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    Testosterona promove “carinho”, não apenas agressividade, sugere estudo

    Hormônio pode estar associado ao comportamento amigável e de sociabilidade em machos, segundo um novo estudo com animais

    Pesquisa usou como modelo experimental roedores que formam laços duradouros e criam seus filhotes juntos
    Pesquisa usou como modelo experimental roedores que formam laços duradouros e criam seus filhotes juntos Foto: Aubrey Kelly

    Lucas Rochada CNN

    em São Paulo

    A testosterona pode promover um comportamento amigável e de sociabilidade em machos, segundo um novo estudo com animais. É o que sugere um novo estudo conduzido por neurocientistas da Emory University, nos Estados Unidos, publicado no periódico Proceedings of the Royal Society B.

    “Pelo que acreditamos ser a primeira vez, demonstramos que a testosterona pode promover diretamente o comportamento não sexual e sociável, além da agressividade, no mesmo indivíduo”, diz Aubrey Kelly, professora-assistente de psicologia da Emory e primeira autora do estudo, em comunicado.

    A pesquisa também aponta como a testosterona influencia a atividade neural das células de oxitocina – o chamado “hormônio do amor” associado ao vínculo social.

    “É surpreendente porque normalmente pensamos na testosterona como um aumento dos comportamentos sexuais e da agressão. Mas mostramos que pode ter efeitos mais sutis, dependendo do contexto social”, completa.

    Nos estudos, os cientistas buscam esclarecer a forma como os hormônios funcionam no cérebro para permitir que um animal mude rapidamente seu comportamento, dependendo do contexto social. Enquanto parte da equipe se concentrou nos efeitos da ocitocina sobre o cérebro de roedores, outra parte investigou os efeitos neurais de esteroides em peixes.

    Em busca de respostas

    A maioria dos estudos em humanos mostra que o hormônio testosterona aumenta o comportamento agressivo.

    No entanto, os pesquisadores se perguntaram se talvez a testosterona poderia, em sintonia com a capacidade de aumentar o impulso agressivo contra possíveis inimigos, também atenuar comportamentos sociáveis.

    Indo um pouco mais longe, eles levantaram a hipótese de que o hormônio poderia fazer algo mais radical como melhorar as respostas sociais positivas em contextos em que agir amigavelmente é apropriado.

    Para testar essa questão, o laboratório de Aubrey realizou experimentos em gerbos da Mongólia, que são roedores que formam laços duradouros e criam seus filhotes juntos. Enquanto os machos podem se tornar agressivos durante o acasalamento e na defesa de seu território, eles também exibem comportamento de carinho depois que uma fêmea engravida e demonstram comportamento protetor em relação aos filhotes.

    Em um experimento, um espécime macho foi apresentado a uma fêmea. Depois que eles formaram um vínculo de casal e a fêmea engravidou, os machos mostraram comportamentos usuais de carinho em relação às suas parceiras.

    Os pesquisadores então deram uma injeção de testosterona aos machos, com a expectativa de que houvesse um aumento agudo resultante no nível de testosterona diminuiria seus comportamentos amigáveis se o hormônio geralmente atuasse como uma molécula “antissocial”.

    “Em vez disso, ficamos surpresos que um roedor macho se tornou ainda mais fofinho e sociável com sua parceira. Ele se tornou um ‘super parceiro’”, diz Aubrey.

    Contextos alternados

    Uma semana depois, os pesquisadores realizaram um novo teste com os roedores machos. As fêmeas foram retiradas das gaiolas, deixando os machos sozinhos por um tempo. A seguir, um macho desconhecido foi colocado na gaiola para o monitoramento da reação.

    De acordo com Aubrey, o comportamento comum é que um macho persiga o outro ou tente evitá-lo. Porém, os cientistas observaram que os roedores que haviam recebido a injeção de testosterona se mostraram mais amigáveis como o intruso.

    Após uma nova injeção do hormônio, foi visto que o comportamento amigável mudou abruptamente. Os roedores passaram a mostrar comportamentos normais de perseguição ou afastamento dos animais desconhecidos.

    “Era como se eles de repente acordassem e percebessem que não deveriam ser amigáveis ​​naquele contexto”, diz Aubrey.

    Os pesquisadores afirmam acreditar que, como os indivíduos do sexo masculino experimentaram um aumento na testosterona enquanto estavam com suas parceiras, isso não apenas aumentou rapidamente as respostas sociais positivas em relação a elas, mas também os preparou para agir de forma mais amigável no futuro, mesmo quando o contexto mudou e eles estavam na presença de outro macho.

    No entanto, a segunda injeção de testosterona rapidamente os levou a mudar seu comportamento para se tornarem mais agressivos, conforme apropriado ao contexto de um potencial intruso. “Parece que a testosterona melhora o comportamento apropriado ao contexto. Parece desempenhar um papel na amplificação da tendência de ser fofinho e protetor ou agressivo”, afirma Aubrey.

    A especialista avalia que os experimentos em laboratório possam ter prolongado a duração de uma vivência que acontece de maneira quase simultânea na natureza. Ela explica que no habitat natural dos roedores, o acasalamento leva ao aumento da testosterona, que prepara o organismo para agir de forma carinhosa em um momento e no futuro próximo, mesmo que os níveis do hormônio diminuam.

    Mas diante da presença de um “rival” na toca, o roedor provavelmente passaria por uma nova onda de testosterona que ajudaria no ajuste do comportamento, estimulando o afastamento do invasor e a proteção dos filhotes, por exemplo. A testosterona parece ajudar os animais a girar rapidamente a chave entre as respostas pró e antissociais à medida que o ambiente muda.

    Interação da testosterona e a oxitocina

    O estudo também analisou como a testosterona e a oxitocina interagem biologicamente. Os resultados mostraram que os indivíduos do sexo masculino que receberam injeções de testosterona exibiram mais atividade de oxitocina em seus cérebros durante as interações com uma parceira em comparação com os roedores que não receberam o hormônio.

    “Sabemos que os sistemas de oxitocina e testosterona se sobrepõem no cérebro, mas realmente não entendemos o porquê”, diz Aubrey. “Juntos, nossos resultados sugerem que uma das razões para essa sobreposição pode ser para que eles possam trabalhar juntos para promover o comportamento amigável”.

    Segundo Aubrey, os hormônios parecem desempenhar papeis mais sutis para além da modulação de comportamentos. “É como um painel complicado onde um indicador pode precisar subir um pouco enquanto outro desce”, explica.

    Embora os comportamentos humanos sejam bem mais complexos do que os dos roedores da Mongólia, os neurocientistas afirmam que suas descobertas poderão fornecer uma base para estudos complementares em outras espécies, incluindo humanos.

    “Nossos hormônios são os mesmos, e as partes do cérebro em que agem são as mesmas”, diz Richmond Thompson, neurocientista do Oxford College da Emory University, coautor do estudo, em comunicado.

    “Então, aprender como hormônios como a testosterona ajudam outros animais a se ajustarem a contextos sociais em rápida mudança não apenas nos ajudará a entender as ‘porcas’ e ‘parafusos’ biológicos que afetam seu comportamento, mas também prever e, finalmente, entender como as mesmas moléculas no cérebro humano ajudam a moldar nossas próprias respostas ao mundo social ao nosso redor”, conclui.