Apple lança grande mudança na política de privacidade. Veja o que muda
Os usuários de iOS devem agora dar permissão explícita aos aplicativos para rastrear seu comportamento e vender seus dados pessoais para anunciantes
Nesta segunda-feira (26), a Apple lançou um importante recurso de privacidade que permitirá aos usuários de iOS decidir como querem que seus dados pessoais sejam tratados, um movimento que tem preocupado algumas empresas, incluindo o Facebook.
Os usuários de iOS devem agora dar permissão explícita aos aplicativos para rastrear seu comportamento e vender seus dados pessoais para anunciantes, tais como idade, localização, hábitos de compras e informações sobre saúde. Embora muitos aplicativos tenham permitido, por anos, que os usuários escolhessem se queriam ou não serem rastreados, isso normalmente ficava escondido nas configurações do usuário e nas extensas políticas de privacidade.
O novo recurso de transparência no rastreamento em apps, agora disponível como uma atualização do iOS 14.5, vai desencadear uma onda de conscientização sobre a privacidade, em especial à medida que pedidos de permissão começarem a chegar de aplicativos pelos quais as pessoas nunca imaginaram estarem sendo rastreadas.
Os desenvolvedores agora são obrigados a perguntar aos usuários por meio de um pop-up de aviso se eles podem “rastrear sua atividade através dos aplicativos e websites de outras empresas”. As pessoas que optarem por não serem rastreadas verão menos anúncios personalizados. O desenvolvedor do aplicativo controla quando a solicitação aparece. Após fazer sua escolha, o usuário pode alterá-la nas configurações se mudar de ideia.
Embora alguns dados possam ajudar os usuários a mapear suas corridas, colocar tags em fotos ou rastrear localizações para que lojas próximas possam oferecer descontos, “alguns aplicativos têm mais rastreadores embutidos do que precisam”, disse a Apple em um vídeo postado no YouTube na segunda-feira (26). “Eles coletam milhares de informações sobre você para criar um perfil digital que vendem para outros. Esses terceiros usam seu perfil para direcionar anúncios, e também podem usá-lo para prever e influenciar seus comportamentos e decisões”.
“Isso tem acontecido sem seu conhecimento ou permissão. Suas informações estão à venda. Você se tornou o produto”, afirmou a Apple no vídeo.
O esforço da Apple tem atrapalhado algumas empresas que se baseiam no rastreamento de dados para enviar publicidade personalizada para usuários. O Facebook, cuja receita advém quase que totalmente da publicidade, advertiu os investidores em agosto que as mudanças no software da Apple poderiam prejudicar seus negócios se as pessoas começassem a optar por não serem rastreadas.
“As pessoas vão ficar ansiosas e escolher não permitir que o Facebook venda seus dados”, comentou Mike Audi, fundador e CEO da TIKI, um serviço que permite aos usuários ver quais dados e como as empresas os rastreiam online. “O resultado disso é que marcas com as quais realmente queremos compartilhar nossos dados podem não obter mais as informações em que se baseiam para proporcionar uma experiência do cliente suave e customizada”.
Em dezembro, o Facebook publicou anúncios nos jornais “The New York Times”, “Wall Street Journal” e “Washington Post” destacando suas objeções sobre como a mudança causará danos “devastadores” a milhões de pequenas empresas que anunciam em sua plataforma, muitas das quais estão lutando contra as consequências da pandemia. O gigante das redes sociais também promoveu um evento para a imprensa para divulgar as pequenas empresas que se opõem à mudança e lançou uma nova hashtag para discutir a questão.
A Apple já tinha soltado um teaser sobre a exigência em sua Conferência Mundial de Desenvolvedores em junho. A empresa tem trabalhado para se posicionar como defensora da privacidade do consumidor, descrevendo as mudanças como sendo decorrentes de sua crença de que “a privacidade é um direito humano fundamental”.
A Apple ainda acrescentou em dezembro novas etiquetas em sua App Store, explicando que tipos de dados de usuários são coletados e compartilhados em cada app, desde informações financeiras e de localização até o histórico de navegação e compras.
O impacto comercial
Especialistas em dados dizem que grandes empresas como o Facebook e outras marcas conhecidas terão de trabalhar para se adaptar às mudanças, mas as pequenas e médias empresas podem não ter certos recursos, tais como equipes analíticas e engenheiros dedicados, e podem ter mais dificuldades para alcançar clientes potenciais.
“Muitas pequenas empresas aproveitam o compartilhamento de dados para direcionar e mensurar anúncios no Facebook e no Instagram”, disse Eric Schmitt, diretor analista sênior da empresa de pesquisa de mercado Gartner. “É certo que os benefícios da publicidade digital irão diminuir para algumas dessas empresas”.
O Facebook tentou divulgar os benefícios da coleta de dados antes da mudança na política de privacidade da Apple. “Concordar com esses avisos não resulta na coleta de novos tipos de dados no Facebook. Isso só significa que poderemos continuar a oferecer experiências melhores às pessoas”, escreveu a empresa em um blog em fevereiro.
Enquanto isso, o Google anunciou mudanças em suas políticas de anúncios antes do novo recurso da Apple no início deste ano, destacando que não usará mais certos identificadores para publicidade, como mostrar um anúncio de uma bicicleta que já tenha sido buscada anteriormente. “Estamos trabalhando duro para entender e cumprir com as diretrizes da Apple em todos os nossos aplicativos na App Store”, afirmou a empresa na ocasião.
Diversos estudos demonstram que, quando dada a oportunidade de optar por não ter seus dados vendidos ou compartilhados, muitas pessoas farão essa escolha. Porém, é mais provável que as empresas se adaptem.
“Estou confiante de que as empresas, especialmente o Facebook, se sairão bem depois do lançamento do recurso de transparência nos aplicativos”, disse Daniel Barber, CEO da DataGrill, empresa de gerenciamento de dados. “Mudanças geram inovação, e espero que o Facebook, empresas de tecnologia de publicidade e quaisquer outras empresas impactadas por esse recurso encontrem novas formas de se comunicar com seu público”.
Ele ainda disse que uma maior conscientização sobre a privacidade de dados também poderia colocar mais pressão sobre as autoridades governamentais dos EUA para desenvolver um projeto de lei federal para proteger a privacidade dos usuários.
Mesmo assim, a mudança do iOS da Apple marca o início de um futuro mais transparente, já que os consumidores estarão ainda mais conscientes sobre como os aplicativos lidam com seus dados. “A parte mais interessante é que os usuários começarão a esperar e exigir mais controle sobre seus dados”, disse Audi. “E a maneira mais rápida de fazer com que uma empresa implemente mudanças é aborrecendo seus usuários”.
(Texto traduzido. Leia o original em inglês aqui.)