Vacina não impede de contrair Covid-19, mas evita gravidade e morte; entenda
Imunizantes disponíveis são seguros e eficazes para conter a disseminação do novo coronavírus
As vacinas contra a Covid-19 não impedem de contrair o novo coronavírus. No entanto, os casos (raros) de pessoas que ficam doentes mesmo após tomar as duas doses de algum dos imunizantes disponíveis não significam que eles não funcionem.
Isso pode acontecer porque nenhuma vacina disponível no mundo atualmente tem eficácia de 100% contra o vírus Sars-CoV-2, ou seja, não impede que o indivíduo seja infectado e passe a doença para outras pessoas. Mas elas são eficazes de evitar os casos graves da doença, que levam à intubação e à morte.
A seguir, especialistas respondem as principais dúvidas sobre a eficácia e a segurança das vacinas contra a Covid-19:
É possível ter Covid-19 mesmo após tomar a segunda dose da vacina?
Sim. Estudos mostram que a proteção contra o novo coronavírus acontece somente entre duas e quatro semanas depois da aplicação da segunda dose. Por isso, quem tomou a primeira dose ainda não está imunizado e pode contrair o vírus. E, se recebeu a segunda dose, o efeito da vacina será pleno apenas após um mês – mesmo assim não totalmente, porque nenhuma vacina é 100% eficaz contra o coronavírus.
Nesse cenário, pode parecer que a vacina não faz efeito, mas o fato é que não houve tempo para o organismo desenvolver a imunidade esperada para evitar a doença. Se levarmos em conta que a grande maioria da população vacinada no Brasil ainda não tomou a segunda dose, isso significa que essas pessoas continuam desprotegidas contra a Covid-19.
Quais são as eficácias das vacinas disponíveis no Brasil?
A Coronavac tem uma eficácia global de 50,7%, o que lhe confere esse percentual de chance de imunização. Isso pode não parecer tão alto, mas sua eficácia para casos graves e mortes chegou a 100% nas pessoas que tomaram as duas doses (com intervalo de 14 a 28 dias entre elas). Ou seja, pode haver chance de contrair, mas a de evoluir mal ou morrer é praticamente inexistente em quem toma as duas doses da vacina.
A vacina Oxford/AstraZeneca, por sua vez, conferiu eficácia de mais de 70% na primeira dose. Após a segunda dose, a eficácia chega a quase 100% para casos graves e mortes, desde que se tome as duas no período recomendado – 12 semanas.
A vacina da Pfizer tem eficácia de 91,3% após as duas doses. O esquema para a imunização completa considera a aplicação de duas doses, com um intervalo de 21 dias, segundo a bula. No Brasil, no entanto, o Ministério da Saúde estabeleceu um prazo de até três meses entre as doses.
Não há dados que conferem a eficácia da vacina nesse prazo estendido. No entanto, segundo os especialistas, a eficácia da vacina deve continuar alta e a segunda dose deve ser mantida para que haja sucesso na imunização. Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a vacina da Pfizer pode ser aplicada em pessoas com mais de 16 anos.
Com a vacina, estou imune às variantes?
Um estudo com a Coronavac mostrou que ela é eficaz contra as novas variantes do Sars-Cov-2, inclusive a P.1, brasileira.
O imunizante da Oxford/AstraZeneca também foi capaz de barrar a P.1 , mas ela se mostrou menos resistente à cepa variante da África do Sul (B.1.351 ou 501.V2). Diante disso, o laboratório está trabalhando em uma versão da vacina modificada para combater a variante, que deve ficar pronta até o fim deste ano, segundo a empresa.
Já uma pesquisa publicada no periódico científico New England Journal of Medicine apontou que as vacinas da Pfizer e da Moderna (ainda não disponível no Brasil) protegem contra a cepa sul-africana. E dados iniciais de um estudo do Reino Unido sugerem que essas mesmas vacinas e também a da AstraZeneca protegem contra a variante B.1.617 do vírus da Covid-19, identificada pela primeira vez na Índia. Não dá dados sobre isso envolvendo a Coronavac.
Como o Sars-CoV-2 ainda está se disseminando sem controle em várias partes do mundo, podem surgir outras variantes que não terão cobertura das vacinas. O que a Ciência já sabe é que o vírus precisa parar de circular para as variantes pararem de surgir. É por isso que a recomendação de manter distanciamento social e o uso de máscara se mantém mesmo para quem já tomou as duas doses da vacina.
Posso pegar Covid-19 pela vacina?
Não. É impossível pegar Covid-19 com qualquer uma das vacinas usadas porque nenhuma delas contém uma parte do coronavírus.
