudchenko. “Mas os fundamentos nos dizem que, conforme continuamos trabalhando para isso, poderemos fazê-lo (sem a ajuda do DNA de elefantes).”

    Os cromossomos fósseis poderiam tornar o sonho de ressuscitar o mamute-lanoso uma realidade? “A biologia fundamental que aprendemos com isso será útil, não há dúvida disso”, disse Dudchenko. “Estamos mais perto? Um passo mais perto, mas ainda há muitos passos pela frente com todos os tipos de considerações que vão além da base da ciência”.

    Os pesquisadores também esperam que a mesma metodologia usada na amostra de mamute possa ser aplicada às amostras de outras espécies.

    “Esperamos encontrar estruturas de cromossomos em amostras de museu”, disse Marcela Sandoval-Velasco, pesquisadora convidada no Centro de Hologenomia Evolutiva da Universidade de Copenhague, na Dinamarca, e co-primeira autora do estudo.

    “Não apenas espécimes de permafrost, porque isso limita muito, mas também amostras de coleções de museus. Há um potencial enorme lá”, acrescentou, citando o rinoceronte-lanoso, leões extintos e o pombo-passageiro como algumas das espécies extintas sobre as quais os cientistas poderiam descobrir mais dessa maneira.

    Esse potencial possibilita mais descobertas, de acordo com Pérez Estrada. “Será necessário um esforço imenso para encontrar amostras adequadas, então haverá muito trabalho pela frente — mas não ficaria surpresa se descobríssemos algo novo e completamente diferente do que temos agora,” ela disse.

    “Essa também é uma questão aberta realmente emocionante: O que mais e quais outros atributos físicos (do DNA) podem ser preservados?”, completou.

    Descobertas empolgantes

    Pesquisadores que não participaram do estudo expressaram entusiasmo com as descobertas.

    Este estudo é o primeiro a reconstruir a estrutura, ou arquitetura, de um genoma de uma espécie extinta que viveu durante a última era do gelo, disse Peter Heintzman, paleogeneticista da Universidade de Estocolmo, na Suécia.

    “Esta informação estrutural fornece ideias sobre as funções do genoma do mamute-lanoso que eram invisíveis usando métodos genômicos anteriores,” disse Heintzman por e-mail.

    “Esse avanço, portanto, ajuda a abrir uma nova e empolgante fronteira na paleogenômica, o estudo de genomas antigos, e provavelmente proporcionará mais insights sobre como as espécies extintas evoluíram, viveram e desapareceram.”

    Devido ao nível substancial de degradação e fragmentação do DNA em amostras antigas, foi surpreendente ver a reconstrução de alta qualidade, em nível de cromossomo, do genoma do mamute relatada neste estudo, disse Dmitry Filatov, professor de biologia na Universidade de Oxford, no Reino Unido.

    “É ainda mais surpreendente que os pesquisadores conseguiram inferir quais genes estavam ativos e quais estavam desligados na amostra de mamute e comparar isso com a expressão genética em elefantes”, disse Filatov em um e-mail. “Isso certamente estimulará mais pesquisas em paleogenômica em outras espécies.”

    Hendrik Poinar, diretor do Centro de DNA Antigo na Universidade McMaster em Ontário, chamou o artigo de “muito empolgante”. Normalmente, com restos fósseis, os pesquisadores não conseguem fazer nada remotamente próximo de montar um genoma, disse Poinar.

    “Não sei quantas amostras de tecido terão esse nível de preservação,” acrescentou em um e-mail. “Mas acredito que o método nos fará pensar em maneiras novas de extrair DNA dos tecidos de formas diferentes das que estamos acostumados”.

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