Se eu peguei Covid, devo tomar a vacina?
Sim. Todo mundo que teve Covid-19 precisa se vacinar. A imunização não impede uma reinfecção. Mas o ideal é esperar quatro semanas após a infecção para tomar a vacina. Isso porque se a pessoa ainda estiver se recuperando da Covid-19, tomar o imunizante, e sentir alguma coisa, não será possível saber se foi por causa da vacina ou da doença, o que atrapalha o controle e um possível tratamento. Outro ponto importante é que não há dados concretos sobre a duração da proteção dos anticorpos produzidos pela doença, nem dos anticorpos produzidos pela vacina.
Há problema se eu tomar a vacina estando com Covid-19?
Não. Na pessoa que já está contaminada, o sistema imunológico está respondendo ao vírus. As vacinas disponíveis não são feitas com vírus vivos, por isso não há plausibilidade biológica que cause alguma interferência no organismo de quem já contraiu o novo coronavírus. Muito pelo contrário, a vacina vai promover mais anticorpos contra a doença.
Posso transmitir Covid-19 mesmo vacinado?
Sim, porque a vacina não previne a infecção, mas as complicações resultantes dela, pelo fato de contribuir com a produção de anticorpos. Como a eficácia de nenhuma vacina disponível é total, nem todo mundo que a recebeu estará livre de contrair o vírus. Mas isso não as invalida, porque estudos realizados com pessoas imunizadas e que se infectaram mostram que a grande maioria apresenta sintomas leves ou fica assintomática.
Por que alguns adoecem mesmo após serem vacinados?
Como a vacina não previne a infecção, as pessoas podem ter Covid-19 e adoecer mesmo vacinadas, porque não houve tempo hábil do organismo responder à vacinação. Apesar dos estudos apontarem que os imunizados têm sintomas mais leves, pode haver casos graves. Eles são raros e geralmente estão relacionados com pacientes idosos, cujas doenças prévias são pioradas com a Covid-19, ou doentes crônicos com diabetes, problemas cardíacos ou pulmonares, que têm seus quadros agravados enquanto a vacina ainda não fez efeito.
Como explicar a morte de pessoas imunizadas?
As mortes por Covid-19 relatadas após a vacinação geralmente têm relação com outras doenças ou comorbidades existentes antes do diagnóstico de Covid-19. Indivíduos com comorbidades costumam ter o sistema imune debilitado. Por isso, em casos de óbitos entre pessoas que tomaram a vacina, deve ser levado em conta o histórico médico e de doenças, além do tempo de imunização. É importante avaliar cada caso, investigar as comorbidades e a faixa etária.
Dados do Ministério da Saúde mostram que no Brasil uma pessoa morre a cada 25 mil pessoas que tomam as duas doses da Coronavac, o que equivale a 0,004% dos vacinados. São eventos muito raros.
O experimento realizado pelo Instituto Butantan na cidade de Serrana (SP), onde quase 98% da população foi vacinada com a Coronavac também mostrou a efetividade da vacina para evitar mortes. Do total de 27.150 voluntários que tomaram as duas doses do imunizante, um morreu em decorrência do novo coronavírus. Isso indicou um índice de mortalidade em vacinados de 0,004%.
Receber a vacina de uma fabricante e depois a de outra é seguro?
Faltam evidências que comprovem isso em algumas vacinas. No entanto, um estudo espanhol descobriu que administrar uma dose do imunizante da Pfizer em pessoas que receberam a primeira dose da vacina da AstraZeneca é altamente seguro e eficaz.
O estudo Combivacs, conduzido pelo Instituto de Saúde Carlos III, da Espanha, mostrou que a resposta imunológica em pessoas que receberam uma dose da vacina da Pfizer foi entre 30 e 40 vezes maior do que em um grupo de controle que recebeu apenas a dose de AstraZeneca.
Há uma vacina melhor que a outra?
Não. Todas as vacinas disponíveis no país são seguras e eficazes. A diferença de cada imunizante é sutil e relacionada à sua plataforma tecnológica de desenvolvimento. Por isso, não se deve fazer uma corrida em postos diferentes para escolher vacina. Deve-se tomar a que estiver disponível.
Fontes: Renato Kfouri, Juarez Cunha, Flávia Bravo e Isabela Ballalai, da Sociedade Brasileira de Imunizações; Anvisa; CDC, Instituto Butantan, Pfizer, AstraZeneca; Michael Worobey, professor de biologia evolutiva da Universidade do Arizona; Peter Hotez, especialista em vacinologia e reitor da Escola de Medicina Tropical da Baylor College of Medicine